Questões de Concurso Para analista administrativo

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Q1681977 Direito Constitucional
Sobre os direitos e garantias fundamentais, é correto afirmar:
Alternativas
Q1681976 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”,...” Qual é a função sintática do termo sublinhado?
Alternativas
Q1681975 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas.” Dê a classificação morfológica das palavras grifadas, apontando a classe gramatical a que pertencem:
Alternativas
Q1681974 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.” Dê a função sintática do termo grifado:
Alternativas
Q1681973 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.” Classifique a conjunção destacada:
Alternativas
Q1681972 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve muitos problemas,...” Identifique a relação de sentido que o conectivo sublinhado fixa com a construção antecedente:
Alternativas
Q1681971 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia a passagem e responda: “Doutor urubu, a coisa está preta”. Dê a função sintática do termo grifado:
Alternativas
Q1681970 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia a passagem e responda: “Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto?” A respeito dessa declaração, podemos afirmar o seguinte:
Alternativas
Q1681969 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
O título do texto faz referência significativa a uma expressão inserta no universo das chamadas “expressões politicamente corretas”. Marque a alternativa CORRETA, de acordo com o texto, em relação ao sentido contido no título:
Alternativas
Q1681968 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Releia e responda: “Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas.” Entre os verbos a seguir especificados, apenas um NÃO pode ser considerado sinônimo do verbo destacado. Encontre-o:
Alternativas
Q1681967 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.

A passagem a servir servirá de base para a questão.

“Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto.”


Encontre um verbo sinônimo ou uma locução verbal sinonímica para a expressão grifada “meter o bedelho”:

Alternativas
Q1681966 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.

A passagem a servir servirá de base para a questão.

“Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto.”


No tocante ao uso da expressão grifada “a tal”, numa referência à cartilha aludida no texto, é CORRETO afirmar o seguinte:

Alternativas
Q1681965 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Uma figura de linguagem se evidencia com destaque no texto, e exerce uma função essencial na linha dissertativa construída ao longo da composição. Indique essa figura de linguagem:
Alternativas
Q1681964 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Aponte a alternativa que apresenta o tema central focalizado pelo texto:
Alternativas
Q1681963 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Marque a alternativa que traz o foco narrativo do texto:
Alternativas
Q1681962 Português
Leia o texto abaixo e, em seguida, responda a questão pertinente:

A coisa está branca
(Ferreira Gullar)



    Embora todo mundo já tenha escrito sobre a tal cartilha que a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal elaborou e editou, também vou meter o bedelho no assunto. Vocês hão de lembrar que sobre o papa eu não escrevi, que de papa eu não entendo; de cartilha também não, mas querer nos ensinar que pega mal usar expressões como “farinha do mesmo saco” indica que esse pessoal do Lula ou não tem mesmo o que fazer ou está a fim de nos encher o saco (com perdão da palavra politicamente incorreta).
    Essa coisa de censurar palavras e expressões nascidas do falar popular é uma mania que de vez em quando aflora. Não faz muito, surgiu uma onda exigindo que se expurgassem dos dicionários palavras como “judiação” ou “judiar”, sob o argumento de que são expressões antissemitas. Bastava pensar um pouco para ver que tais palavras não se referem aos judeus, e sim a Judas Iscariotes, isto é, à malhação do Judas no Sábado de Aleluia. Judiar ou fazer judiação é submeter alguém a maus-tratos semelhantes aos que a molecada faz com o boneco de Judas.
    Outra expressão que a ignorância rancorosa considera insulto racista é “a coisa está preta”, que, na verdade, como se sabe, alude ao acúmulo de nuvens negras no céu no momento que precede as tempestades. Assim, quando alguém pressente que as coisas estão se complicando, usa aquela expressão. Pois acreditem vocês que um conhecido meu, pessoa talentosa, me disse que em sua casa está proibido dizer “a coisa está preta”; lá se diz “a coisa está branca”! Pode?
    Essa cartilha – que o governo promete consertar, como se tal coisa tivesse conserto – pode abrir caminho para restrições à liberdade de expressão, se não em termos de lei, por induzir pais de família e professores a discriminar textos literários ou jornalísticos e, consequentemente, seus autores. No que me toca, já estou de orelhas em pé, pois acabo de lançar um livro para crianças (!!) cujo título é Dr. Urubu e suas fábulas. Para azar meu, o poema que dá título ao livro começa assim: “Doutor urubu, a coisa está preta”.
    Temo ser levado ao tribunal da Inquisição por incorrer em duplo delito, pois, além de usar a expressão condenada, ainda dou a entender que a frase alude à cor negra da ave, e logo que ave! Um urubu, bicho repugnante, que só come carniça! Adiantaria alegar que não fui eu quem pintou o urubu de preto? Minha sorte é que vivemos numa democracia, e o nosso povo, por índole, é pouco afeito ao fanatismo desvairado, em que pesem as exceções.
     Exagero? Pode ser, mas, se exagero, é de propósito, para pôr à mostra o que há de perigoso e burro nesses defensores do politicamente correto, porque, se não há o perigo da fogueira, há o perigo do império da burrice ir tomando conta do país. E tudo devidamente enfeitado de boas intenções.
    Sim, porque, conforme alegou o autor da cartilha, ela foi concebida com o propósito de resguardar a suscetibilidade de brancos e negros, de judeus e muçulmanos, de cearenses e baianos, de palhaços e beatas... Até os comunistas foram beneficiados sob o pretexto de terem sido vítimas de graves calúnias. Não sei se a Secretaria de Direitos Humanos acha natural chamar os outros de fascistas ou nazistas; quanto a acoimá-los de vigaristas, creio que não, pois isso ofenderia os vigários em geral. Não posso afirmar se a cartilha resguarda também a suscetibilidade dos chifrudos, dos pançudos, dos narigudos, dos cabeludos e dos cabeçudos; dos pirocudos, acredito que não, pois isso é tido como elogio. Mas e as moças de pouca bunda e poucos seios (do tipo Gisele Bündchen), que o pessoal apelida de “tábua”? E os gorduchos, apelidados de “bolão”? Os magricelas, de “espeto”? E os baixotes, chamados de “meia porção”? Isso sem falar num respeitável senador da República a quem seus confrades – acredito que sem malícia – apelidaram de “lapiseira”.
    Estou de acordo com que não se deva tratar pessoa nenhuma por apelidos depreciativos. Por exemplo, num papo com Bin Laden, eu teria a cautela de não chamá-lo de terrorista, especialmente se ele estivesse acompanhado de um homem-bomba. Do mesmo modo agiria com o juiz Nicolau, a quem nunca trataria de “Lalau”, embora certamente não lhe revelasse a senha de meu cartão de crédito.
    Como se vê, isso de falar politicamente correto envolve problemas, porque não se trata de engessar apenas o humor (bom ou mau) das pessoas, mas de engessar o próprio idioma. Falar, de certo modo, é reinventar a língua, já que o que se diz estava por ser dito e, ao dizê-lo, damos-lhe uma forma imprevisível até para nós mesmos. Além disso, há pessoas especialmente dotadas de verve, que nos surpreendem (e a si próprias) com expressões às vezes irônicas, sarcásticas ou simplesmente engraçadas. Criam modos de dizer inusitados, apelidos, ditos, tiradas, que nos divertem e enriquecem o nosso falar cotidiano. E que falar assim é um exercício de liberdade (para o bem ou para o mal) que não cabe nos preceitos de uma cartilha ou de um código de censura.
    Aliás, para terminar, sugiro que mudem os nomes de certos insetos, como barata, formiga e piolho, por coincidirem lamentavelmente com os sobrenomes de algumas respeitáveis famílias brasileiras.
    15.5.2005.

