Questões de Concurso Comentadas sobre português

Foram encontradas 37.505 questões

Resolva questões gratuitamente!

Junte-se a mais de 4 milhões de concurseiros!

Q2314775 Português
A outra noite


        Outro dia fui a São Paulo e resolvi voltar à noite, uma noite de vento sul e chuva, tanto lá como aqui. Quando vinha para casa de táxi, encontrei um amigo e o trouxe até Copacabana; e contei a ele que lá em cima, além das nuvens, estava um luar lindo, de Lua cheia; e que as nuvens feias que cobriam a cidade eram, vistas de cima, enluaradas, colchões de sonho, alvas, uma paisagem irreal.
        Depois que o meu amigo desceu do carro, o chofer aproveitou um sinal fechado para voltar-se para mim:
          – O senhor vai desculpar, eu estava aqui a ouvir sua conversa. Mas, tem mesmo luar lá em cima?
          Confirmei: sim, acima da nossa noite preta e enlamaçada e torpe havia uma outra – pura, perfeita e linda.
           – Mas, que coisa...
        Ele chegou a pôr a cabeça fora do carro para olhar o céu fechado de chuva. Depois continuou guiando mais lentamente. Não sei se sonhava em ser aviador ou pensava em outra coisa.
           – Ora, sim senhor...
           E, quando saltei e paguei a corrida, ele me disse um “boa noite” e um “muito obrigado ao senhor” tão sinceros, tão veementes, como se eu lhe tivesse feito um presente de rei.


(BRAGA, Rubem. In: Para gostar de ler – Volume II. São Paulo: Ática, 1992.)
Considerando o significado contextual e as regras de pontuação, analise as afirmativas a seguir.

I. O travessão usado antes de “pura, perfeita e linda.” (4º§) pode ser substituído por dois-pontos.

II. No segmento, “Depois que o meu amigo desceu do carro, [...]” (2º§), a expressão “o meu amigo” poderia estar entre vírgulas de acordo com a norma padrão da língua.

III. No trecho: “[...] como se eu lhe tivesse feito um presente de rei.” (8º§), caso fosse acrescentado “ou seja algo maravilhoso”, a expressão “ou seja” deveria estar entre vírgulas.

Está correto o que se afirma apenas em 
Alternativas
Q2314744 Português
Os substantivos sobrecomuns são substantivos que nomeiam pessoas e apresentam um só gênero para o masculino e o feminino. Por exemplo: cafeteira, cachorro e confinar.
Alternativas
Q2314590 Português
A outra noite


       Outro dia fui a São Paulo e resolvi voltar à noite, uma noite de vento sul e chuva, tanto lá como aqui. Quando vinha para casa de táxi, encontrei um amigo e o trouxe até Copacabana; e contei a ele que lá em cima, além das nuvens, estava um luar lindo, de Lua cheia; e que as nuvens feias que cobriam a cidade eram, vistas de cima, enluaradas, colchões de sonho, alvas, uma paisagem irreal.
          Depois que o meu amigo desceu do carro, o chofer aproveitou um sinal fechado para voltar-se para mim:
            – O senhor vai desculpar, eu estava aqui a ouvir sua conversa. Mas, tem mesmo luar lá em cima?
           Confirmei: sim, acima da nossa noite preta e enlamaçada e torpe havia uma outra – pura, perfeita e linda.
            – Mas, que coisa...
        Ele chegou a pôr a cabeça fora do carro para olhar o céu fechado de chuva. Depois continuou guiando mais lentamente. Não sei se sonhava em ser aviador ou pensava em outra coisa.
          – Ora, sim senhor...
     E, quando saltei e paguei a corrida, ele me disse um “boa noite” e um “muito obrigado ao senhor” tão sinceros, tão veementes, como se eu lhe tivesse feito um presente de rei.


(BRAGA, Rubem. In: Para gostar de ler – Volume II. São Paulo: Ática, 1992.)
Considerando o significado contextual e as regras de pontuação, analise as afirmativas a seguir.

