Repórter Policial
O repórter policial, tal como o locutor esportivo, é um camarada que fala uma língua especial,
imposta pela contingência: quanto mais cororoca, melhor. Assim como o locutor esportivo jamais chamou
nada pelo nome comum, assim também o repórter policial é um entortado literário. Nessa classe, os que
se prezam nunca chamariam um hospital de hospital. De jeito nenhum. É nosocômio. Nunca, em tempo
algum, qualquer vítima de atropelamento, tentativa de morte, conflito, briga ou simples indisposição
intestinal foi parar num hospital. Só vai para o nosocômio.
E assim sucessivamente. Qualquer cidadão que vai à Polícia prestar declarações que possam ajudála numa diligência (apelido que eles puseram no ato de investigar), é logo apelidada de testemunha-chave.
Suspeito é Mister X, advogado é causídico, soldado é militar, marinheiro é naval, copeira é doméstica e,
conforme esteja deitada, a vítima de um crime – de costas ou de barriga pra baixo – fica numa destas duas
incômodas posições: decúbito dorsal ou decúbito ventral.
Num crime descrito pela imprensa sangrenta, a vítima nunca se vestiu. A vítima trajava. Todo
mundo se veste… mas, basta virar vítima de crime, que a rapaziada sadia ignora o verbo comum e mete
lá: “A vítima traja terno azul e gravata do mesmo tom”. Eis, portanto, que é preciso estar acostumado ao
“métier” para morar no noticiário policial. Como os locutores esportivos, a Delegacia do Imposto de
Renda, os guardas de trânsito, as mulheres dos outros, os repórteres policiais nasceram para complicar a
vida da gente. Se um porco morde a perna de um caixeiro de uma dessas casas da banha, por exemplo, é
batata… a manchete no dia seguinte tá lá: “Suíno atacou comerciário”.
(Stanislaw Ponte Preta)