Leia o texto para responder à questão.
Tenho uma coisa por bibliotecas. Livrarias são lindas, e
cada vez mais raras. Mas bibliotecas têm algo a mais em sua
beleza – essa ideia de comunidade, de compartilhamento, de
armazenamento, de conhecimento e histórias comuns, guardadas como se guarda algo precioso, para servir de alimento
e inspiração para quem quiser e quem precisar.
Criança, na escola, eu me refugiava na biblioteca. Tinha
tanta coisa contra mim – a asma, o aparelho nos dentes, a
família classe média em um colégio de elite, minha absoluta
falta de jeito para esportes que não fossem na água, meus
fracos pendores para o papel de boa moça, que era essencial
naquele contexto, e a mistura de CDF com rebeldia. Nenhum
refúgio me parecia possível até o dia em que descobri a biblioteca. Ficava no segundo andar, e era silenciosa, quieta,
sempre na penumbra. Lá fora o sol do Rio, mas ali, na minha
caverna, havia apenas esse tesouro de respostas para tantas
perguntas que eu nunca havia feito. Ali eu descobri Brecht,
Darwin, Madame Curie, Platão, a Odisseia, as artes e as ciências e um novo mundo sem limites.
A paixão ficou pra vida toda. Quando vim morar aqui não
sabia exatamente o quanto Los Angeles amava as bibliotecas, e o quanto elas eram parte integral da cidade. Descobri
primeiro a maravilhosa Biblioteca Central, no coração do que
um dia foi o Pueblo, onde a cidade foi fundada. Depois vieram
outras: a biblioteca da University of Southern California, a biblioteca da UCLA, onde eu pesquisava minhas matérias na
era pré-internet, e às vezes só saía de lá quando o faxineiro
já estava me olhando atravessado. E meu novo refúgio favorito: a Biblioteca Margaret Herrick da Academia de Artes e
Ciências Cinematográficas, repositório da história do cinema
desde que ele desembarcou por estas plagas.
Tenho inscrição em todas essas bibliotecas. Mas gosto
mesmo é de visitar minha biblioteca do bairro, ver os novos
títulos, pegar um ou dois ou três volumes, checar a lista de
atividades do mês, me deixar ficar por alguns momentos com
meus amigos desconhecidos, meus vizinhos, as pessoas da
minha rua, quem sabe, que compartilham comigo esse banquete de ideias, sempre ali, sempre possível, sempre propondo novas perguntas.
(Ana Maria Bahiana. https://www.blogdacompanhia.com.br/conteudos/visualizar/Meu-amor-de-biblioteca. 20.09.2022. Adaptado)