Questões de Concurso
Para crp 21º região - pi
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Qual dos navegadores abaixo foi desenvolvido pela empresa Apple Inc.?
Qual alternativa apresenta informação CORRETA a respeito do tipo de rede denominado Intranet?
O Twitter é um tipo de serviço reconhecido como microblogging, no qual é permitido ao usuário enviar e ler mensagens (estas denominadas 'tweets'), podendo ser registrados pequenos textos de até:
Analise as informações abaixo a respeito da computação nas nuvens (cloud computing):
I - "Tecnologia na qual os dados ficam armazenados em um servidor fora do local ao qual se está, e não em um hardware local";
II - "Conjunto de recursos virtuais que são facilmente utilizáveis e acessíveis, comumente explorado através de um modelo denominado 'pague-pelo-uso', com garantias oferecidas pelo provedor através de acordos de nível de serviços".
Qual alternativa apresenta informação correta?
Tendo em vista as principais funções do Excel 2010, aquela que auxilia na automatização de determinadas tarefas, otimizando o trabalho do usuário, recebe o nome de:
Lúcio tem cinco filhos: Lalá, Lelé, Lili, Loló e Lulu. Porém, restaram apenas três bombons no pacote para lhes dar. Supondo que um filho possa ganhar mais de um bombom, de quantos modos diferentes ele poderá fazer essa distribuição?
Marta e Laura estavam jogando um dado não viciado. Marta apostou que duvidava que Laura atirasse duas vezes o dado e caísse, nas duas vezes, o número 6 na face de cima. Assim, a probabilidade de Laura ganhar a aposta é igual a:
Carlos, durante o período matinal na pré-escola, recebeu um desenho para pintar, como o ilustrado abaixo. Ele tinha à disposição 3 lápis de cor de cores diferentes (azul, verde e vermelho). Para a atividade, Carlos deverá utilizar apenas dois lápis: um para pintar o interior do sol e outro para pintar o lado externo ao círculo. Assim, de quantas formas diferentes poderá o desenho ser pintado por Carlos?
Se “Algum concurseiro é gaúcho”, então é correto afirmar que, com certeza:
“É falso afirmar que se Marcos tem 30 anos, então Maria não tem 20 anos.”. Essa proposição composta equivale à seguinte afirmação:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A alternativa cujo termo transcrito é um caracterizador do nome é a:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
Ao se reescrever a oração “os operários de fábricas são assombrados pelo espectro de sua substituição por máquinas” (L.3/4), transpondo-a para a voz ativa, tem-se:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
Possuem diferentes regências as formas verbais:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A noção de valor antitético se faz presente no fragmento:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
Sobre o uso das formas linguísticas no texto, é correto afirmar:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A oração “...embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais indignos” (L.57/58), semanticamente, equivale a:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A alternativa em que a oração transcrita tem função restritiva é:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A leitura do texto permite inferir:
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
Quanto aos parágrafos que compõem o texto, é correto afirmar que o
A uberização da vida
1 A tecnologia e o trabalho vivem, nos últimos séculos, uma relação pontuada por uma série
2 de episódios surpreendentes, quase sempre marcados pelo conflito.
3 Desde o início da era industrial, no século XVIII, os operários de fábricas são assombrados
4 pelo espectro de sua substituição por máquinas. Naquela época, havia boatos, na Inglaterra, sobre
5 o lendário general Ned Ludd, que incitava a invasão das tecelagens e a destruição das máquinas
6 para conter o desemprego em massa.
7 Nunca saberemos ao certo se Ned Ludd realmente existiu. Contudo, o termo ludismo
8 passou a ser incorporado pela literatura sociológica e filosófica como designando a revolta contra
9 a tecnologia. Nas últimas décadas já se fala até em neoludismo, um movimento radical que
10 defende a reversão da humanidade para um estado pré-tecnológico.
11 É provável que ocorra algo semelhante a uma revolta ludita hoje em dia, se algumas
12 promessas da tecnologia se concretizarem. Uma delas é a substituição dos motoristas
13 profissionais pelo piloto automático do Google. Se isso ocorrer, presenciaremos a maior onda de
14 desemprego dos últimos séculos, o fantasma, dessa vez, seria a inteligência artificial.
15 No entanto, já existe uma outra revolução em curso, que chega liderada pelo aumento
16 crescente dos aplicativos. Além de nos disponibilizar serviços no esquema 24/7 (24 horas por
17 dia, sete dias da semana), a internet começa, agora, a preencher nichos de tempo livre com
18 trabalho. Chamo a esse fenômeno de uberização.
