Questões de Português - Coesão e coerência para Concurso
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Disponível em: <http://deposito-de-tirinhas.tumblr.com/post/40380801991/por-fernando-gonsales> . Acesso em: 24 jul. 2016.
I. No segmento: “MEU ANALISTA VIVE ME FALANDO ISSO!” (2º quadrinho), o pronome demonstrativo “isso” funciona como elemento catafórico, uma vez que se refere ao que foi proferido anteriormente pelo rato. II. O conectivo conjuncional “mas” (3º quadrinho) indica que a minhoca não compreendeu a fala do analista. III. Há, no segmento “MAS EU NÃO VENÇO!” (3º quadrinho), elipse de um termo, o qual pode ser recuperado pelo contexto.
verifica-se que está(ão) correta(s)
• A percepção inadequada pelos pacientes de uma doença crônica que atinge de 2% a 4% dos adultos nos Estados Unidos e no Reino Unido... (1º parágrafo) • As taxas de prescrição de remédios para manter níveis normais do ácido úrico no sangue são baixas... (3º parágrafo) • A crise de gota, desencadeada por dor no local da inflamação, interfere na ação da articulação... (5º parágrafo)
Considerando-se o contexto, assinale a alternativa que substitui, correta e respectivamente, os termos destacados, sem alteração de sentido.
Combate à desigualdade pela raiz
Cotidianamente, todos nós nos deparamos com o passivo que nosso sistema educacional gera ano a ano. Por mais confortável e estruturada que esteja nossa vida e por melhor que tenha sido a nossa formação e a de nossos filhos, a lacuna que o sistema gera para um contingente tão grande de brasileiros impacta a qualidade de vida, o dia a dia de todos nós. [...]
Quanto à educação formal, pode-se dizer que tal investimento não começa apenas nos ensinos fundamental e médio: se dá a partir da educação infantil. Sabe-se que os investimentos, ainda na primeira infância, não só reduzem a desigualdade, mas também produzem ganhos tanto para o indivíduo quanto para a sociedade. No entanto, a urgência frente ao “apagão de mão de obra” tem gerado uma pressão por investimento no ensino médio. A questão de fundo, porém, continua sendo: por que algumas crianças vão tão longe e outras ficam condenadas aos limites de sua inserção social?
A falta de condições necessárias para desenvolver seu potencial acaba impedindo a mobilidade de um enorme contingente de crianças e jovens. Isso pode ser causado por inúmeros fatores sociais, econômicos, culturais, familiares. No entanto, entre eles, é possível destacar a quantidade e qualidade dos estímulos e informações aos quais os indivíduos são submetidos desde pequenos.
Tal constatação pode parecer simples, e a resposta imediata a esse problema seria, então, ampliar o nível de exposição de todos à informação e a práticas culturais qualificadas. Sem dúvida, isso é parte da solução, mas, infelizmente, não é suficiente. Para além do contato com a informação, são necessárias interações que promovam o desenvolvimento de capacidades que levem os sujeitos a ultrapassar o mero consumo de conhecimentos. Trata-se, portanto, de colocar a ênfase no processamento e na produção de ideias, reflexões e respostas. E isso se dá por meio da interação com os adultos e com os objetos de conhecimento. A diferença vai se estabelecendo na qualidade da interação cotidiana e na forma de estimular e acreditar na capacidade daquele pequeno ser. [...]
Atualmente, muitas crianças brasileiras já têm acesso a livros, bibliotecas, laptops, celulares etc. Entretanto, as práticas dos atores que mediam o acesso a essas “tecnologias” são muito diversificadas. E é nesse espaço invisível que se configuram a marginalização e as diferenças na qualidade do relacionamento que as crianças têm com a cultura letrada. Um educador que utiliza estruturas mais sofisticadas da língua para se comunicar com seus alunos, ainda que bem pequenos, e propõe atividades que os incentivem a aprender sobre e a partir da linguagem, oferecerá um contexto favorável ao desenvolvimento de habilidades e conhecimentos que amplificam seu potencial cognitivo. Em contrapartida, alunos expostos a práticas mais mecânicas, transmissivas, podem continuar limitados ao consumo do conhecimento.
A educação pode e deve promover o desenvolvimento pessoal e a inserção social, especialmente em um país com tantas desigualdades como o Brasil. É necessário entender que o acesso à informação não é suficiente para transformar a nossa realidade e que é na composição de inúmeros microaprendizados cotidianos que se cria a oportunidade de desenvolvimento cognitivo. O processo de aprendizagem é cultural e precisa de mediação qualificada desde muito cedo. Portanto, para além da urgência de fazer frente ao “apagão da mão de obra”, é necessário investir na produção de conhecimentos no campo da linguagem e nos saberes específicos que se dão na interface entre os domínios teórico e prático. Precisamos subsidiar os professores que atendem à primeira infância, a fim de que todas as crianças brasileiras, desde muito cedo, possam participar regularmente de situações produtivas de aprendizagem.
(Beatriz Cardoso. O Globo, 21 de julho de 2014.)
O cachorro
Avenida larga e movimentada. Duas pistas, um canteiro no meio, muitos quilômetros. Eu ia em uma mão, o trânsito fluindo lento, mas andando. Do outro lado, na calçada, observei a chegada de um cachorro pequeno. Desses de apartamento. Não sei o nome, mas uma raça dessas bem amorosas, que adora ficar no colo, em especial de mulheres.
Ele apontou na esquina, olhou para um lado e para o outro e parecia ansioso em tomar uma decisão. Não sei se alguém o chamou, ou se o barulho da avenida sugeria sentenças gravíssimas. A decisão veio rápida como um raio: o cachorro começou a correr rapidamente. Escolheu a contramão, ou seja, fomos na mesma direção. Eu com os olhos grudados nele, e ele se desviando das pessoas que tentavam detê-lo, na calçada, atendendo a meus apelos silenciosos. Pelo que podia observar, ele não estava se poupando. Imprimia toda a velocidade que seu pequeno porte possibilitava. Não havia razão para poupar o fôlego, mesmo que ele não soubesse para onde estava indo. E certamente ele não sabia. Em determinado momento, resolveu se livrar das pessoas e das ruas transversais que tinha de atravessar e que o obrigavam a diminuir o passo, e escolheu o asfalto. Contra tudo, naquele mar de gente e máquinas barulhentas. Sem rumo, sem lógica, sem sentido e com muita pressa. E corria, corria, corria.
Nada mais era certo: a vasilha com comida, a hora de dar o passeio, os braços e afagos da dona, as brincadeiras e os latidos. A realidade era outra agora, e ameaçadora. Tudo tinha a incerteza do impulso que não sabe em que vai dar. A vontade sem o ponto. O medo. E o desespero.
(Leo Jaime. Blônicas. São Paulo:Jaboticaba, 2005)
Leia a tira, para responder à questão.
(Bill Watterson, Tiras do Calvin. Disponível em:
<www1.folhauol.com.br>. Acesso em: 26 jan 2016)
A alternativa que preenche, correta e respectivamente,
as lacunas do texto é:
Leia atentamente o texto acima e, de acordo com a Gramática Normativa da Língua Portuguesa, analise as afirmativas e dê valores Verdadeiro (V) ou Falso (F).
( ) Na expressão “Muito cedo se aprende”, é correto dizer que há dois advérbios: um se liga ao verbo “aprender”, modificando-o e outro se liga ao advérbio “cedo”, intensificando-lhe o sentido.
( ) Se, no trecho “associado à feminilidade”, substituíssemos a palavra “feminilidade” pela palavra “masculinidade”, esse trecho deveria ser reescrito como “associado a masculinidade”, sem o acento grave, indicador de crase, já que se trata de palavra masculina.
( ) O uso do acento gráfico no trecho “Os homens têm dificuldade” justifica-se pela mesma razão do que o uso na palavra “também”, ou seja, são oxítonas terminadas em “em”.
( ) No trecho “geral, isso se dá por meio da violência”, a palavra destacada é um pronome demonstrativo que tem função anafórica, já que retoma uma ideia já enunciada no texto.
Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta de cima para baixo.
Yuval Noah Harari. Sapiens – uma breve história da humanidade.
