Dengue prevista
A dengue é uma doença periódica e cíclica: os casos
crescem no verão e há picos epidêmicos a cada 4 ou 5 anos.
Trata-se, portanto, de enfermidade de atuação previsível.
Supõe-se que o poder público se adiantaria com medidas de
prevenção e tratamento. Contudo, há décadas os números
de casos e mortes só aumentam no Brasil.
Entre 2000 e 2010, foram registrados 4,5 milhões de
ocorrências e 1.869 óbitos. Na década seguinte, os números
saltaram para 9,5 milhões e 5.385, respectivamente. O primeiro semestre deste ano registra 1,4 milhão de casos, ante
1,5 milhão em 2022. A tendência é piorar.
Segundo a OMS, urbanização descontrolada e sistema
sanitário precário contribuem para o descontrole da moléstia.
No Brasil, cerca de 50% da população não tem acesso
a redes de esgoto, em grande parte devido à ineficiência
estatal, que só agora começa a mudar com o novo marco
do setor. E o desmatamento para a construção de moradias
irregulares grassa nos grandes centros. A dimensão de áreas
verdes derrubadas para esse fim na cidade de São Paulo
atingiu, nos primeiros dois meses de 2023, 85 hectares.
Neste ano, o município já conta com 11444 casos de
dengue – 3,7% a mais em relação ao mesmo período de 2022.
Dez pessoas morreram, o maior número em oito anos, quando
houve pico epidêmico.
A OMS ressaltou a importância da vacinação. Mas, devido
à burocracia, o Brasil protela a distribuição do imunizante
japonês Qdenga – já aprovado para venda pela Anvisa – no
sistema público de saúde.
O combate à dengue deve ser contínuo, não apenas no
verão, e em várias frentes complementares (saúde, infraestrutura e moradia). Com o alerta da OMS, espera-se que o
poder público, local e federal, se prepare para receber as
consequências do fenômeno climático El Niño.
(Editorial. Folha de S.Paulo, 27.07.2023. Adaptado)