Salários mais iguais: o papel do envelhecimento e
das decisões de carreira
Na maioria dos países com dados disponíveis, a
diferença salarial entre homens e mulheres diminuiu nas
últimas duas décadas. Parte dessa redução se deve ao
envelhecimento demográfico. Os trabalhadores mais
velhos permanecem no mercado por mais tempo,
retendo posições de destaque e dificultando a
mobilidade ascendente dos homens jovens. Isso resulta
em uma redução da disparidade de rendimentos entre os
gêneros.
Analisando quatro décadas de dados salariais dos EUA,
Reino Unido, Canadá e Itália, Arellano-Bover e seus
colegas identificaram que a diferença salarial entre
homens e mulheres diminuiu, com os jovens de ambos
os gêneros recebendo salários mais semelhantes. As
gerações mais antigas, que apresentavam maiores
desigualdades, estão se aposentando, o que reduz o gap
salarial geral. Entre 1976 e 1995, a probabilidade de
homens de 25 anos trabalharem no décimo superior de
grupos empresariais diminuiu, em média, 6 pontos
percentuais, enquanto a mesma probabilidade para
mulheres caiu apenas 2 pontos percentuais.
Ou seja, a diferença entre os rendimentos médios de
uma sociedade não nos informa muito sobre questões
ligadas à igualdade de gênero. E mesmo com o
envelhecimento demográfico contínuo, é improvável que
esse mecanismo reduza ainda mais a diferença salarial
de gênero. Já que desde 1995 a diferença entre a
classificação salarial média de homens e mulheres
jovens é mínima.
As decisões individuais também desempenham um papel
importante nessa dinâmica, uma vez que a escolha da
graduação está fortemente ligada aos ganhos futuros.
Homens jovens em média preferem áreas de estudo
ligadas a exatas e tecnologia, que proporcionam altos
ganhos. Nos EUA, 63% da diferença salarial de
recém-formados é devido ao tipo de curso universitário;
na Itália, é 51%. Já as mulheres tendem a escolher
áreas de trabalho como educação e cuidados, que
pagam menos em média.
Além disso, o gap salarial se amplia principalmente após
nascimento do primeiro filho, quando as mulheres o
sofrem maior pressão social e familiar para priorizar o
cuidado com os filhos em detrimento da carreira. Essas
expectativas têm outros tipos de custos para os homens:
tendência a aceitar horas extras e demonstrar afeto
através da provisão, ao custo de quase não ter tempo
com familiares. Essa tendência emerge no mundo inteiro,
ainda que em graus distintos. Consequentemente, as
mulheres estão super-representadas em empregos de
baixa remuneração para atender essas
responsabilidades, trabalhando com maior flexibilidade e
por menos horas.
Alguns argumentam que as diferenças salariais se
devem a fatores biológicos e preferências distintas.
Embora homens e mulheres se diferenciem em alguns
aspectos psicológicos que podem influenciar o mercado
de trabalho, essas diferenças explicam apenas uma
ínfima parte da disparidade salarial de gênero. Além
disso, não há garantia de que a valorização de certas
características traga resultados econômicos positivos
para as empresas.
Por isso, para aqueles que almejam alcançar a paridade
financeira, o progresso está claramente ligado às
escolhas educacionais, de carreira e arranjos familiares.
Antes de avaliar uma sociedade apenas pela diferença
de rendimentos, é crucial analisar outros indicadores de
desigualdade de gênero. Exemplos incluem a taxa de
matrícula em diferentes níveis educacionais, acesso a
financiamento e capital para negócios, disponibilidade e
uso de licenças parentais, direitos de propriedade e
herança, mobilidade territorial, taxas de violência de
gênero e a força das normas sociais. O salário tende a
ser uma consequência de todos esses fatores.
Homens e mulheres devem ter maior liberdade para
decidir juntos como equilibrar a vida pessoal e
profissional. Isso requer tanto um Estado que garanta
igualdade de oportunidades com políticas públicas
eficientes quanto menos julgamentos das escolhas
alheias por parte de todos nós.
Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/