Vizinha
Vizinha,
me dá um pouco da tua sopa
me deixa partilhar o azeite
e as batatas da tua ceia
estou tão triste.
A esta hora da noite
vocês são ao redor da mesa
uma família
e o vapor da sopa embaça os óculos do homem
e as crianças riem.
Sei muito bem das tuas dificuldades
que o dinheiro é pouco e a paixão já se acabou
porém, vizinha,
tua sopa cheira bem, teus filhos estão crescendo,
tens um canário e rosas
e não sabes de nada;
abre a porta, vizinha, e me admite no seio
dessa coisa que um dia eu supus acabada
que eu detesto e desejo
e não compreendo.
Por favor, por favor,
deixa-me entrar, vizinha.
Estou tão triste.
(Renata Pallottini. Cerejas, meu amor... São Paulo:
Ed. Massao Ohno, 1982. Adaptado).