Quando eu era criança (e isso aconteceu em outro tempo e
em outro espaço), não era incomum ouvir a pergunta “Quão
longe é daqui até lá?” respondida por um “Mais ou menos uma
hora, ou um pouco menos se você caminhar rápido”. Num tempo
ainda anterior à minha infância, suponho que a resposta mais
comum teria sido “Se você sair agora, estará lá por volta do
meio-dia” ou “Melhor sair agora, se você quiser chegar antes que
escureça”. Hoje em dia, pode-se ouvir ocasionalmente essas
respostas. Mas serão normalmente precedidas por uma
solicitação para ser mais específico: “Você vai de carro ou a
pé?”.
“Longe” e “tarde”, assim como “perto” e “cedo”,
significavam quase a mesma coisa: exatamente quanto esforço
seria necessário para que um ser humano percorresse uma certa
distância — fosse caminhando, semeando ou arando. Se as
pessoas fossem instadas a explicar o que entendiam por “espaço”
e “tempo”, poderiam ter dito que “espaço” é o que se pode
percorrer em certo tempo, e que “tempo” é o que se precisa para
percorrê-lo. Se não fossem muito pressionados, porém, não
entrariam no jogo da definição. E por que deveriam? A maioria
das coisas que fazem parte da vida cotidiana são compreendidas
razoavelmente até que se precise defini-las; e, a menos que
solicitados, não precisaríamos defini-las. O modo como
compreendíamos essas coisas que hoje tendemos a chamar de
“espaço” e “tempo” era não apenas satisfatório, mas tão preciso
quanto necessário, pois era o wetware — os humanos, os bois e
os cavalos — que fazia o esforço e punha os limites. Um par de
pernas humanas pode ser diferente de outros, mas a substituição
de um par por outro não faria uma diferença suficientemente
grande para requerer outras medidas além da capacidade dos
músculos humanos.
Zygmunt Bauman. A modernidade como história do tempo. In: Modernidade líquida. Plínio Dentzien (Trad.). Rio de Janeiro: Zahar, 2001 (com adaptações).