INSTRUÇÃO: Leia o texto a seguir para responder à questão.
Sanduíche-íche-íche
É certo que a língua é viva, mas há certos modismos que
me irritam demais
Eu sei que a língua é viva, que a rua é quem pauta as
gramáticas e não o contrário. Tô lendo o maravilhoso “Latim
em Pó, um Passeio pela Formação do Nosso Português”,
do Caetano W. Galindo e não perco uma coluna do
Sérgio Rodrigues.
Os dois são democratas radicais da linguagem. Sabem que o
erro de hoje é a norma culta de amanhã. Que a escrita cheia
de rococós é como uma coroa cheia de brilhos, geralmente
usada para esconder uma cachola vazia, pra constranger o
leitor ou pra ostentar erudição [...].
Eu tento me portar como o Galindo e o Sérgio, mas talvez
não seja tão generoso. Há certos modismos que me
irritam demais. Eu respiro fundo. Repito mentalmente
três vezes [...] “o povo é o inventalínguas”, “o povo é o
inventalínguas”, “o povo é o inventalínguas”, mas cáspita!
LANCHE é qualquer coisa que se come entre as refeições,
não SANDUÍCHE!
[...] Você vai no McDonald’s e a mulher fala “quer batata
frita pra acompanhar o lanche?”. “Não é lanche, são nove e
meia da noite, é jantar.” “Oi?” “Nada. Manda as batatinhas
com o SANDUÍCHE.”
Fico imaginando como se deu essa transição semântica.
A mãe preparava a lancheira do filho, punha ali um misto,
dizia “tó aqui seu lanche, Arthurzinho” e o Arthurzinho
concluía que sanduíche era lanche. Se a mãe do Arthurzinho,
em vez de um misto, pusesse na lancheira uma mexerica,
estaríamos todos, hoje em dia, chamando mexerica de
lanche? Seria um caos, porque tá pra brotar no dicionário
uma fruta com mais nomes: mexerica, tangerina, bergamota,
mimosa, pokan, murcote, tanja... Lanche?
PRATA, Antonio. Sanduíche-íche-íche. Folha de S.Paulo.
Colunas, 17 jun. 2023. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.
br/colunas/antonioprata/2023/06/sanduiche-iche-iche.shtml.
Acesso em: 10 jan. 2024. [Fragmento]