Mentem como respiram
Conheço inúmeras pessoas que mentem. Para falar a verdade,
mente-se por qualquer motivo: as pessoas ficam com
vergonha quando estão doentes e dizem que estão ótimas;
comentam que a amiga está bem vestida, quando acham um
horror; elogiam alguém que emagreceu, para comentar nas
costas que continua gordíssima. Eu mesmo minto: digo que
vou viajar ou reclamo que não me sinto bem e fujo de um
compromisso; finjo para mim mesmo que, no próximo mês,
começo um regime e perderei a barriga.
Ultimamente, tento parar com isso. Se me convidam,
digo que não posso. Se vou a uma peça de teatro e não gosto,
digo que não gostei. Sempre dá errado, a pessoa preferia
uma mentira. A franqueza, descobri, é muito malvista. Até
considerada falta de educação.
Quantas mães e avós são assassinadas por empregados
que querem faltar ao trabalho? Outros dizem que estão
doentes. E por aí vai. A psicologia forjou um termo para designar
aquele que faz da mentira um hábito: síndrome de
Münchausen. Os mentirosos inventaram outro: “mentira branca",
aquela que não prejudica ninguém. Para mim, não existe
a tal “mentira branca". Tem gente que mente como respira.
Mentira é mentira, e a tal “mentira branca" é só uma mentira
a mais.
(Walcyr Carrasco. http://epoca.globo.com. Adaptado)