INSTRUÇÃO: Leia o texto a seguir para responder à questão.
Em caso inédito, mulher entra na Justiça pelo
direito de dar luz a uma criança
Numa situação até então inédita para a Justiça
brasileira, uma mulher entrou com uma ação para
ter o direito de dar luz à criança que está gestando. A
instrutora de artes marciais Selina Caio diz não aguentar
mais ser repreendida em ocasiões em que afirma
publicamente essa intenção. Em resposta, militâncias
em prol da tradição entraram em protesto contra a ação,
que condenam com base na legislação em vigor:
“Uma mulher deve dar à luz uma criança, e nunca
o contrário. Se a sociedade começar a tolerar isso,
vamos ferir uma tradição secular”, disse Renan
Barbosa, coordenador nacional do Movimento Brasil
Correto (MBC).
Apesar de a legislação prever que, nesses casos,
a luz seja incondicionalmente objeto indireto e a criança,
sempre objeto direto, o que ocorre com frequência na
prática – e de forma ilegal – é a mãe tratar a luz como
objeto direto, e sua cria como indireto. “Isso fere só a
semântica da tradição, e não a sintaxe. Por se tratar de
eufemismo que permite interpretação metafórica oposta,
como dar luz a uma criança em vez de dar à luz uma
criança, talvez o problema maior não esteja na ruptura
com a tradição, e sim com a ética: seria moralmente
correto dar luz a uma criança em vez de entregar esta
à luz? Sintaticamente sabemos que não há incorreção”,
disse o jurista Adalberto Kaspary.
Com base nesse entendimento, o advogado de Selina
acredita que a Justiça poderia admitir a forma inversa,
alternativa e facultativa para que a luz seja objeto
direto dessa ação, abrindo um precedente para que
outras mulheres possam se beneficiar desse poder de
escolha: “Não vejo razão para que se condene qualquer
mãe por reger a luz de forma direta. Ora, se ela quer
dar a luz a uma criança, por que deveríamos impedi-la
baseados em tradições e crenças gramaticais que ela
não professa?”, questionou. Se tais regras linguísticas
não foram assimiladas pela sociedade, seria melhor que
não houvessem sido criadas.
Diante de tantos homens opinando sobre a questão,
a futura mãe apontou a total incompetência deles para
tratar do assunto: “Eles não têm lugar de fala quando
o sujeito da ação verbal é exclusivamente feminino.
Ora, quem dá a luz a uma criança, ou dá uma criança
à luz, como eles desejam, é só a mulher. Eles nunca
deram, nunca darão e nunca saberão o que é dar luz
a bebês. Pra eles, é mais grave deixar de assumir
uma regência clássica do que deixar de assumir um
filho”, disse. “Meu corpo, minhas regras. Gramaticais,
nesse caso. Não quero dar minha filha à luz. Quero ela
aqui comigo e dar luz a ela”.
O nascimento da filha, Helena Caio, está previsto para a
segunda quinzena de junho. A previsão entre os juristas
é que o recurso seja negado e que Selina e outras mães
Brasil afora continuem com a prática ilegal, dando luz a
seus filhos e mandando a tradição às favas.
Disponível em: https://www.gramaticasarcastica.com/post/
em-caso-in%C3%A9dito-mulher-entra-na-justi%C3%A7a-pelodireito-de-dar-luz-a-uma-crian%C3%A7a.
Acesso em: 10 jun. 2023 (Fragmento adaptado).