Leia o texto a seguir para responder a questão:
Felicidade é uma vibração intensa, um momento
em que eu sinto a vida em plenitude dentro de mim, e quero
que aquilo se eternize. Felicidade é a capacidade de você
ser inundado por uma alegria imensa por aquele instante,
por aquela situação. Aliás, felicidade não é um estado
contínuo, felicidade é uma ocorrência eventual. A felicidade
é sempre episódica. Você sentir a vida vibrando, seja num
abraço, seja na realização de uma obra, seja numa
situação, por exemplo, em que seu time vence, seja porque
algo que você fez deu certo, seja porque você ouviu algo
que você queria ouvir. É claro que aquilo não tem
perenidade, aliás, a felicidade se marcada pela perenidade
seria impossível. Afinal de contas nós só temos a noção de
felicidade pela carência.
Se eu tivesse a felicidade como algo contínuo, eu
não a perceberia. Nós só sentimos a felicidade porque ela
não é contínua. Isto é, ela não é o que acontece o tempo
todo, de todos os modos. A ideia de felicidade sozinha ela
teria que ter uma questão anterior: se é possível viver
sozinho. Que como a felicidade pelo óbvio só acontece com
alguém que viu ou está e viver é viver com outros e outras,
como não é possível viver sozinho? A possibilidade da
felicidade isolada, solitária é nenhuma. Pra que eu possa
ser feliz sozinho eu teria que ser capaz de viver sozinho.
Mesmo a literatura, como Robson Crusoé, por exemplo,
que lida com um homem que está só, mas ele está só
depois de ter vivido com outros. Ele trás as outras pessoas
na sua memória, na sua história, no seu desejo, no seu
horizonte. Não há, não há história de ser humano em que
ele tenha sido sozinho da geração até o término. Se assim
não há, não há possibilidade de se ser feliz sozinho.
Nos últimos 50 anos do século XX, nós tivemos
mais desenvolvimento tecnológico do que em toda história
anterior da humanidade. Todos os 39.950 anos anteriores,
desde que o homo sapiens era sapiens, sapiens sapiens na
classificação científica, foram menos do que os 50 anos
finais do século XX. Seria a redenção da humanidade. Uma
questão: as questões centrais permaneceram. Quem sou
eu?, pra que tudo isso?, porque eu não sou feliz apenas
quando possuo objeto?, porque o mal existe?, porque que
eu não tenho paz em meio a tanta convivência? Nesta hora,
não só a religiosidade, ela sofreu um revival, como a
filosofia passou, de novo, a ser interessante. E aí claro, a
filosofia como autoajuda, a filosofia como
autoconhecimento, a filosofia como auto capacidade, a
filosofia como prática sistemática. E de repente a gente tem
no final do século XX, em vários lugares do mundo e no
Brasil também, casas pra estudar filosofia; procura de
cursos de filosofia. Nós somos o único animal que é mortal.
Todos os outros animais são imortais. Embora todos
morram, nós somos o único que além de morrer, sabe que
vai morrer. Teu cachorro tá dormindo sossegado a essa
hora. Teu gato tá tranquilo. Você e eu sabemos que vamos
morrer.
Desse ponto de vista, não é a morte que me
importa, porque ela é um fato. O que me importa é o que eu
faço da minha vida enquanto minha morte não acontece,
pra que essa vida não seja banal, superficial, fútil, pequena.
Nesta hora, eu preciso ser capaz de fazer falta. No dia que
eu me for, e eu me vou, quero fazer falta. Fazer falta não
significa ser famoso, significa ser importante. Há uma
diferença entre ser famoso e importante. Muita gente não é
famosa e é absolutamente importante. Importar; quando
alguém me leva pra dentro, importa. Ele me porta pra
dentro, ele me carrega. Eu quero ser importante. Por isso,
pra ser importante, eu preciso não ter uma vida que seja
pequena. E uma vida se torna pequena quando ela é uma
vida que é apoiada só em si mesmo, fechada em si. Eu
preciso transbordar, ir além da minha borda, preciso me
comunicar, preciso me juntar, preciso me repartir. Nesta
hora, minha vida que, sem dúvida, ela é curta, eu desejo
que ela não seja pequena. (Cortella, Mário Sérgio.
Disponível em:
https://www.pensador.com/mario_sergio_cortella_textos/)