Leia o texto abaixo e responda a questão.
A (IN)EXISTÊNCIA DA EMPATIA EM UMA
SOCIEDADE LÍQUIDA E SUPERFICIAL
“[...] Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”
Fernando Pessoa
Das palavras de Fernando Pessoa, ecoam, em
minha mente, os versos “Tudo vale a pena, se a alma
não é pequena”. Isso me faz pensar na importância
de agirmos não apenas mecanicamente, mas,
sobremaneira, espiritualmente. Será que nossas
ações diárias visam o bem-estar, também, dos
outros? Ou será que nossa alma é pequena a ponto
de pensarmos apenas em nosso benefício próprio?
Infelizmente, diante da globalização, parece-me que
as pessoas estão, cada vez mais, mecânicas e menos
humanas, uma vez que é priorizado o bem material,
bem de consumo, em detrimento do bem espiritual.
Nessa linha de raciocínio, como brasileira, por meio
de evidências presentes em nossa realidade social,
reflito sobre a “invisibilidade pública” (COSTA, 2004)
decorrente de ações oriundas de uma sociedade
moderna e líquida (BAUMAN, 2001), cuja fluidez nos
consome diariamente.
Em primeiro lugar, percebo, no dia a dia,
a supervalorização de umas funções, como, por
exemplo, a de médico, engenheiro, advogado, em
detrimento de outras, não menos importantes, tais
como: gari, pedreiro, eletricista, dentre tantas outras.
Como comprovado por Costa (2004), nossa sociedade
tende a invisibilizar essas profissões cujos cidadãos
são da classe trabalhadora, como se eles tivessem a
obrigação de servir os grupos privilegiados. Pessoas
que possuem este pensamento, como diria o poeta
português Fernando Pessoa, parecem apresentar
a alma pequena, pois não conseguem enxergar a
semelhança e dependência que todos nós, cidadãos,
temos em comunidade, independentemente da
posição social que ocupamos. O que seria de
nós, por exemplo, sem o advogado, o médico, o
engenheiro e o professor? Mas, também, o que
seria de nós sem o gari que higieniza nossas vias
públicas, o pedreiro que constrói nossas casas e o
eletricista que nos possibilita a luz elétrica para que
possamos ter mais conforto e, até mesmo, cumprir nossas funções diárias?
Essas reflexões me fazem compreender, em
segundo lugar, que essa supervalorização e, por
conseguinte, a invisibilidade pública (COSTA, 2004)
é decorrente de uma modernidade líquida, conforme
aponta Bauman (2001), a qual tem como prioridade
os bens de consumo; bens esses que chegam
às mãos dos pobres com muito mais dificuldade.
Uma sociedade que cultiva ações materiais, em
detrimento de ações de compaixão e solidariedade.
Enxergo, como fruto desta realidade, pessoas que
constroem suas mansões em alicerces superficiais e
vazios, uma vez que, embora possuam os materiais
de construção mais caros e luxuosos, não possuem
sentimentos simples e imprescindíveis, tais como: o
amor e a empatia.
Portanto, concluo que essas pessoas
priorizam tanto os bens concretos que esquecem os
mais importantes, aqueles que não são visíveis aos
nossos olhos, mas que sentimos (SAINT-EXUPÉRY,
1987). São sentimentos que nos propiciam alicerçar
a nossa moradia da maneira mais forte possível,
propiciando-nos a capacidade de sermos empáticos;
em outras palavras, segundo o psicólogo norte-americano Carl Rogers, é importante procurarmos
enxergar o mundo com os olhos do outro, em vez
de enxergarmos o nosso mundo como um reflexo
nos olhos dele (ROGERS, 2017). Defendo, dessa
maneira, que nem as melhores tecnologias ou lentes
do mundo são capazes de nos fazer enxergar com
os olhos do outro, quando temos a alma pequena,
uma vez que compreendo que é procurando edificar
ações mais coerentes e empáticas, em meio a uma
sociedade alicerçada em superficialidades, que
tornaremos visíveis as necessidades e angústias do
próximo, em prol da “visibilidade pública” e grandeza
de nosso espírito.
Fonte: <https://www.revistadobiu.org/
publica%C3%A7%C3%B5es/v-1-n-2-2021 [editado].