Leio a reclamação de um repórter irritado que precisava falar com um
delegado e lhe disseram que o homem havia ido tomar um cafezinho.
Ele esperou longamente, e chegou à conclusão de que o funcionário
passou o dia inteiro tomando café.
Tinha razão o rapaz de ficar zangado. Mas com um pouco de imaginação
e bom humor podemos pensar que uma das delícias do gênio carioca é
exatamente esta frase:
— Ele foi tomar café.
A vida é triste e complicada. Diariamente é preciso falar com um número
excessivo de pessoas. O remédio é ir tomar um “cafezinho”. Para quem
espera nervosamente, esse “cafezinho” é qualquer coisa infinita e
torturante.
Depois de esperar duas ou três horas dá vontade de dizer:
— Bem cavaleiro, eu me retiro. Naturalmente o Sr. Bonifácio morreu
afogado no cafezinho.
Ah, sim, mergulhemos de corpo e alma no cafezinho. Sim, deixemos em
todos os lugares este recado simples e vago:
— Ele saiu para tomar um café e disse que volta já.
Quando a Bem-amada vier com seus olhos tristes e perguntar:
— Ele está?
Alguém dará o nosso recado sem endereço.
Quando vier o amigo e quando vier o credor, e quando vier o parente,
e quando vier a tristeza, e quando a morte vier, o recado será o mesmo:
— Ele disse que ia tomar um cafezinho...
Podemos, ainda, deixar o chapéu. Devemos até comprar um chapéu
especialmente para deixá-lo. Assim dirão:
— Ele foi tomar um café. Com certeza volta logo. O chapéu dele está
aí...
Ah! fujamos assim, sem drama, sem tristeza, fujamos assim. A vida é
complicada demais. Gastamos muito pensamento, muito sentimento,
muita palavra. O melhor é não estar.
Quando vier a grande hora de nosso destino nós teremos saído há uns
cinco minutos para tomar um café. Vamos, vamos tomar um cafezinho.
(Por Rubem Braga)