A QUESTÃO SE REFERE AO TEXTO A SEGUIR.
Presos na telinha
Estudos de imagem revelam dados preocupantes, especialmente para um cérebro em
desenvolvimento: o excesso de exposição às telas está associado à redução de matéria
branca e cinzenta do órgão. A internet está encolhendo cérebros
Paloma Oliveto | 12/02/25
No início dos anos 1980, a TV a cabo se popularizou nos Estados Unidos. Com o
aumento da grade de programação, um novo medo foi desbloqueado entre a classe média:
o da televisão "abduzir" crianças e adolescentes. Não a1
toa, é exatamente o que acontece
em um dos filmes de terror de maior sucesso da época, Poltergeist (1982), no qual a
menininha Caroline é literalmente sugada pelo aparelho.
Se, na obra escrita e produzida por Steven Spielberg, são fantasmas que puxam a
protagonista-mirim para dentro da tela, na realidade, os pais temiam perder os filhos para o
excesso de canais. De fato, a oferta excessiva de programas mudou a dinâmica das
famílias.
Diversos estudos exploraram o impacto negativo da TV em aspectos do comportamento
infantojuvenil, incluindo maus hábitos alimentares, sedentarismo, redução de atividades
sociais e queda no interesse pelos estudos. Além disso, pesquisas de longo prazo não só
nos Estados Unidos atestaram redução na leitura e na pontuação em testes cognitivos.
Mas mesmo quem cresceu com a "babá eletrônica" não estava preparado para o
fenômeno que viria assombrar os pais décadas depois. O verdadeiro Poltergeist não viria da
telona, mas da microtela dos smartphones, de onde 96% dos usuários de internet acessam
a rede de computadores (dados do DataReportal).
Agora, não estamos mais falando de um punhado de canais de televisão, mas de um
conteúdo infinito disponível em qualquer lugar, 24 horas por dia. Adolescentes passam, em
média, nove horas conectados, um número conservador, considerando que as pesquisas
sobre o tema trabalham, geralmente, com autorrelato.
Em um artigo para o site The Conversation, psiquiatras da Universidade Estadual de
Wayne calcularam que, se uma pessoa passa "apenas" 50 horas por semana conectada
entre os 13 e 18 anos, no fim, terá dedicado as2
telas mais do que os 12 anos passados na
escola. Essa "graduação" on-line cobra seu preço: em todas as partes do mundo,
independentemente da renda familiar, as estatísticas de ansiedade e de depressão entre
crianças dispararam. Estudos de imagem revelam dados preocupantes, especialmente para
um cérebro em desenvolvimento: o excesso de exposição as3
telas está associado a4
redução de matéria branca e cinzenta do órgão. A internet está encolhendo cérebros.
Assim como na televisão, nem tudo é lixo na rede. Nos anos 1970, uma pesquisa
constatou que crianças que assistiam a5 Vila Sésamo tinham um nível de letramento
superior — 80% do programa era de conteúdo educativo. Agora, um estudo recente também
encontrou ganhos cognitivos entre meninos e meninas que acessam, como os pais,
conteúdos de qualidade.
O problema é que, se na época de ouro da televisão, bastava desligar o botão para
limitar a exposição, hoje, a não ser que os celulares sejam confiscados e trancafiados, é
impossível fazer esse controle.
Em Poltergeist, com a ajuda de orações, a família de Caroline consegue expulsar os
espíritos que puxavam a menina para dentro da tela. Agora, talvez precisemos de um
exorcismo para arrancar as crianças de lá.
Paloma Oliveto (Repórter sênior) - Formada na Universidade de Brasília, é especializada na cobertura de
ciência e saúde há mais de uma década. Entre as premiações recebidas, estão primeiro lugar no Grande Prêmio
Ayrton Senna e menção honrosa no Prêmio Esso.
OLIVETO, Paloma. Presos na telinha. Correio Braziliense, 13 de fevereiro de 2025. Disponível em:
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2025/02/7058174-presos-na-telinha.html. Acesso em: 13 fev. 2025.
Adaptado para esta avaliação.