Texto para responder à questão.
O dinamismo lexical: o dizer nosso de cada dia
O léxico de uma língua constitui-se do saber vocabular de
um grupo sociolinguístico e culturalmente definido; é o conhecimento partilhado que povoa a consciência do falante, onde esse
acervo se configura como verdadeira janela através da qual o
indivíduo divisa o seu entorno, ao mesmo tempo em que, ademais revela os valores, as crenças, os costumes, os modismos
que viabilizam a comunidade em que vive o usuário de tal e qual
palavra. É no léxico, ainda, que se gravam – e, não raro, pirogravam – as designações que rotulam as mudanças encadeadoras
dos caminhos e dos descaminhos da humanidade, além de
comporem o cenário de revelação tanto da realidade quanto
dos fatos culturais que permearam a sua história.
O léxico de todas as línguas vivas é essencialmente
marcado pela mobilidade, as palavras e as expressões com
elas construídas surgem, desaparecem, perdem ou ganham
significações, de sorte a promover o encontro marcado do
falante com a realidade do mundo biossocial que o acolhe:
o homem e o mundo encontram-se no signo.
As mudanças linguísticas, em especial as concernentes ao
léxico, nada apresentam de espantoso ou de estranho: elas são,
em tudo, análogas às transformações históricas que traçam
seus cursos dentro de certa previsibilidade que só surpreende o
desatento e o desconhecedor das artes de conviver – a imutabilidade quer da história, quer da palavra que a descreve e a
realiza é que seria um fato a se estranhar.
O incremento do acervo lexical de uma língua é inconteste: segundo Antônio Houaiss(1983:20), “em tempos de Augusto Comte (1798-1857), há pouco mais de 140 anos, portanto, era possível designar todas as ciências, artes, técnicas
e profissões então existentes com 240 palavras; estudos da
Unesco, em 1963, advertiam que a mesma tarefa só seria
levada a efeito com um acervo de 24 mil entre palavras e
locuções. É ainda de Houaiss a informação de que “cerca de
90% dos 400 mil vocábulos das línguas de cultura foram forjados de meados do século XIX para cá.” [...]
O que se depreende do exposto é o fato de que o falante,
inserido no seu tempo e no seu espaço, é instado a ampliar
consideravelmente o seu inventário vernacular para dar conta
do seu entorno e do seu estar-no-mundo, sob pena de, se assim
não fizer, ser exilado dos jogos de convivência que têm, na
palavra, o seu penhor e a sua fonte de produção. [...]
A verdade é que a legitimação do que se diz ou do que
se deve dizer depende fundamentalmente da chancela da
comunidade, do povo – povo que constrói nações, fortalece
impérios, escreve e rescreve a sua história, vitaliza idiomas:
povo que, por direito, justiça e fato, é o único, legítimo e
verdadeiro “dono da língua”.
(SILVA, Maria Emília Barcellos da. Língua Portuguesa em debate:
conhecimento e ensino / José Carlos de Azeredo (organizador). 4. ed.-
Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. Trecho adaptado.)