Leia o texto a seguir para responder à questão.
A VIDA ON-LINE
O home office e a rotina pela internet
são tendências sem volta.
Walcyr Carrasco
Uma das vantagens da vida de autor sempre foi trabalhar
em casa. Acordo a hora que eu quero, escrevo de meias e
pijama, se quiser. É uma vida confortável. Agora, o home
office está com tudo. Era uma tendência, mas com a
quarentena tornou-se comum. É um caminho sem volta.
As empresas gastam menos com um funcionário remoto.
Não precisam investir em escritórios, fornecer cafezinhos…
Em home office, trabalha-se todo o tempo, praticamente.
Uma conhecida estava no esquema fazia tempo em uma
multinacional. Vivia em São Paulo. Certa época, teve uma
chefe em Nova York e um funcionário em Singapura. Os
três conciliavam o tempo e o fuso. É óbvio que num
sistema assim não existe horário para parar. A
produtividade é maior.
Em janeiro deste ano, uma pesquisa do Instituto Ipsos
mostrou que 49% das pessoas gostariam de trabalhar em
casa. Hoje, o número deve ter crescido muito. Quem
trabalha on-line não gasta tempo no trânsito, pode morar
numa cidade menor, sem se apavorar com
congestionamentos. Só como exemplo.
Não se vive absolutamente isolado. A gente vê menos
pessoas, mas se diverte com o comércio on-line, por
exemplo. Nada mais atraente que entrar em um site e
comprar algo que pareça fundamental, como uma
máquina de fazer pão. Bem, pelo menos de repente eu
achei que não poderia mais viver sem uma. Foi uma saga.
As empresas exigem cadastros chatíssimos, que eu
demorava séculos para preencher. Pior. No final, diziam
que eu já tinha cadastro! No passado, devo ter feito
alguns. Não tenho a menor ideia da antiga senha e e-mail
— já troquei muitos. E aí não vendem, sou expulso das
compras como um vigarista. Já me aconteceu no Magazine
Luiza, no Shoptime, no Mercado Livre… Finalmente, um
amigo comprou para mim, em seu cartão. A máquina de
fazer pão está chegando. Já tenho um saco de farinha e a
sensação de que estou livre da devastação. As empresas
têm de se adequar à nova demanda. É fato. Mas a compra
on-line está se solidificando. Grandes grifes já vendem
roupas. Livrarias, nem se fala. No futuro, assim como
agora, não irei tanto a lojas físicas.
Muita gente que conheço está tomando aulas. De dança,
de voz, de inglês… Pessoalmente, vou voltar ao pilates. E,
quem sabe, estudar literatura francesa, que adoro. Tudo
por Skype! E haja lives! Todo mundo quer fazer! Já não
tenho mais agenda nas próximas duas semanas! Também
adoro vê-las! Estou viciado nas lives!
As relações humanas crescem. Velhos amigos e amigas me
procuram. Troco receitas de comida. Porque uma das
consequências da quarentena é que todo mundo vai
engordar! E, se o amigo estiver tossindo, ainda dou bons
conselhos para se cuidar. De longe… Talvez venha a atuar
como coach (sou formado, sim!), de tanto que dou
conselho para ninguém pirar — nem eu mesmo, aliás. Eu
me aconselho o tempo todo!
Há menos contato físico, mas voltaremos a tê-lo? A
plataforma tecnológica já existia. O coronavírus veio
acelerar uma mudança total no comportamento. A vida, de
agora em diante, será definitivamente on-line.
Publicado em VEJA de 15 de abril de 2020.