Leia o texto para responder à questão.
Desista, menino!
Numa manhã de 1954, aos 19 anos e cheio de esperança, peguei um bonde na Penha e fui parar na redação da
Folha da Manhã. Fui ao chefe de arte, expliquei que estava
em busca de uma oportunidade e apresentei uma pasta com
meus trabalhos. Com ar displicente, ele passou os olhos em
apenas dois ou três desenhos. A única coisa que disse, com
ar meio professoral, meio zombeteiro, foi isto:
– Desista, menino. Desenho não dá dinheiro nem futuro
para ninguém. Vá fazer outra coisa da vida.
Desde muito cedo, eu sonhava em ser desenhista de histórias em quadrinhos, mas tudo jogava contra. O Brasil não
tinha tradição nessa área, as tiras de sucesso eram basicamente estrangeiras. Além disso, padres e educadores acreditavam que gibis eram uma ameaça para os jovens. Achavam
que as crianças, por lerem histórias de crime e suspense, se
tornariam psicopatas e assassinas. Se dependesse dos críticos, os gibis seriam riscados do mapa.
Mas eu nem desconfiava desse cenário. Só queria desenhar. Então como aquele cara podia decretar o fim do meu
sonho dizendo que era impossível viver de desenho?!
A história do mundo está cheia de “nãos” que podiam fazer sentido para quem os disse, mas que depois se revelaram estupendas bolas fora. A gravadora Decca recusou os
Beatles por julgar que eles nunca teriam futuro na música.
Criadora do bruxo Harry Potter, J. K. Rowling levou mais de
10 nãos antes de encontrar a editora que publicaria seu primeiro livro. Walt Disney foi demitido de um jornal sob a alegação de ter pouca imaginação e nenhuma ideia original.
Em 1954, meus sonhos eram feitos basicamente de esperança. Aquele “Desista, menino”, que ouvi há mais de 60
anos, se tornou uma espécie de pedra fundamental que usei
como base para construir o futuro. Em vez de derrubar o sonho, aquilo o reforçou. Por índole ou formação, a palavra
“impossível” não constava do meu dicionário.
(Mauricio de Sousa. Mauricio – a história que não está no gibi –
em depoimento a Luis Colombini. Rio de Janeiro:
Primeira Pessoa, 2017. Adaptado)