Questões de Concurso Público Prefeitura de São Fidélis - RJ 2024 para Agente Comunitário de Saúde

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Q3061071 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
Em todas as frases, transcritas do texto, as formas verbais estão flexionadas no mesmo tempo, EXCETO em: 
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Q3061072 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
No conto “O mau vidraceiro”, a compulsão por agir de forma inexplicavelmente antissocial termina desmascarando a pretensão da ordem indigente. Paga-se caro pelo momento intempestivo, mas, ao mesmo tempo, o alívio libertador parece compensar todo o prejuízo. Tal particularidade pode ser evidenciada em, EXCETO:
Alternativas
Q3061073 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
Geralmente lido como um elogio a uma visão artística da vida em contraste com a trivialidade do vendedor de vidros, a respeito do conto “O mau vidraceiro” NÃO é possível inferir que:
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Q3061074 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
Costa Val, em “Redação e Textualidade”, declara que “antes de mais nada, um texto é uma unidade de linguagem em uso, cumprindo uma função identificável, num dado jugo de atuação sociocomunicativa. Tem papel determinante em sua produção e recepção uma série de fatores pragmáticos que contribuem para a construção de seu sentido e possibilitam que seja reconhecido como um emprego normal da língua”. Levando-se em consideração que o significado das palavras está associado ao sentido e, portanto, ao conteúdo e ao contexto, o significado da palavra em destaque está indevidamente indicado em:
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Q3061075 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
No nosso dia a dia convivemos com uma diversidade de textos. Como a língua tem uma função social, todos os textos possuem em comum uma finalidade específica: estabelecer uma situação comunicativa. A linguagem figurada tem como característica primordial a subjetividade, a qual expressa um maior envolvimento por parte de quem a produz, permitindo que haja mais de uma interpretação por parte dos interlocutores. Tendo em vista que o autor utiliza-se de uma linguagem figurada na construção das ideias do texto, assinale o trecho em que tal recurso é aplicado.
Alternativas
Q3061076 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
Assinale a alternativa que altera o valor semântico estabelecido pelo termo destacado “Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.” (1º§)
Alternativas
Q3061077 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
Possuem papel adjetivo nos segmentos a seguir, os termos em destaque, EXCETO:
Alternativas
Q3061078 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
“(Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).” (8º§) É possível inferir que o parágrafo completo entre parênteses assinala que:
Alternativas
Q3061079 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
“O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.” (2º§) Depreende-se que o fragmento manifesta, ou seja, externa um tom de:
Alternativas
Q3061080 Português
O mau vidraceiro

          Existem naturezas puramente contemplativas e totalmente impróprias para a ação, que, no entanto, sob uma impulsão misteriosa e desconhecida, agem às vezes com uma rapidez de que elas próprias se julgariam incapazes.
          Como aquele que, temendo encontrar com o zelador uma notícia aflitiva, ronda covardemente durante uma hora frente à porta da casa sem ousar entrar, como aquele que guarda durante quinze dias uma carta sem abri-la, ou só ao fim de seis meses se conforma em efetuar um empreendimento necessário desde há um ano, elas se sentem às vezes bruscamente precipitadas para a ação por uma força irresistível, como a flecha de um arco. O moralista e o médico, que afirmam saber de tudo, não podem explicar de onde vem tão de súbito uma tão louca energia nessas almas preguiçosas e voluptuosas, e como é que elas, incapazes de cumprir as coisas mais simples e mais necessárias, encontram em dado momento uma coragem de luxo para executar os atos mais absurdos e até, muitas vezes, os mais perigosos.
         Um dos meus amigos, o mais inofensivo sonhador que já existiu, ateou fogo uma vez numa floresta, para ver, dizia, se o fogo pegava com tal facilidade como se afirma comumente. Dez vezes consecutivas a experiência falhou; mas, na décima primeira, foi por demais bem-sucedida.
           Outro irá acender um charuto ao lado de um barril de pólvora, para ver, para saber, para tentar o destino, para se forçar a si mesmo a dar provas de energia, para se fazer de jogador, para conhecer os prazeres da ansiedade, por nada, por capricho, por desocupação.
          É uma espécie de energia que jorra do tédio e do devaneio; e aqueles nos quais ela se manifesta tão inopinadamente são, geralmente, como eu disse, os mais indolentes e sonhadores dos seres.
        Fui vítima, mais de uma vez, dessas crises e desses impulsos, que nos autorizam a crer que demônios maliciosos se insinuam dentro de nós e nos fazem cumprir, à revelia, suas mais absurdas vontades.
        Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!
         (Queiram observar, por favor, que o espírito de mistificação, que em certas pessoas não é resultado de um trabalho ou de uma combinação, mas de uma inspiração fortuita, tem parte, muito, mesmo que apenas pelo ardor do desejo, neste humor, histérico segundo os médicos, satânico segundo aqueles que pensam um pouco melhor do que os médicos, que nos empurra sem resistência para uma série de ações perigosas ou inconvenientes).
          A primeira pessoa que avistei na rua foi um vidraceiro cujo grito penetrante, dissonante, me veio através da pesada e suja atmosfera parisiense. Me seria, aliás, impossível dizer por que fui tomado, em relação a esse pobre homem, de um ódio tão repentino quanto despótico.
        “Ei, ei” e eu lhe gritei que subisse. Entretanto eu refletia, não sem certa alegria, que o quarto encontrando-se no sexto andar e sendo a escada bastante estreita, o homem deveria estar experimentando certa dificuldade em efetuar sua ascensão, e esbarrando em diversos lugares os ângulos de sua frágil mercadoria.
      Ele enfim apareceu: examinei com curiosidade todas as suas vidraças, e lhe disse: “Mas como? Você não tem vidros coloridos? Vidros cor-de-rosa, vermelhos, azuis, vidros mágicos, vidros de paraíso? Que atrevido é você! Ousa passear pelos bairros pobres e nem mesmo possui vidros que tornem a vida bela de se ver!” E o empurrei com vivacidade para a escada na qual tropeçou resmungando.
       Aproximei-me da sacada e agarrei um vasinho de flores e, quando o homem reapareceu no vão da porta, deixei cair perpendicularmente meu engenho de guerra na borda traseira de suas forquilhas; e derrubado pelo choque, ele acabou de destroçar sob suas costas toda a sua pobre fortuna inconstante, que produziu o ruído estrondoso de um palácio de cristal atingido por um raio.
         E, embriagado por minha loucura, gritei-lhe furiosamente: “A vida bela de se ver! A vida bela de se ver!”.
      Essas brincadeiras nervosas não são isentas de perigo, e pode-se às vezes pagar caro por elas. Mas o que importa a eternidade da danação a quem encontrou num segundo o infinito da fruição?

(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos Poemas em Prosa. Editora Biblioteca Azul. 1ª edição em 2010.)
“Certa manhã, eu me levantara aborrecido, triste, cansado de ociosidade e levado, me parecia, a fazer algo, grande, uma ação de brilho; e abri a janela, infelizmente!” (7º§) É possível deduzir que o comentário do autor destacado anteriormente reflete uma:
Alternativas
Respostas
1: D
2: C
3: B
4: A
5: D
6: D
7: C
8: B
9: C
10: C