O ano de 1833 aproximava-se do fim. A população de
Santa Fé estava alvoroçada, pois confirmara-se a notícia de
que em 1834 o povoado seria elevado a vila. No entanto o
assunto preferido de todas as rodas era a política. Gente bem
informada, vinda de Porto Alegre e do Rio Pardo, contava
histórias sombrias. Depois da abdicação de d. Pedro I, as
coisas na Corte andavam confusas. Seu filho, o Príncipe d.
Pedro, não podia ser coroado porque era muito criança. Ali
mesmo em Santa Fé, bem como acontecia nas carreiras, as
pessoas tomavam partido. Uns eram pela maioridade; outros
achavam que o melhor mesmo era que uma junta de homens
direitos e sábios ficasse no governo. […]
Muitas vezes o pe. Lara ia conversar com o cel. Ricardo
no casario de pedra e vinha de lá com “notícias frescas”, que
transmitia a alguns amigos na venda do Nicolau ou na do cap.
Rodrigo. O cel. Amaral inclinava-se ora para o lado do Partido
Restaurador, que desejava a volta de d. Pedro I ao trono, ora
para o Partido Liberal de Bento Gonçalves, que se opunha
àquele. Os restauradores tinham fundado a Sociedade Militar
e Bento Gonçalves trouxera do Rio de Janeiro a promessa
do governo central de impedir o funcionamento desse clube,
que os liberais classificavam de retrógrado. Tudo parecia resolvido quando o comandante militar da Província, Sebastião
Barreto, de novo tentou reerguer a Sociedade. Bento Amaral – que agora era representante em Santa Fé do juiz de
paz de São Borja – chegara, havia pouco, de Porto Alegre e
contava que a Câmara Municipal dera seu apoio aos liberais
e que por sua vez o presidente da Província censurara esse
pronunciamento da Câmara. Nas ruas da cidade, liberais e
restauradores discutiam, diziam-se nomes, engalfinhavam-se a tapas e socos.
(Erico Verissimo. Um certo capitão Rodrigo. Companhia das Letras, 2005)