I. O travessão usado antes de “pura, perfeita e linda.” (4º§) pode ser substituído por dois-pontos.
II. No segmento, “Depois que o meu amigo desceu do carro, [...]” (2º§), a expressão “o meu amigo” poderia estar entre vírgulas de acordo com a norma padrão da língua.
III. No trecho: “[...] como se eu lhe tivesse feito um presente de rei.” (8º§), caso fosse acrescentado “ou seja algo maravilhoso”, a expressão “ou seja” deveria estar entre vírgulas.

Está correto o que se afirma apenas em
Alternativas
Q2314581 Português
Os seguintes substantivos devem ser escritos com a primeira letra maiúscula, pois são nomes próprios: Kleiton, Bruna, Silva, Angélica e Luciano. 
Alternativas
Q2314580 Português
O "H" é utilizado no final de algumas interjeições, como em: Ah!, Oh! e Uh!. 
Alternativas
Q2314578 Português
Os substantivos concretos designam as palavras reais, concretas, sejam elas pessoas, objetos, animais ou lugares. Por exemplo: menino, mulher, gato, peixe, mesa e bola
Alternativas
Q2314569 Português
São exemplos de substantivos próprios, os seguintes: Maria, José, Antônio, Pedro, Wanessa e Rogério.
Alternativas
Q2314567 Português
São vocábulos utilizados para designar um conjunto: enxame, matilha, ninhada, bando, equipe e grupo.
Alternativas
Q2314565 Português
Os substantivos compostos são formados por mais de um radical, como se pode observar em: guarda-chuva e passatempo.
Alternativas
Q2314562 Português
Certas siglas e símbolos são escritos com a letra "K", como se pode observar em: kg (quilograma), km (quilômetro), K (potássio).
Alternativas
Q2314561 Português
O vocábulo “beija-flor” é um exemplo de substantivo, sendo, ao mesmo tempo, comum e composto.
Alternativas
Q2314464 Português
As frases são marcadas por entonação que, na escrita, ocorrem com o recurso dos sinais de pontuação. 
Alternativas
Q2314328 Português
Na oração “Ele preparou uma decoração apenas razoável”, o vocábulo “apenas” pode ser corretamente classificado como artigo indefinido.
Alternativas
Q2314319 Português
De acordo com a norma culta, no processo de derivação prefixal, na Língua Portuguesa, a palavra primitiva recebe um sufixo precedido de uma vogal atômica, à qual deve-se acrescentar um acento grave.
Alternativas
Q2314317 Português
Os advérbios de tempo compreendem termos como: agora, imediatamente, aparentemente e demorar. 
Alternativas
Q2314213 Português
A classe gramatical dos advérbios de modo é rica em exemplos de palavras derivadas como, por exemplo: corretamente, inesperadamente, parado e quente.
Alternativas
Q2313711 Português
A compensação


