Leia o texto abaixo e responda a questão.
Os discos voadores – Rachel de Queiroz
Eu por mim acredito. Por que não acreditaria? Nada vejo que justifique a descrença. Acredito em
tudo. Que têm 15 metros de diâmetro, que são feitos de um metal desconhecido, brilhante como prata
polida, que se compõem de três círculos concêntricos dos quais só um __ o do meio __ gira, fazendo o
engenho mover-se; acredito que deixam um rastro luminoso por onde andam __ decerto a poeira
fosforescente dos mundos siderais que percorreram. E acredito, principalmente, que sejam pilotados por
homúnculos de meio metro de estatura, macrocéfalos, horrendos, vindos sabe Deus de que planeta, Marte,
Vênus ou Saturno.
Ah, acredito. Por que não seria verdade? Todo o mundo os tem visto, no Oriente e no Ocidente, no
Pacífico e no Atlântico, nas costas da Califórnia, no Peru e no Amazonas, em Maceió, no Uruguai; e até
mesmo aqui no Rio teve um cavalheiro que os viu durante 45 minutos; viu-os com os seus olhos que a terra
há de comer, se me permitem a expressão, e por sinal chamou a radiopatrulha, no que se mostrou homem
muitíssimo avisado.
Ilusão coletiva uma conversa. Também a bomba voadora dizia-se que era ilusão coletiva. O povo
sabe muito bem onde põe os olhos e os jornais contam muito mais verdades do que supõe o ingênuo
público, viciado a acreditar em desmentidos. Se tanta gente tem visto discos voadores, é porque há discos
voadores. E afinal de contas, neste mundo de aparência, quem é que pode distinguir da realidade a dita
aparência, e até onde se pode afirmar que uma coisa é concreta ou é ilusão dos sentidos? Arco-íris também
é ilusão dos sentidos e neste mesmo instante lá está um, brilhando no céu, entre as nuvens molhadas,
luminoso e autêntico como um corpo vivo. […]
(In: SANTOS, Joaquim Ferreira dos. As cem melhores crônicas brasileiras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007).