Trad. Janaína Marcoantonio. 22.ª ed. Porto Alegre: L&PM,
2017, p. 286-287 (com adaptações).
Mudança climática pode aumentar pobreza, alerta ONU Documento do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) projeta que, para evitar que consequências do aquecimento global “saiam de controle”, mundo precisa reduzir a emissão dos gases de efeito estufa
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) da Organização das Nações Unidas revelou na manhã desta segunda em Yokohama, no Japão, a segunda parte do quinto relatório produzido pelos cientistas do órgão – o anterior foi divulgado há sete anos, em 2007. O documento projeta que a mudança climática irá piorar problemas sociais já existentes, como pobreza, doenças, violência e número de refugiados. Além disso, irá frear os benefícios da modernização, como o crescimento econômico regular e uma produção agrícola mais eficiente.
Para evitar que as consequências do aquecimento global “saiam de controle”, o mundo precisa reduzir a emissão dos gases de efeito estufa, afirmou Rajendra Pachauri, presidente do IPCC – e existe pouco tempo para tomar atitudes que possam mitigar os efeitos da mudança climática, permitindo aos países se ajustarem à maior variação de temperaturas.
Intitulado “Sumário para Formuladores de Políticas”, o documento foi aprovado por unanimidade pelos mais de 100 governos integrantes do IPCC. Uma versão preliminar do sumário havia vazado na internet há alguns meses e já fazia advertências semelhantes, como a de que “as mudanças climáticas vão amplificar os riscos relacionados ao clima já existentes e criar novos”, reduzindo, por exemplo, a oferta de água renovável na superfície e nas fontes subterrâneas nas regiões subtropicais mais secas e aumentando o número de pessoas sob risco de inundações.
Em média, o texto aprovado pelo IPCC menciona a palavra “risco” cinco vezes e meia em cada uma de suas 49 páginas. Os perigos mencionados envolvem cidades grandes e pequenas e incluem preço e disponibilidade de alimentos. Em escala menor, são citados riscos que envolvem doenças, custos financeiros e até mesmo a paz mundial. “Magnitude crescente do aquecimento aumenta a possibilidade de impactos severos, penetrantes e irreversíveis”, alerta o relatório.
Desastres naturais como ondas de calor na Europa, queimadas nos Estados Unidos, seca na Austrália, inundações em Moçambique, Tailândia e Paquistão são lembretes de como a humanidade é vulnerável a condições climáticas extremas, diz o texto. Os problemas devem afetar todos de algum modo, mas as pessoas que menos têm recursos para arcar com as consequências serão as que sofrerão mais. “Agora nós estamos em uma era na qual a mudança climática não é algum tipo de hipótese futura”, afirmou Chris Field, um dos autores líderes do estudo.
Uma parte do relatório discute o que pode ser feito para amenizar os efeitos do aquecimento global e lista como alternativas a redução da poluição de carbono e a preparação para mudanças climáticas com um desenvolvimento mais inteligente. O Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, ressaltou que o documento é um alerta às novas ações e alertou que os custos da falta de ação serão “catastróficos”.
Maarten van Aalst, um dos autores do estudo, reforçou que se a comunidade internacional não reduzir as emissões de gases estufa logo, os riscos sairão de controle. “E os riscos já subiram”, disse. Coautor do relatório, o cientista do IPCC Saleemul Huq lembra que “as coisas estão piores do que previmos” em 2007, quando o grupo de cientistas emitiu a última versão do documento. “Nós veremos cada vez mais impactos, mais rápido e antes do que antecipamos”, declarou.
O relatório, inclusive, cria uma nova categoria de risco. Em 2007, o maior grau de perigo era “alto”, simbolizado pela cor vermelha. Desta vez, o nível máximo é “muito alto” e de cor roxa nas ilustrações gráficas.
Vice-presidente do painel do ONU, o climatologista Jean-Pascal van Ypersele defendeu os alertas do IPCC contra críticas que apontem alarmismo por parte dos cientistas. “Nós estamos indicando as razões para o alerta. Isso é porque os fatos, a ciência e os dados mostram que há razões para estar alarmado, não é porque nós somos alarmistas”, disse.