Gullar, Ferreira. A alquimia na quitanda: artes, bichos e barulhos nas melhores crônicas do poeta. São Paulo: Três Estrelas, 2016.
Considerado em sua estrutura compositiva, o texto, predominantemente, é:
Alternativas
Q1650343 Controle Externo

Com referência à doutrina e à legislação relativas aos controles interno e externo da administração pública, julgue o item.


A Constituição Federal de 1988 ampliou consideravelmente as funções do controle externo. Uma delas — a sancionatória — se caracteriza pela aplicação aos responsáveis por perdas, extravios ou outras irregularidades das sanções previstas em lei, entre elas, multa proporcional ao dano causado ao erário.

Alternativas
Q1650342 Controle Externo

Com referência à doutrina e à legislação relativas aos controles interno e externo da administração pública, julgue o item.


A partir da IN TCU n.º 47/2004, ficou evidente a necessidade de o TCU incluir, no exame e julgamento das tomadas e prestações de contas dos gestores, o controle de conformidade, que corresponde à comparação entre os objetivos, diretrizes e metas instituídos e os resultados obtidos em termos de eficiência, eficácia e efetividade.

Alternativas
Q1650341 Controle Externo

Com referência à doutrina e à legislação relativas aos controles interno e externo da administração pública, julgue o item.


A prestação de contas deriva da obrigação social e pública de informar sobre algo de que se é responsável, base da transparência e do controle social que caracterizam a governança, conceito que ultrapassa o da prestação de contas tradicional. A governança, desse modo, é a capacidade do governo de responder às demandas da sociedade, à transparência das ações do poder público e à responsabilidade dos agentes políticos e administração pública pelos seus atos.

Alternativas
Q1650340 Controle Externo

Com referência à doutrina e à legislação relativas aos controles interno e externo da administração pública, julgue o item.


A metodologia de avaliação de desempenho institucional adotada na prestação de contas de 2009, pela ANEEL, contempla as dimensões eficiência e eficácia. O conceito de eficácia, caracterizado pelo grau de alcance das metas programadas, pode ser medido pela relação entre a meta física realizada de cada ação do programa e a despesa programada para cada ação desse programa.

Alternativas
Respostas
4541: B
4542: B
4543: C
4544: A
4545: E
4546: D
4547: A
4548: C
4549: B
4550: E
4551: A
4552: D
4553: E
4554: B
4555: A
4556: C
4557: C
4558: E
4559: C
4560: E