         Não faz muito, li um artigo sobre as pretensões literárias de Napoleão Bonaparte. Aparentemente, Napoleão era um escritor frustrado. Tinha escrito contos e poemas na juventude, escreveu muito sobre política e estratégia militar e sonhava em escrever um grande romance. Acreditava-se, mesmo, que Napoleão considerava a literatura sua verdadeira vocação, e que foi sua incapacidade de escrever um grande romance e conquistar uma reputação literária que o levou a escolher uma alternativa menor, conquistar o mundo.
         Não sei se é verdade, mas fiquei pensando no que isto significa para os escritores de hoje e daqui. Em primeiro lugar, claro, leva a pensar na enorme importância que tinha a literatura nos séculos 18 e 19, e não apenas na França, onde, anos depois de Napoleão Bonaparte, um Vitor Hugo empolgaria multidões e faria História não com batalhões e canhões mas com a força da palavra escrita, e não só em conclamações e panfletos mas, muitas vezes, na forma de ficção. Não sei se devemos invejar uma época em que reputações literárias e reputações guerreiras se equivaliam desta maneira, e em que até a imaginação tinha tanto poder. Mas acho que podemos invejar, pelo menos um pouco, o que a literatura tinha então e parece ter perdido: relevância. Se Napoleão pensava que podia ser tão relevante escrevendo romances quanto comandando exércitos, e se um Vitor Hugo podia morrer como um dos homens mais relevantes do seu tempo sem nunca ter trocado a palavra e a imaginação por armas, então uma pergunta que nenhum escritor daquele tempo se fazia é essa que nos fazemos o tempo todo: para o que serve a literatura, de que adianta a palavra impressa, onde está a nossa relevância? Gostávamos de pensar que era através dos seus escritores e intelectuais que o mundo se pensava e se entendia, e a experiência humana era racionalizada. O estado irracional do mundo neste começo de século é a medida do fracasso desta missão, ou desta ilusão.
      Depois que a literatura deixou de ser uma opção tão vigorosa e vital para um homem de ação quanto a conquista militar ou política – ou seja, depois que virou uma opção para generais e políticos aposentados, mais compensação pela perda de poder do que poder, e uma ocupação para, enfim, meros escritores –, ela nunca mais recuperou a sua respeitabilidade, na medida em que qualquer poder, por armas ou por palavras, é respeitável. Hoje a literatura só participa da política, do poder e da História como instrumentoou cúmplice.
        E não pode nem escolher que tipo de cúmplice quer ser. Todos os que escrevem no Brasil, principalmente os que têm um espaço na imprensa para fazer sua pequena literatura ou simplesmente dar seus palpites, têm esta preocupação.
      Ou deveriam ter. Nunca sabemos exatamente do que estamos sendo cúmplices.
     Podemos estar servindo de instrumentos de alguma agenda de poder sem querer, podemos estar contribuindo, com nossa indignação ou nossa denúncia, ou apenas nossas opiniões, para legitimar alguma estratégia que desconhecemos.
       Ou podemos simplesmente estar colaborando com a grande desconversa nacional, a que distrai a atenção enquanto a verdadeira história do país acontece em outra parte, longe dos nossos olhos e indiferente à nossa crítica. Não somos relevantes, ou só somos relevantes quando somos cúmplices, conscientes ou inconscientes.
      Mas comecei falando da frustração literária de Napoleão Bonaparte e não toquei nas implicações mais importantes do fato, pelo menos para o nosso amor próprio. Se Napoleão só foi Napoleão porque não conseguiu ser escritor, então temos esta justificativa pronta para o nosso estranho ofício: cada escritor a mais no mundo corresponde a um Napoleão a menos. A literatura serve, ao menos, para isso: poupar o mundo de mais Napoleões. Mas existe a contrapartida: muitos Napoleões soltos pelo mundo, hoje, fariam melhor se tivessem escrito os romances que queriam. O mundo, e certamente o Brasil, seriam outros se alguns Napoleões tivessem ficado com a literatura e esquecido o poder.
     E sempre teremos a oportunidade de, ao acompanhar a carreira de Napoleões, subNapoleões, pseudo-Napoleões ou outras variedades com poder sobre a nossa vida e o nosso bolso, nos consolarmos com o seguinte pensamento: eles são lamentáveis, certo, mas imagine o que seria a sua literatura.
      Da série Poesia numa Hora Destas?!
    Deus não fez o homem, assim, de improviso em cima da divina coxa numa hora vaga.
      Planejou o que faria com esmero e juízo (e isso sem contar com assessoria paga).         Tudo foi pensado com exatidão antes mesmo do primeiro esboço, e foram anos de experimentação até Deus dizer que estava pronto o moço.
      Mas acontece sempre, é sempre assim não seria diferente do que é agora.
      A melhor ideia apareceu no fim e dizem que o polegar Ele bolou na hora.


