Questões de Concurso
Sobre português para pedagogo
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A escola pode interferir na formação moral dos alunos?
Por: Telma Vinha (professora da Unicamp) em colaboração com Maria Suzana Menin (professora da Unesp) e Mariana Tavares (pesquisadora da FCC)
O desenvolvimento de valores morais é decorrente da interação do sujeito com as situações e as pessoas nos diversos ambientes que frequenta, como a escola, com a família e com os amigos. Considerando todas essas influências, questionamos: “Será que a instituição de ensino tem um papel significativo na formação ética dos alunos? Que atitudes de professores, funcionários e colegas podem interferir nesse processo?”
Um estudo inédito da Fundação Carlos Chagas (FCC), coordenado por Mariana Tavares, da FCC, e Suzana Menin, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), com a participação de pesquisadores de várias instituições, ajuda a responder essas questões. Realizado com quase 10 mil crianças, adolescentes e professores de 76 escolas públicas e privadas do Brasil, ele objetivou construir um instrumento para avaliar a presença e os níveis de desenvolvimento (adesão) dos valores convivência democrática, solidariedade, justiça e respeito.
Os resultados dos alunos foram relacionados com mais de 30 variáveis, como sexo, religião, composição familiar, nível socioeconômico, regras e sanções na família, autoestima, repetência, observação de maus-tratos, como eles acreditavam ser vistos pelos outros e as relações estabelecidas. Algumas conclusões evidenciam a importância de cuidar do convívio na escola para favorecer o desenvolvimento moral.
Sentir-se bem tratado pelos professores e ter docentes e funcionários que jamais ou raramente gritam com os alunos promoveu maior adesão de todos os valores. Não presenciar (ou ver pouco) educadores colocarem estudantes para fora da sala influenciou o aumento da justiça, respeito e solidariedade. Já ter professores que recorrem pouco (ou nunca) aos pais dos alunos para resolver conflitos indicou maior presença de convivência democrática e solidariedade.
Entre os fatores ligados à relação do aluno com a instituição e com os colegas, gostar de ir à escola e frequentar as aulas interferiu no aumento dos valores solidariedade, respeito e convivência democrática. Alunos que nunca (ou raramente) viram colegas se agredirem ou gritar tiveram todos os valores influenciados positivamente. Acreditar ser bem-visto pelas outras pessoas no ambiente escolar gerou o aumento da justiça.
No caso da família, o apoio dos pais teve relação com maior respeito e justiça. Este último fator também foi influenciado pelo emprego de combinados com os filhos. Quando os pais usam sanções (que não sejam físicas ou humilhantes), há mais adesão a justiça, solidariedade e convivência democrática. Isso pode estar associado à ideia de uma família cuidadosa, que deixa claro o que pode ou não ser feito pelos filhos, revalidando os valores quando eles são feridos.
As ações contrárias às apresentadas acima, a exemplo de gritar muitas vezes ou não apoiar os filhos, estão sempre relacionadas a menor adesão aos valores. Chama a atenção também o fato de que, na pesquisa, religião, configuração familiar, nível socioeconômico e repetência não tiveram relação significativa com a presença de valores.
O estudo colabora para comprovar que a qualidade das interações na escola, em especial dos adultos com os alunos, influencia fortemente no desenvolvimento moral (quanto mais positivas forem, maiores as adesões aos valores). Assim, se queremos formar pessoas éticas, fica evidente a importância de ter espaços de diálogo e reflexão sobre a convivência e de cuidar para que toda a comunidade escolar vivencie de fato esses valores.
(Fonte: Revista Nova Escola. Ano 30, número 282 de maio de 2015. Editora Abril)
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
Considere as seguintes afirmações sobre aspectos da construção linguísticas:
I. Atentando para o uso do sinal indicativo de crase, o A no pronome AQUELA, em todas as ocorrências no segmento “Aquela música se estranhava nos moradores, mostrando que aquele bairro não pertencia àquela terra.”, deveria ser acentuado.
II. Nas frases “O REMÉDIO, enfim, se haveria de pensar.”/“desdobrando-se em outras felizes EXISTÊNCIAS”, as palavras destacadas são acentuadas obedecendo à mesma regra de acentuação.
III. Na frase “– ESSES são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.”, o elemento destacado exerce função anafórica, exprimindo relação coesiva referencial.
Está correto apenas o que se afirma em:
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
De acordo com os estudos de regência verbal e com o padrão culto da língua, leia as afirmações sobre os verbos destacados em “Os senhores RECEAVAM as suas próprias suspeições - TERIA aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles CARECIAM de acesso?”
I. Como o verbo é transitivo indireto, é obrigatório o uso do acento indicativo da crase em AS, que compõe o complemento da primeira oração.
II. Na segunda oração, o verbo TERIA constitui por si só o predicado de uma oração.
III. O verbo CARECIAM, como é transitivo indireto, está ligado a seu complemento por meio de uma preposição.
Está(ão) correta(s) apenas a(s) afirmativa(s):
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
Texto para responder a questão.
O embondeiro que sonhava pássaros
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida. Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro.
Todas manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão. Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as janelas:
– Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem puxava de uma muska e harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.
Por trás das cortinas, os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos - aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os pais se agravavam: estava dito.
Mas aquele ordem pouco seria desempenhada.
[...]
O homem então se decidia a sair, juntar as
suas raivas com os demais colonos. No clube, eles
todos se aclamavam: era preciso acabar com as
visitas do passarinheiro. Que a medida não podia ser
de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista
das senhoras e seus filhos. O remédio, enfim, se
haveria de pensar.
No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de si:
– Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora.
Os portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde, se eles tinham já desbravado os mais extensos matos?
O vendedor se segredava, respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada. Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam.
Fosse por desdenho dos grandes ou por glória
dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o
passarinheiro foi virando assunto no bairro do
cimento. Sua presença foi enchendo durações,
insuspeitos vazios. Conforme dele se comprava, as
casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando
que aquele bairro não pertencia àquela terra. Afinal,
os pássaros desautenticavam os residentes,
estrangeirando-lhes? [...] O comerciante devia saber
que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela
desobediência, acusando o tempo. [...]
As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. [...]
Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas fecharam suas pálpebras.
COUTO, Mia. / Cada Homem é uma raça:contos/Mia Couto –
1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p.63 – 71.
(Fragmento).
Sobre o texto leia as afirmativas a seguir.
I. Mia Couto apresenta uma crítica ao estereótipo do negro, segregado pelos valores culturais que valorizam a cultura do colonizador.
II. O passarinheiro não é bem-vindo no espaço porque explora os pássaros, vendendo-os às crianças que se enganam com sua bondade.
III. A primeira vista, tem-se um passarinheiro, um homem que vende pássaros, um exilado no próprio território.
IV. O primeiro drama exposto no conto é o paradoxo da falta de identidade do vendedor de pássaros.
Está correto apenas o que se afirma em:
A primeira estrofe de uma das canções da trilha sonora da novela “Roque Santeiro” diz: “Estou de volta pro meu aconchego / Trazendo na mala bastante saudade / Querendo um sorriso sincero, um abraço, / Para aliviar meu cansaço / e toda essa minha vontade.” (Dominguinhos e Nando Cordel)
Observa-se, neste trecho, a presença da seguinte figura de linguagem:
“Eu conheço você há anos e posso garantir a você que não vou impedir você de contar sua versão dos fatos.
” Num exercício sobre pronomes, o professor propôs aos alunos que reescrevessem a frase acima substituindo os termos sublinhados por pronomes oblíquos átonos coerentes com a frase original.
A resposta dada como correta foi esta: