Questões de Concurso Público Prefeitura de Pitangueiras - SP 2024 para Agente de Organização Escolar

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Q2371381 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
O objetivo comunicativo do texto é evidenciar:
Alternativas
Q2371382 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
Considerando o texto de Ignácio de Loyola Brandão, assinale a alternativa em que a palavra grifada não mantém o mesmo valor semântico se substituída pela expressão indicada.
Alternativas
Q2371383 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
Quando se flexiona o grau de um adjetivo, evidencia-se a intensidade da qualidade que ele quer expressar. No caso do termo “irritadíssimo” (13º§), que representa a flexão do adjetivo “irritado”, foi empregado:
Alternativas
Q2371384 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
O significado e o sentido das palavras são fundamentais para o estudo da língua portuguesa. Quando dizemos que a palavra foi utilizada em sentido figurado, nos referimos ao fato de o autor ter explorado a significação da palavra e ampliado suas possibilidades de significação para além do sentido básico ou de dicionário. Dessa forma, é possível inferir que se encontra no sentido figurado o seguinte excerto textual: 
Alternativas
Q2371385 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
Considere o trecho textual: A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.” (13º) É possível inferir que a expressão “a esta altura”, um ditado bastante popular na língua portuguesa, refere-se a:
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Q2371386 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
Observe os trechos literais: “E o boy ali, todos os dias, firme, à espera.” (12º§) eTodos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114.” (16º§) Podemos afirmar que a locução adverbial “todos os dias” destacada anteriormente pode ser substituída, sem alteração de sentido, por:
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Q2371387 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
Considerando os aspectos textuais, marque V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas.

( ) Em “Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio.” (2º§), a vírgula foi utilizada para separar adjunto adverbial deslocado.

( ) No trecho “Então, a festa de inauguração, chope.” (15º§), a expressão “de inauguração” evidencia função adjetiva.

( ) Em “Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível.” (16º§), a expressão destacada pode ser substituída, sem alteração semântica, por “havia de fazer”.

A sequência está correta em
Alternativas
Q2371388 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
A partir do emprego de elementos coesivos, é possível inferir que a correspondência entre tal elemento e seu referente está inadequada em:
Alternativas
Q2371389 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
No fragmento “As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível.” (16º§), o termo sublinhado se refere ao:
Alternativas
Q2371390 Português
O homem que devia entregar a carta


        Era sua primeira missão como office-boy. Estava com dezoito anos, mas não tinha conseguido nenhum outro emprego. Apesar dos jornais garantirem que não havia crise, ele simplesmente batera o nariz em dezenas de portas e tinha enfrentado filas até dois quilômetros. O patrão pediu que ele entregasse uma carta, com protocolo. E avisou: a pessoa que receber precisa assinar este papelzinho. Só entregue mesmo ao destinatário, a ninguém mais, esta carta é da maior importância.

        Foi. Ao chegar, verificou o endereço: era de um terreno baldio. Comparou, indagou. Não havia engano mesmo. O número correspondia ao terreno. Voltou ao patrão, contou.

          E o patrão: – Eu sei que é um terreno. Mas vão construir um prédio ali.

          – Vão? E o que faço?
          – Você entrega a carta, como mandei.

        O patrão era um homem ocupado, dispensou o boy. Ele voltou ao local. Nada. Um terreno sujo, cheio de mato. O que fazer? Sentou-se, pensando que se alguém chegasse por ali, poderia dar uma informação. No fim do dia, foi embora.

          Na manhã seguinte, ao subir no elevador, encontrou o patrão.

          – Como é, entregou a carta?
          – Não tem prédio nenhum lá.
          – Mas vão construir. Já conseguiram até financiamento da Caixa Econômica.

       O boy voltou ao terreno. Naquele e nos dias seguintes. Nas semanas e meses. E o patrão, já inquieto, querendo saber da carta, o boy mais inquieto ainda, já sem saber por que não construíam logo o tal edifício. Um dia, viu homens carpindo o mato. No outro dia, ergueram um tapume. Em seguida, instalaram placas. Logo vieram tratores e máquinas. Cavaram, cavaram, caminhões basculantes levaram a terra, chegou cimento, aço, pedras. As fundações ficaram prontas.

         E o boy ali, todos os dias, firme, à espera. Fazendo amizade com os operários, capatazes da obra, aprendendo como se mistura o cimento, como se processa a concretagem, acompanhando os andares que subiam, as lajes sendo terminadas.

            O prédio subiu. A esta altura, o patrão, irritadíssimo com o boy, ameaçava despedi-lo.

             – Que porcaria você é que nem consegue entregar uma carta?

           O boy, ferido no orgulho, plantou-se então, dia e noite, sentado num dos andaimes. Amigo de todos os operários, comia e bebia com eles, contava casos, ouvia histórias do Nordeste, lendas da Bahia, conhecia a miséria que ia pelo interior, os dramas de fome e doença, o abandono, a seca. A parte mais demorada, lenta. Colocar portas, janelas, armários, rebocar, passar massa corrida, pintar, instalar pias, torneiras, vasos, tacos. Então, a festa de inauguração, chope. E as faixas, os corretores ansiosos por enganar alguém com as compras maravilhosas que terminavam em pesadelo.

           As pessoas começaram a se mudar. Todos os dias, o boy batia à porta do apartamento 114. O destinatário ainda não tinha se mudado. Agora, o boy já tinha feito vinte anos e o patrão tinha lhe dado um prazo fixo, fatal, irreversível. Ou entregava a carta, ou era despedido.

           Ele batia à porta, ninguém atendia. Até que um caminhão trouxe mudanças para o 114. Mas a porta continuava fechada, muda.

             Batia, e nada.
          Uma tarde, abriram. Um senhor grisalho, ar sonolento. O boy, triunfante, estendeu a carta. O homem olhou o destinatário.
             – Não sou eu. Nem sei quem é.
             – Como? O senhor comprou o apartamento de alguém?
             – Não. Comprei na planta. Não teve nenhum dono antes de mim.
             – Que faço? – Passa na portaria, fala com o zelador.

       O boy passou, explicou a situação. O zelador apanhou um carimbo, bateu no envelope: destinatário desconhecido. E devolveu a carta ao boy.


(Ignácio de Loyola Brandão. In: Cadeiras Proibidas.)
No trecho “E o boy ali, todos os dias, firme, à espera.” (12º§), a aplicação do sinal indicativo de crase encontra-se correto. Tal fato não pode ser evidenciado em:
Alternativas
Respostas
1: B
2: C
3: A
4: D
5: A
6: C
7: C
8: D
9: A
10: B