Questões de Concurso Público Câmara Legislativa do Distrito Federal 2018 para Revisor de Textos
Foram encontradas 5 questões
Atenção: Para responder às questões de números 7 a 12, baseie-se no texto abaixo.
Uma palavra sobre cultura e Constituição
Todas as Constituições brasileiras foram lacônicas e genéricas ao tratar das relações entre cultura e Estado. Não creio que se deve propriamente lamentar esse vazio nos textos da Lei Maior. Ao Estado cumpre realizar uma tarefa social de base cujo vetor é sempre a melhor distribuição da renda nacional. Na esfera dos bens simbólicos, esse objetivo se alcança, em primeiro e principal lugar, construindo o suporte de um sistema educacional sólido conjugado com um programa de apoio à pesquisa igualmente coeso e contínuo.
A sociedade brasileira não tem uma “cultura” já determinada. O Brasil é, ao mesmo tempo, um povo mestiço, com raízes indígenas, africanas, europeias e asiáticas, um país onde o ensino médio e universitário tem alcançado, em alguns setores, níveis internacionais de qualidade e um vasto território cruzado por uma rede de comunicações de massa portadora de uma indústria cultural cada vez mais presente.
O que se chama, portanto, de “cultura brasileira” nada tem de homogêneo ou de uniforme. A sua forma complexa e mutante resulta de interpenetrações da cultura erudita, da cultura popular e da cultura de massas. Se algum valor deve presidir à ação do Poder Público no trato com a “cultura”, este não será outro que o da liberdade e o do respeito pelas manifestações espirituais as mais diversas que se vêm gestando no cotidiano do nosso povo. Em face dessa corrente de experiências e de significados tão díspares, a nossa Lei Maior deveria abster-se de propor normas incisivas, que soariam estranhas, porque exteriores à dialética das “culturas” brasileiras. Ao contrário, um certo grau de indeterminação no estilo de seus artigos e parágrafos é, aqui, recomendável.
(Adaptado de: BOSI, Alfredo. Entre a Literatura e a História. São Paulo: Editora 34, 2013, p. 393-394)
Observando-se a construção da frase Não creio que se deve propriamente lamentar esse vazio nos textos da Lei Maior, é correto afirmar que
Atenção: Leia o texto abaixo para responder às questões de 31 a 43.
Para assegurar a pertinência da dominação produtiva industrial, do modo de pensar e de fazer que a gera e que ela induz, é preciso fazer romper a alteridade em múltiplas facetas de exotismo. É preciso também fazer aparecer as sociedades ainda diferentes como caminhos sem saída, erros, ausências ou inacabados no curso de uma progressão histórica inelutável. Na melhor das hipóteses, poder-se-ia considerá-los como traços de fases anteriores na construção da cidade humana universal. As sociedades que a exploração descobre, tornam-se imagens fotográficas e depois cinematográficas suscetíveis de ser transportadas, editadas, montadas, referidas e, sobretudo, comentadas em relação a um espectador cuja centralidade e o caráter de referencialidade essencial não são postos em questão. Trata-se de tentativas de levantamentos sistemáticos de desvios e de etapas no que será a elaboração de uma humanidade alocada sob a chancela universal do darwinismo.
A melhora das condições técnicas da exploração do mundo (transporte e comunicação se aperfeiçoam com a máquina a vapor, a eletricidade e o telégrafo) fornecia a essas intenções meios cada vez mais performativos. O cinema completa a panóplia dos instrumentos para essa coleta generalizada, fundindo a ambição do olhar à objetividade pela supressão dos obstáculos do espaço e do tempo. A imagem animada capta o transitório da duração, supera a subjetividade do testemunho duvidoso dos viajantes de longa distância, suprime os desvios especiosos da memória: os momentos fugidios da vivência, as singularidades e as diferenças do Outro tornam-se transportáveis e, portanto, observáveis à vontade, como o obelisco de Luxor, as múmias do Egito ou os afrescos do Partenon.
A etnografia iniciada por Franz Boas, e que fará da pesquisa de campo seu “laboratório” indispensável, emergindo dos limbos da reflexão teórica e frequentemente ética sobre as origens e as etapas das sociedades humanas, se tornará, do mesmo modo, um instrumento dessa coleção de realidades do mundo e de uma “objetivação” no mesmo sentido do olhar. A apresentação de uma observação dinâmica e totalizante, a passagem “pelo campo” e, portanto, a experimentação, fazem do cinema e da etnografia irmãos gêmeos de um empreendimento comum de descoberta, de identificação, de apropriação e talvez de absorção e de assimilação do mundo e de suas histórias.
Ao extremo da distância/diferença constatada, nas regiões mais remotas, no seio das sociedades mais exóticas, se – isto é, este anônimo genérico e referencial que se considera o homem branco – identificavam, com um fervor receoso, primitivismos nos limites de um inquietante estado de natureza, canibalismos “selvagens” marcando aparentemente o que devia ser o salto qualitativo em direção à cultura ou antes em direção à Civilização com sua maiúscula. Com essas designações, essas estigmatizações fascinadas, o homem ocidental decerto mastigava, como em uma denegação analítica, sua própria bulimia, sua necessidade incessante de apropriação, de dominação, projetando finalmente no outro seu próprio desejo de consumo, de devoração...! A gravação por imagem e som, assim como o empreendimento de categorização etnográfica, contribuem para os mesmos efeitos: absorver a distância material do outro e reduzi-lo a imagem e a conceitos de que se alimentam meu olhar e minha mente
(Adaptado de: PIAULT, Marc. Antropologia e Cinema. São Paulo, Editora Unifesp, 2018)
A melhora das condições técnicas da exploração do mundo (transporte e comunicação se aperfeiçoam com a máquina a vapor, a eletricidade e o telégrafo) fornecia a essas intenções meios cada vez mais performativos.
Mantendo-se a correção e, em linhas gerais, o sentido, as orações que compõem a frase acima encontram-se articuladas por meio de subordinação em:
Atenção: Leia o texto abaixo para responder às questões de 31 a 43.
Para assegurar a pertinência da dominação produtiva industrial, do modo de pensar e de fazer que a gera e que ela induz, é preciso fazer romper a alteridade em múltiplas facetas de exotismo. É preciso também fazer aparecer as sociedades ainda diferentes como caminhos sem saída, erros, ausências ou inacabados no curso de uma progressão histórica inelutável. Na melhor das hipóteses, poder-se-ia considerá-los como traços de fases anteriores na construção da cidade humana universal. As sociedades que a exploração descobre, tornam-se imagens fotográficas e depois cinematográficas suscetíveis de ser transportadas, editadas, montadas, referidas e, sobretudo, comentadas em relação a um espectador cuja centralidade e o caráter de referencialidade essencial não são postos em questão. Trata-se de tentativas de levantamentos sistemáticos de desvios e de etapas no que será a elaboração de uma humanidade alocada sob a chancela universal do darwinismo.
A melhora das condições técnicas da exploração do mundo (transporte e comunicação se aperfeiçoam com a máquina a vapor, a eletricidade e o telégrafo) fornecia a essas intenções meios cada vez mais performativos. O cinema completa a panóplia dos instrumentos para essa coleta generalizada, fundindo a ambição do olhar à objetividade pela supressão dos obstáculos do espaço e do tempo. A imagem animada capta o transitório da duração, supera a subjetividade do testemunho duvidoso dos viajantes de longa distância, suprime os desvios especiosos da memória: os momentos fugidios da vivência, as singularidades e as diferenças do Outro tornam-se transportáveis e, portanto, observáveis à vontade, como o obelisco de Luxor, as múmias do Egito ou os afrescos do Partenon.