No entanto, outra coautora do estudo, a cientista Patricia Romero-Lankao disse que ainda existe uma janela de oportunidade. “Nós temos escolhas. Nós temos que agir agora”, disse.
Adaptado de http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/mudanca-climatica-pode-aumentar-pobreza-alerta-onu
TEXTO 4
A função exercida pela palavra “aí”, nas ocorrências em destaque, é, respectivamente de
TEXTO 3
“Um dos fatos mais lamentáveis da nossa história pós-redemocratização”
O professor de direito constitucional da PUC, Marcelo Figueiredo, disse neste sábado à rádio Jovem Pan que a censura imposta à Crusoé e a O Antagonista fere a democracia.
“O episódio é um precedente perigoso para a liberdade de imprensa porque se cada ministro se sentir agravado com uma reportagem e mandar cassar o veículo de comunicação, nós voltamos a um Estado ditatorial, antidemocrático”, afirmou.
“A censura ao site Antagonista e à revista Crusoé entrará como um dos fatos mais lamentáveis da nossa história pós-redemocratização. Por outro lado, tem que se celebrar. A mobilização da sociedade e o posicionamento certeiro de ministros do Supremo que discordam do conjunto de absurdos que têm sido praticados.”
(Fonte: https://www.oantagonista.com/brasil/um-dos-fatos-mais-lamentaveis-da-nossa-historia-pos-redemocratizacao/)
A articulação das informações em um texto se faz por meio de recursos linguísticos diversos. Faça a leitura do excerto da entrevista abaixo transcrito com a historiadora Mary Del Priore, cujo foco é a gratuidade ou não do ensino, atentando para a conexão textual.
A respeito dos vínculos estabelecidos no texto, evidenciam-se diferentes mecanismos de coesão, pois
I- o fato de a educação não ser totalmente pública e o da presença da iniciativa privada são informações retomadas pelas expressões
“dessa impossibilidade” (l.1 e 2) e “opção” (l. 2), respectivamente, caracterizando um misto de coesão referencial e lexical.
II- a contraposição entre características atribuídas ao setor privado (l.5), como “ser eficiente” e “restringir-se a quem pode pagar” é sinalizada pela conjunção coordenativa “mas”, que atua como elemento de coesão sequencial.
III- as falhas quanto às gestões pública e privada, no caso, diretores não serem gestores, mas executores de instruções (l.9), e certas universidades roubarem e enganarem alunos (l.10 e 11) são informações introduzidas por orações adjetivas explicativas, cuja marca de coesão referencial é o “que”.
A explicação CORRETA está expressa na(s) proposição(ões) citada(s) na alternativa:
Texto para responder à questão.
Meu amigo Brasílio
No sábado, fui visitar meu velho amigo Brasílio. Ele me recebeu no portão, animado, com um uisquinho na mão, me convidou para entrar, abriu uma champanhe francesa, me deu uma taça, acendeu um charuto cubano. Disse que as coisas estavam indo bem para ele, que os negócios tinham engrenado, que ele finalmente tinha descoberto o segredo para viver na fartura.
- Fica para ja n ta r- ele convidou.
Feliz com a felicidade do meu amigo querido, aceitei. Ele foi buscar um prato na cozinha, mas, ao abrir a gaveta, parou, constrangido.
- Ixi, não tenho talheres.
- Como não tem talheres, Brasa? - perguntei. Eu tinha cansado de fazer boquinha na casa do Brasílio e sempre usávamos uns talheres lindos, de prata, herança de família.
- Vendi pela internet. Foi assim que comprei este charuto - disse, distraído, enquanto a cinza caía no chão.
Foi aí que notei as paredes vazias e esburacadas. Os quadros tinham sumido. E os fios de eletricidade haviam sido arrancados.
- Descobri que dá para viver muito bem apenas catando as coisas de valor da família e colocando para vender. Isso que é vida.
Claro que o Brasílio não existe e que a história aí em cima é fictícia - ninguém faria um absurdo desses, vender o patrimônio para torrar em desfrute. Ou faria?