(VERÍSSIMO, Luís Fernando. A Compensação. Em: 18/09/2023.)
Observe os trechos a seguir e assinale a afirmativa em que a análise sintática do período composto está correta.
Alternativas
Q2313094 Português
Mediação, o melhor caminho para educar


         Há quem diga que educar hoje seja mais difícil do que fora nas gerações anteriores. No entanto, sabe-se que educar sempre foi uma tarefa complexa e exaustiva, que exige do educador perseverança e porosidade. Sobretudo, porque não é razoável simplesmente transferir a educação recebida para os filhos e os alunos, como também não é sábio descartar a tradição, como se ela não estivesse presente nos valores de quem educa.
       No entanto, não é difícil concluir que os ensinamentos que precisamos manter, como legado civilizatório para o bom convívio social, são aqueles fundamentais relacionados aos princípios básicos e aos valores humanos inegociáveis. O mundo mudou e os jovens e as crianças não são mais os mesmos de “antigamente”. Independentemente das mudanças observadas no mundo, do estilo de vida e da quantidade de informações oferecidas, ainda é basilar e necessário ensiná-los a ser honestos, éticos, justos. A respeitar o outro e a sonhar com a vida que se deseja ter, para se sentir agente da própria existência.
        Evidentemente que nessa mediação educacional não se pode perder de vista que educar é frustrar e também provocar desejos. E o caminho entre os dois não é nada fácil. Há momentos em que ele se bifurca, uma vez que o pressuposto saudável na educação é apresentar ao jovem a vida como ela é. E isso exige afastar a tentação de proteger a cria em demasia ou se acautelar para liberá-la para os sustos da vida ou evitar que se enfie goela abaixo o modelo de vida do educador. Por incrível que pareça, o conflito é bem-vindo no processo educativo, porque ele impõe o diálogo (adequado a cada faixa etária), a análise de pontos de vista divergentes e a tentativa de algum ponto de conciliação.
              A formação do caráter de um jovem bem mediada não passa, em hipótese alguma, na tentativa pretensiosa e onipotente de tentar evitar a frustração. Isso é impossível. Nem de frustrar de forma repressora como tentativa de privar o jovem do desejo para que ele sofra a duras penas para aprender a viver. A mediação educativa consistente é aquela que educa com sabedoria o desejo daquele que precisa enfrentar a vida e o mundo. E educar o desejo não é dizer o que desejar, mas ajudar a criança e o jovem a reconhecer seus desejos. O mais difícil talvez seja transmitir às crianças a coragem de desejar com sabedoria. E sonhar com sabedoria é também ensinar que viver alucinadamente em torno apenas do desejo não é liberdade, é escravidão. E não viver alguns desejos nem sempre é precaução, pode ser covardia diante da vida.
         Mediar a educação é talvez autorizar o educando (ou ensinar) a dizer sim e não para os momentos mais custosos e decisivos da vida em que não se pode vacilar. E também reforçar que não há na vida um desejo único, superior ou dominante. Mesmo quando a vida parece plena e alegre nunca estaremos protegidos do surgimento de desejos novos. Ajudar a reconhecer os desejos para abraçá-los ou para recusá-los, se não explica o sentido de ser e de estar no mundo, ajuda a afastar a sombra do sem-sentido.

(João Jonas Veiga Sobral. Em: setembro de 2023. Fragmento.)
No fragmento “Nem de frustrar de forma repressora como tentativa de privar o jovem do desejo para que ele sofra a duras penas para aprender a viver.” (4º§), a expressão “para que” exprime a ideia de:
Alternativas
Q2313089 Português
Mediação, o melhor caminho para educar


