Leia o texto para responder à questão
Religião vem de ‘reler’ ou ‘religar’?
Neste caso, em vez de Deus e o diabo, digladiam-se
dois verbos latinos. Ninguém discute que religião
(palavra existente em português desde o século 13)
seja um termo derivado do latim religio, religionis –
“culto, prática religiosa, cerimônia, lei divina,
santidade”. A questão é: de qual verbo esse substantivo é a forma nominal, relegere ou
religare?
A visão mais tradicional e respeitável, pela qual me
inclino, aposta na primeira opção. Relegere, isto é,
“reler, revisitar, retomar o que estava largado”, pode
ser visto neste contexto como o ato de reler e
interpretar incessantemente os textos de doutrina
religiosa ou, quem sabe, como a retomada de uma
dimensão (espiritual) da qual a vida terrena tende a
afastar os homens. Essa tese era defendida na
antiguidade por Cícero e foi compartilhada no século
19 pelo latinista português Francisco Rodrigues dos
Santos Saraiva, autor do influente dicionário que
leva seu nome.
No entanto, já na antiguidade tardia – e entre muitos
autores modernos, como o contestado etimologista
brasileiro Silveira Bueno – ganhou popularidade a
tese, provavelmente romântica, que liga o vocábulo
religião ao verbo religare, “religar, atar, apertar, ligar
bem”. A ideia de que caberia à religião atar os laços
que unem a humanidade à esfera divina tem lá sua
força poética, o que talvez explique o sucesso desta
versão. Diga-se que em autores clássicos, porém, o
verbo religare é estritamente prosaico, empregado
com o sentido de prender os cabelos ou enfeixar a
lenha.
Adaptado de: RODRIGUES, Sérgio: VEJA, 2020.
Disponível em: https://veja.abril.com.br/blog/sobre
palavras/religiao-vem-de-reler-ou-religar/. Acesso em
03 ago. 2021.