Em grande medida, o modelo econômico deste nosso país é baseado numa lógica bem parecida com a do meu querido e fictício amigo. Bem mais que a metade da economia brasileira é sustentada pela mera extração de recursos naturais, de maneira não sustentável. Arrancamos a floresta, passamos nos cobres e aí torramos a grana - e ficamos sem floresta. É o mesmo que vender a prataria da família e gastar em uísque e charutos.
Muito da prosperidade recente do país foi abastecida por indústrias de alto impacto, que fazem dinheiro a curto prazo, mas nos deixam mais pobres depois. Flistoricamente este país confundiu gerar riqueza com atacar o patrimônio, surrupiando-o de nossos descendentes. Não precisa ser assim. Há países como a Suécia. Lá, boa parte da economia é baseada na exploração sustentável da floresta. Se a gelada e infértil Suécia conseguiu um dos maiores padrões de vida do mundo explorando floresta, por que um país tão fértil, com uma floresta incomensuravelmente mais rica, como é o caso do Brasil, não poderia fazer o mesmo?
Porque a floresta equatorial brasileira não é simples e previsível como a floresta temperada sueca. Lá, cresce basicamente uma única espécie de árvore, que permite uma exploração industrial da madeira pelas indústrias de papel, móveis e navios. A floresta brasileira é muito mais rica do que a sueca, mas é também muito mais complexa. E lidar com complexidade é muito mais difícil. Em vez de fazer um produto só, há que se aprender a fazer centenas, milhares. Em vez de uma matéria-prima só, há quase infinitas.
Muito difícil. Melhor derrubar tudo e vender a lenha. Melhor alargar tudo para gerar energia. Melhor passar o trator e fazer monocultura de soja ou gado. E aí ficar sem talheres para o almoço.
(Denis Russo Burgierman. Disponível em: <http://super.abril.com.br/blogs/mundo-novo/>, acesso em 18/01/2015.)
Meu amigo Brasílio
No sábado, fui visitar meu velho amigo Brasílio. Ele me recebeu no portão, animado, com um uisquinho na mão, me convidou para entrar, abriu uma champanhe francesa, me deu uma taça, acendeu um charuto cubano. Disse que as coisas estavam indo bem para ele, que os negócios tinham engrenado, que ele finalmente tinha descoberto o segredo para viver na fartura.
- Fica para jantar - ele convidou.
Feliz com a felicidade do meu amigo querido, aceitei. Ele foi buscar um prato na cozinha, mas, ao abrir a gaveta, parou, constrangido.
- Ixi, não tenho talheres.
- Como não tem talheres, Brasa? - perguntei. Eu tinha cansado de fazer boquinha na casa do Brasílio e sempre usávamos uns talheres lindos, de prata, herança de família. - Vendi pela internet.
Foi assim que comprei este charuto - disse, distraído, enquanto a cinza caía no chão. Foi aí que notei as paredes vazias e esburacadas. Os quadros tinham sumido. E os fios de eletricidade haviam sido arrancados.
- Descobri que dá para viver muito bem apenas catando as coisas de valor da família e colocando para vender. Isso que é vida.
Claro que o Brasílio não existe e que a história aí em cima é fictícia - ninguém faria um absurdo desses, vender o patrimônio para torrar em desfrute. Ou faria?
Em grande medida, o modelo econômico deste nosso país é baseado numa lógica bem parecida com a do meu querido e fictício amigo. Bem mais que a metade da economia brasileira é sustentada pela mera extração de recursos naturais, de maneira não sustentável. Arrancamos a floresta, passamos nos cobres e aí torramos a grana - e ficamos sem floresta. É o mesmo que vender a prataria da família e gastar em uísque e charutos.
Muito da prosperidade recente do país foi abastecida por indústrias de alto impacto, que fazem dinheiro a curto prazo, mas nos deixam mais pobres depois. Historicamente este país confundiu gerar riqueza com atacar o patrimônio, surrupiando-o de nossos descendentes. Não precisa ser assim. Há países como a Suécia. Lá, boa parte da economia é baseada na exploração sustentável da floresta. Se a gelada e infértil Suécia conseguiu um dos maiores padrões de vida do mundo explorando floresta, por que um país tão fértil, com uma floresta incomensuravelmente mais rica, como é o caso do Brasil, não poderia fazer o mesmo?
Porque a floresta equatorial brasileira não é simples e previsível como a floresta temperada sueca. Lá, cresce basicamente uma única espécie de árvore, que permite uma exploração industrial da madeira pelas indústrias de papel, móveis e navios. A floresta brasileira é muito mais rica do que a sueca, mas é também muito mais complexa. E lidar com complexidade é muito mais difícil. Em vez de fazer um produto só, há que se aprender a fazer centenas, milhares. Em vez de uma matéria-prima só, há quase infinitas.
Muito difícil. Melhor derrubar tudo e vender a lenha. Melhor alargar tudo para gerar energia. Melhor passar o trator e fazer monocultura de soja ou gado. E aí ficar sem talheres para o almoço.
(Denis Russo Burgierman. Disponível em: <http://super.abril.com.br/blogs/mundo-novo/>,
Meu amigo Brasílio
No sábado, fui visitar meu velho amigo Brasílio. Ele me recebeu no portão, animado, com um uisquinho na mão, me convidou para entrar, abriu uma champanhe francesa, me deu uma taça, acendeu um charuto cubano. Disse que as coisas estavam indo bem para ele, que os negócios tinham engrenado, que ele finalmente tinha descoberto o segredo para viver na fartura.
- Fica para jantar - ele convidou.
Feliz com a felicidade do meu amigo querido, aceitei. Ele foi buscar um prato na cozinha, mas, ao abrir a gaveta, parou, constrangido.
- Ixi, não tenho talheres.
- Como não tem talheres, Brasa? - perguntei. Eu tinha cansado de fazer boquinha na casa do Brasílio e sempre usávamos uns talheres lindos, de prata, herança de família. - Vendi pela internet.
Foi assim que comprei este charuto - disse, distraído, enquanto a cinza caía no chão. Foi aí que notei as paredes vazias e esburacadas. Os quadros tinham sumido. E os fios de eletricidade haviam sido arrancados.
- Descobri que dá para viver muito bem apenas catando as coisas de valor da família e colocando para vender. Isso que é vida.
Claro que o Brasílio não existe e que a história aí em cima é fictícia - ninguém faria um absurdo desses, vender o patrimônio para torrar em desfrute. Ou faria?
Em grande medida, o modelo econômico deste nosso país é baseado numa lógica bem parecida com a do meu querido e fictício amigo. Bem mais que a metade da economia brasileira é sustentada pela mera extração de recursos naturais, de maneira não sustentável. Arrancamos a floresta, passamos nos cobres e aí torramos a grana - e ficamos sem floresta. É o mesmo que vender a prataria da família e gastar em uísque e charutos.
Muito da prosperidade recente do país foi abastecida por indústrias de alto impacto, que fazem dinheiro a curto prazo, mas nos deixam mais pobres depois. Historicamente este país confundiu gerar riqueza com atacar o patrimônio, surrupiando-o de nossos descendentes. Não precisa ser assim. Há países como a Suécia. Lá, boa parte da economia é baseada na exploração sustentável da floresta. Se a gelada e infértil Suécia conseguiu um dos maiores padrões de vida do mundo explorando floresta, por que um país tão fértil, com uma floresta incomensuravelmente mais rica, como é o caso do Brasil, não poderia fazer o mesmo?
Porque a floresta equatorial brasileira não é simples e previsível como a floresta temperada sueca. Lá, cresce basicamente uma única espécie de árvore, que permite uma exploração industrial da madeira pelas indústrias de papel, móveis e navios. A floresta brasileira é muito mais rica do que a sueca, mas é também muito mais complexa. E lidar com complexidade é muito mais difícil. Em vez de fazer um produto só, há que se aprender a fazer centenas, milhares. Em vez de uma matéria-prima só, há quase infinitas.
Muito difícil. Melhor derrubar tudo e vender a lenha. Melhor alargar tudo para gerar energia. Melhor passar o trator e fazer monocultura de soja ou gado. E aí ficar sem talheres para o almoço.
(Denis Russo Burgierman. Disponível em: <http://super.abril.com.br/blogs/mundo-novo/>,