         Há quem diga que educar hoje seja mais difícil do que fora nas gerações anteriores. No entanto, sabe-se que educar sempre foi uma tarefa complexa e exaustiva, que exige do educador perseverança e porosidade. Sobretudo, porque não é razoável simplesmente transferir a educação recebida para os filhos e os alunos, como também não é sábio descartar a tradição, como se ela não estivesse presente nos valores de quem educa.
       No entanto, não é difícil concluir que os ensinamentos que precisamos manter, como legado civilizatório para o bom convívio social, são aqueles fundamentais relacionados aos princípios básicos e aos valores humanos inegociáveis. O mundo mudou e os jovens e as crianças não são mais os mesmos de “antigamente”. Independentemente das mudanças observadas no mundo, do estilo de vida e da quantidade de informações oferecidas, ainda é basilar e necessário ensiná-los a ser honestos, éticos, justos. A respeitar o outro e a sonhar com a vida que se deseja ter, para se sentir agente da própria existência.
        Evidentemente que nessa mediação educacional não se pode perder de vista que educar é frustrar e também provocar desejos. E o caminho entre os dois não é nada fácil. Há momentos em que ele se bifurca, uma vez que o pressuposto saudável na educação é apresentar ao jovem a vida como ela é. E isso exige afastar a tentação de proteger a cria em demasia ou se acautelar para liberá-la para os sustos da vida ou evitar que se enfie goela abaixo o modelo de vida do educador. Por incrível que pareça, o conflito é bem-vindo no processo educativo, porque ele impõe o diálogo (adequado a cada faixa etária), a análise de pontos de vista divergentes e a tentativa de algum ponto de conciliação.
              A formação do caráter de um jovem bem mediada não passa, em hipótese alguma, na tentativa pretensiosa e onipotente de tentar evitar a frustração. Isso é impossível. Nem de frustrar de forma repressora como tentativa de privar o jovem do desejo para que ele sofra a duras penas para aprender a viver. A mediação educativa consistente é aquela que educa com sabedoria o desejo daquele que precisa enfrentar a vida e o mundo. E educar o desejo não é dizer o que desejar, mas ajudar a criança e o jovem a reconhecer seus desejos. O mais difícil talvez seja transmitir às crianças a coragem de desejar com sabedoria. E sonhar com sabedoria é também ensinar que viver alucinadamente em torno apenas do desejo não é liberdade, é escravidão. E não viver alguns desejos nem sempre é precaução, pode ser covardia diante da vida.
         Mediar a educação é talvez autorizar o educando (ou ensinar) a dizer sim e não para os momentos mais custosos e decisivos da vida em que não se pode vacilar. E também reforçar que não há na vida um desejo único, superior ou dominante. Mesmo quando a vida parece plena e alegre nunca estaremos protegidos do surgimento de desejos novos. Ajudar a reconhecer os desejos para abraçá-los ou para recusá-los, se não explica o sentido de ser e de estar no mundo, ajuda a afastar a sombra do sem-sentido.

(João Jonas Veiga Sobral. Em: setembro de 2023. Fragmento.)
No trecho “[...] porque ele impõe o diálogo (adequado a cada faixa etária), a análise de pontos de vista divergentes e a tentativa de algum ponto de conciliação.” (3º§), os parênteses foram usados para
Alternativas
Q2312731 Português
Restos de Carnaval


          Não, não deste último Carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao Carnaval. Até que viesse o outro ano.
          E quando a festa ia se aproximando, como explicar a agitação íntima que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.
          No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem.
          E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.
          Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para Carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça – eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável – e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.
           Mas houve um Carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com as quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.
           Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga – talvez atendendo a meu apelo mudo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel – resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele Carnaval, pois, pela primeira vez na vida, eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.
           Mas por que exatamente aquele Carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.
          Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge – minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa – mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil – fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de Carnaval. A alegria dos outros me espantava.
             Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.
           Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos, já lisos, de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.

(LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro. Rocco. 1999. Jornal do Brasil. Em: 16/03/1968.)
Em todos os fragmentos a seguir transcritos do texto as formas verbais evidenciadas estão flexionadas no mesmo tempo, EXCETO em:
Alternativas
Respostas
5801: C
5802: E
5803: C
5804: C
5805: C
5806: C
5807: C
5808: C
5809: C
5810: C
5811: C
5812: C
5813: E
5814: E
5815: E
5816: E
5817: B
5818: B
5819: D
5820: A