19 Frequentemente, o Uber é um aplicativo associado com a substituição dos táxis nas
20 grandes cidades, mas é muito mais do que isso. Inicialmente, o projeto do Uber era organizar
21 caronas solidárias nas grandes cidades. No entanto, alguns empresários perceberam que
22 poderiam aproveitar o fato de que, hoje em dia, praticamente todas as pessoas dirigem carros e
23 que, se essa força de trabalho fosse aproveitada e organizada por um aplicativo, os motoristas
24 amadores poderiam, praticamente, assumir o mercado preenchido pelos táxis, bastando, para
25 isso, fazer "bicos" em horas vagas.
26 Em pouco tempo, o Uber se tornou uma daquelas empresas arquibilionárias do vale do
27 silício, cujo endereço é apenas alguma caixa-postal de algum paraíso fiscal caribenho. Com ele,
28 vieram outros aplicativos para preencher com trabalho as horas vagas de muitas outras atividades
29 profissionais. A advogada que está com poucos clientes pode compensar essa situação se souber
30 fazer maquiagem. Há um aplicativo para chamá-la nas vésperas de eventos. Ela não precisa ser
31 uma maquiadora profissional e, por isso, sabe-se que ela cobrará a metade do preço. Se você tem
32 uma moto, pode maximizar seu uso fazendo entregas aos sábados em vez de deixá-la ociosa na
33 garagem do seu prédio. Todo mundo está disposto a fazer "bicos", e todo mundo, também fica
34 feliz quando pode pagar menos por um serviço.
35 A uberização é o trabalho em migalhas. Ela começa com a profissionalização do
36 amadorismo, pois todos podemos ser motoristas, jardineiros ou entregadores nas horas vagas.
37 Contudo, o inverso, ou seja, o rebaixamento de profissionais a amadores, já está acontecendo.
38 Muitos profissionais qualificados estão se inscrevendo em aplicativos que os selecionam para
39 prestar serviços a preços reduzidos em determinados horários ou dias da semana. É possível que,
40 em pouco tempo, o trabalho qualificado se torne parte do precariado.
41 Ainda é difícil prever os resultados da uberização do trabalho. A relação contínua entre
42 empregados e patrões tenderá a desaparecer, sobretudo no setor de serviços. A babá de seu
43 filho, quando você for ao cinema com sua esposa, será escalada por um aplicativo e,
44 dificilmente, será a mesma pessoa em todas as ocasiões. Não haverá mais o taxista de confiança
45 ou o garçom que te reconhece sempre que você entra em um determinado restaurante.
46 Com a uberização, a liberdade e a coação se tornam coincidentes, pois todos se tornarão
47 patrões de si mesmos. A dialética senhor-escravo, tão cara aos hegelianos e a seus herdeiros
48 marxistas, desaparecerá. Pois todos seremos sempre ao mesmo tempo senhores e escravos.
49 Exploraremos a nós mesmos de forma implacável.
50 A demarcação entre tempo livre por oposição ao horário de trabalho será ainda mais
51 diluída. Todos se sentirão culpados por tirar uma soneca após o almoço de domingo em vez de
52 aproveitar o tempo fazendo uma corrida de táxi para alguém que precisa ir ao aeroporto para
53 viajar, provavelmente, a trabalho.
54 Na Antiguidade, os gregos desprezavam o trabalho. No mundo cristão, sobretudo com a
55 reforma protestante, ele passou a ser associado com dignidade. Não ter emprego, não ter trabalho
56 passou a corroer a autoestima de muitas pessoas. O homem contemporâneo ainda associa
57 trabalho com dignidade, embora, paradoxalmente, esteja aceitando trabalhos cada vez mais
58 indignos para sobreviver.
59 O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han aponta, no seu livro A sociedade do cansaço
60 (Vozes, 2015), que não é por acaso que enfrentamos uma pandemia de depressão. De um lado, há
61 metas inatingíveis, e de outro, apenas oferta de trabalho precário.
62 A precariedade da vida tende a se tornar um padrão. As novas gerações já sabem que o
63 sonho da estabilidade ficou para trás. Como trabalhadores efêmeros e também consumidores
64 efêmeros, a ideia de uma vida melhor no futuro, como resultado de uma carreira, tende a
65 desaparecer.
A uberização da vida, João Teixeira. FILOSOFIA, Ciência & Vida, Ano IX, nº 120, p.60/61.
A leitura do texto permite concluir: