Para responder à questão, leia o texto abaixo.
O escritor Joseph Conrad morreu em 3 de agosto de 1924, em sua casa de campo de Bishopsbourne, próximo a Canterbury.
Tinha 66 anos, vinte dos quais passou navegando e outros trinta escrevendo.
Conrad viveu num período de transição do capitalismo e do colonialismo britânico: a passagem da navegação a vela para a
era do vapor. O seu mundo heroico é a civilização dos veleiros dos pequenos armadores, um mundo de clareza racional, de disciplina
no trabalho, de coragem e dever contrapostos ao mesquinho espírito de lucro. A nova linguagem do mar, dos navios a vapor das
grandes companhias, lhe parece sórdida e vil. Assim, quem ainda sonha com as antigas virtudes torna-se quixotesco ou se rende,
arrastado para o outro polo da humanidade: os dejetos humanos, os agentes comerciais sem escrúpulos, os burocratas coloniais”,
que Conrad contrapõe aos velhos comerciantes-aventureiros, românticos, como o seu personagem Tom Lingard. Naquele ambiente
que frequentemente perpassa as páginas conradianas, a confiança nas forças do homem jamais desaparece.
Mesmo distante de qualquer rigor filosófico, Conrad intuiu o momento crucial do pensamento burguês em que o otimismo
racional perdia as últimas ilusões e uma erupção de irracionalismos e misticismos ganhava terreno. Conrad via o universo como algo
obscuro e inimigo, mas a ele contrapunha as forças do homem, sua ordem moral e coragem. Perante uma avalanche caótica que lhe
vinha em cima, uma concepção do mundo repleta de mistérios e desesperos, o humanismo ateu de Conrad resiste e finca os pés. Foi
um reacionário irredutível, mas hoje a sua lição só pode ser captada plenamente por quem reconhece a própria nobreza no trabalho,
por quem sabe que aquele princípio de fidelidade que Conrad prezava sobremaneira não pode estar dirigido só para o passado.
(Adaptado de: CALVINO, Ítalo. Por que ler os clássicos. São Paulo: Companhia das Letras, edição eletrônica)