Notícias municipais
Chegaram notícias de minha cidade natal. Um pouco
antigas: têm quarenta anos e estão numa coleção de jornais
velhos que me ofereceu um amigo, conterrâneo.
Começo a compreender a atitude de Machado de Assis,
ao responder a alguém que lhe dizia serem feias certas casas
do Rio: “São feias, mas são velhas”. O prestígio da ancianidade,
que não é aparente, velava a seus olhos a mesquinhez da
arquitetura.
Assim me ponho a folhear com emoção estas páginas
amarelecidas, temendo que se rasguem, porque a fibra do papel
se gastou como fibra humana. Cheiram preciosamente a
1910, e embora ninguém tenha nada que ver com a infância do
autor, eu direi que cheiram também a meninice, porque nelas se
revê o menino daquele tempo, e o menino vai pelas ruas, sobe
nas árvores, contempla longamente o perfil da serra, prova o
gosto dos araçás, dos araticuns e dos bacuparis* silvestres –
tudo isso que o jornal não tem, mas que se desenrola do jornal
como uma fita mágica.
* Araçás, araticuns e bacuparis = frutas tropicais
(Adaptado de Carlos Drummond de Andrade, Passeios na ilha)