A etnografia iniciada por Franz Boas, e que fará da pesquisa de campo seu “laboratório” indispensável, emergindo dos limbos da reflexão teórica e frequentemente ética sobre as origens e as etapas das sociedades humanas, se tornará, do mesmo modo, um instrumento dessa coleção de realidades do mundo e de uma “objetivação” no mesmo sentido do olhar. A apresentação de uma observação dinâmica e totalizante, a passagem “pelo campo” e, portanto, a experimentação, fazem do cinema e da etnografia irmãos gêmeos de um empreendimento comum de descoberta, de identificação, de apropriação e talvez de absorção e de assimilação do mundo e de suas histórias.
Ao extremo da distância/diferença constatada, nas regiões mais remotas, no seio das sociedades mais exóticas, se – isto é, este anônimo genérico e referencial que se considera o homem branco – identificavam, com um fervor receoso, primitivismos nos limites de um inquietante estado de natureza, canibalismos “selvagens” marcando aparentemente o que devia ser o salto qualitativo em direção à cultura ou antes em direção à Civilização com sua maiúscula. Com essas designações, essas estigmatizações fascinadas, o homem ocidental decerto mastigava, como em uma denegação analítica, sua própria bulimia, sua necessidade incessante de apropriação, de dominação, projetando finalmente no outro seu próprio desejo de consumo, de devoração...! A gravação por imagem e som, assim como o empreendimento de categorização etnográfica, contribuem para os mesmos efeitos: absorver a distância material do outro e reduzi-lo a imagem e a conceitos de que se alimentam meu olhar e minha mente
(Adaptado de: PIAULT, Marc. Antropologia e Cinema. São Paulo, Editora Unifesp, 2018)
No segmento do modo de pensar e de fazer que a gera e que ela induz, a oração sublinhada complementa o sentido de
Atenção: Leia o texto abaixo para responder às questões de números 54 a 59.
O paulista Monteiro Lobato (1882-1948) não foi apenas um grande escritor, foi também um editor pioneiro no Brasil com a Cia. Editora Nacional, portanto, uma autoridade em matéria de livros, dominando desde a concepção do texto até o produto acabado na prateleira. Invoco sua figura para falar da coisa mais banal e nem por isso menos dramática quando se trata de escrever e publicar: o erro de revisão. Duas semanas atrás quase perdi o sono ao deixar sair aqui uma crônica com quatro sacis gritantes − quatro erros de digitação que o paginador Fábio Oliveira, assim que solicitado, me fez o imenso favor de eliminar. Falando certa vez a respeito dessa tragédia também conhecida como gralha ou pastel e que, no seu tempo, ainda se chamava erro tipográfico, Lobato assim se manifestou: “A luta contra o erro tipográfico tem algo de homérico. Durante a revisão os erros se escondem, fazem-se positivamente invisíveis. Mas, assim que o livro sai, tornam-se visibilíssimos, verdadeiros sacis a nos botar a língua em todas as páginas. Trata-se de um mistério que a ciência ainda não conseguiu decifrar”.
Se é assim com o livro, produto de elaboração demorada que comumente é lido e relido muitas vezes e por muitos olhos antes de ser impresso, o que dizer do texto jornalístico, que hoje se escreve e se publica quase simultaneamente no meio digital? Embora em geral curto, o texto de jornal nem por isso está menos sujeito ao acúmulo de gralhas. Algum tempo atrás, ao falar da obrigação de rever a própria escrita em sua coluna em O Globo, Elio Gaspari empregou o advérbio perfeito ao dizer que lera e relera aquele trabalho “piedosamente” antes de autorizar sua publicação. O termo supõe a ideia de penitência, daí sua exatidão, porque se o trabalho de escrever pode ser penoso ou gratificante, rever o próprio texto é sempre uma penitência. E uma penitência cada vez mais inevitável, já que a figura do revisor parece fadada a desaparecer das redações, se é que já não desapareceu.
E não é somente grande pena que esse animal indispensável esteja em risco de extinção, o seu fim seria também a consumação de uma eterna injustiça, porque injustiçado ele tem sido desde sempre. Falo com a autoridade de quem já reviu muito texto alheio durante muito tempo. O revisor é aquele profissional que acerta milhões de vezes, sem merecer um único elogio, mas no dia em que deixa passar um só erro ele é prontamente chamado de incompetente.
Deve ser por isso que José Saramago, certamente um bom conhecedor das agruras da profissão, criou a figura impagável daquele revisor chamado Raimundo Silva no romance História do Cerco de Lisboa. Tendo passado uma vida inteira num trabalho apagado e obscuro, um belo dia Raimundo Silva resolve acrescentar uma simples palavra − “não” − ao texto que está a revisar, e com isso muda completamente os rumos de toda uma história. Bem feito.
(MOREIRA, Eliezer. “Revisão de texto, uma penitência”, O Mirante, 13/06/2016)
O segmento sublinhado que expressa ideia de consequência encontra-se em:
Atenção: Leia o texto abaixo para responder às questões de números 54 a 59.
O paulista Monteiro Lobato (1882-1948) não foi apenas um grande escritor, foi também um editor pioneiro no Brasil com a Cia. Editora Nacional, portanto, uma autoridade em matéria de livros, dominando desde a concepção do texto até o produto acabado na prateleira. Invoco sua figura para falar da coisa mais banal e nem por isso menos dramática quando se trata de escrever e publicar: o erro de revisão. Duas semanas atrás quase perdi o sono ao deixar sair aqui uma crônica com quatro sacis gritantes − quatro erros de digitação que o paginador Fábio Oliveira, assim que solicitado, me fez o imenso favor de eliminar. Falando certa vez a respeito dessa tragédia também conhecida como gralha ou pastel e que, no seu tempo, ainda se chamava erro tipográfico, Lobato assim se manifestou: “A luta contra o erro tipográfico tem algo de homérico. Durante a revisão os erros se escondem, fazem-se positivamente invisíveis. Mas, assim que o livro sai, tornam-se visibilíssimos, verdadeiros sacis a nos botar a língua em todas as páginas. Trata-se de um mistério que a ciência ainda não conseguiu decifrar”.
Se é assim com o livro, produto de elaboração demorada que comumente é lido e relido muitas vezes e por muitos olhos antes de ser impresso, o que dizer do texto jornalístico, que hoje se escreve e se publica quase simultaneamente no meio digital? Embora em geral curto, o texto de jornal nem por isso está menos sujeito ao acúmulo de gralhas. Algum tempo atrás, ao falar da obrigação de rever a própria escrita em sua coluna em O Globo, Elio Gaspari empregou o advérbio perfeito ao dizer que lera e relera aquele trabalho “piedosamente” antes de autorizar sua publicação. O termo supõe a ideia de penitência, daí sua exatidão, porque se o trabalho de escrever pode ser penoso ou gratificante, rever o próprio texto é sempre uma penitência. E uma penitência cada vez mais inevitável, já que a figura do revisor parece fadada a desaparecer das redações, se é que já não desapareceu.
E não é somente grande pena que esse animal indispensável esteja em risco de extinção, o seu fim seria também a consumação de uma eterna injustiça, porque injustiçado ele tem sido desde sempre. Falo com a autoridade de quem já reviu muito texto alheio durante muito tempo. O revisor é aquele profissional que acerta milhões de vezes, sem merecer um único elogio, mas no dia em que deixa passar um só erro ele é prontamente chamado de incompetente.
Deve ser por isso que José Saramago, certamente um bom conhecedor das agruras da profissão, criou a figura impagável daquele revisor chamado Raimundo Silva no romance História do Cerco de Lisboa. Tendo passado uma vida inteira num trabalho apagado e obscuro, um belo dia Raimundo Silva resolve acrescentar uma simples palavra − “não” − ao texto que está a revisar, e com isso muda completamente os rumos de toda uma história. Bem feito.
(MOREIRA, Eliezer. “Revisão de texto, uma penitência”, O Mirante, 13/06/2016)
A respeito do segmento sublinhado, em E uma penitência cada vez mais inevitável, já que a figura do revisor parece fadada a desaparecer das redações, se é que já não desapareceu, é correto afirmar que é oração