A importância da família estruturada
Um levantamento do Ministério Público de São Paulo traz um dado revelador: dois terços dos jovens infratores da
capital paulista fazem parte de famílias que não têm um pai dentro de casa. Além de não viverem com o pai, 42% não
têm contato algum com ele e 37% têm parentes com antecedentes criminais.
Ajudam a engrossar essas estatísticas os garotos Waldik Gabriel, de 11 anos, morto em Cidade Tiradentes, Zona
Leste de São Paulo, depois de fugir da Guarda Civil Metropolitana, e Ítalo, de 10 anos, envolvido em três ocorrências de
roubo só em 2016, morto pela Polícia Militar no início de junho, depois de furtar um carro na Zona Sul da cidade. O pai
de Waldik é caminhoneiro e não vivia com a mãe. O de Ítalo está preso por tráfico. A mãe já cumpriu pena por furto e
roubo.
É certo que um pai presente e próximo ao filho faz diferença. Mas, mais que a figura masculina propriamente dita,
faz falta uma família estruturada, independentemente da configuração, que dê atenção, carinho, apoio, noções de
continência e limite, elementos que protegem os jovens em fase de desenvolvimento.
A mãe e a avó, nessa família brasileira que cresce cada vez mais matriarcal, desdobram-se para tentar cumprir
esses requisitos e preencher as lacunas, mas são “atropeladas” pela rotina dura. Muitas vezes, não têm tempo, energia,
dinheiro e voz para lidar com esses garotos e garotas que crescem na rua, longe da escola, em bairros sem
equipamentos de esporte e cultura, próximos de amigos e parentes que podem estar envolvidos com o crime.
A criança precisa ter muita autoestima e persistência para buscar nesse horizonte nebuloso um projeto de vida.
Sem apoio emocional, sem uma escola que estimule seu potencial, sem ter o que fazer com seu tempo livre, sem
enxergar uma luz no fim do túnel, ela fica muito mais perto da droga, do tráfico, do delito, da violência e da gestação na
adolescência. É nessa mesma família, sem pai à vista, de baixa renda, longe da sala de aula, nas periferias, que pipocam
os quase 15% das jovens que são mães na adolescência, taxa alarmante que resiste a baixar nas regiões mais carentes.
E o que acontece com essa menina que engravida porque enxerga na maternidade um papel social, uma forma de
justificar sua existência no mundo? Iludidas com a perspectiva de estabilizar um relacionamento (a família estruturada
que não têm?), elas ficam, usualmente, sozinhas, ainda mais distantes da escola e de seu projeto de vida. O pai da
criança some no mundo, e são elas que arcam com o ônus do filho, sobrecarregando um lar que já vivia no limite.
Segue-se um ciclo que parece não ter fim.
Sem políticas públicas que foquem nessa família mais vulnerável, no apoio emocional e social para esses jovens, em
uma escola mais atraente, em projetos de vida, em alternativas de lazer, a realidade diária na vida desses jovens
continuará a ser a gravidez na adolescência, a violência e a criminalidade.
(Jairo Bouer, 11/07/2016. Disponível em: http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/jairo-bouer/noticia/2016/07/importancia-da-familiaestruturada.html.)