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Arrastaram-se para lá, devagar, Sinha Vitória com o filho
mais novo escanchado no quarto e o baú de folha na cabeça,
Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia pendurada
numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira
no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam
atrás. Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se.
O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se no chão.
– Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai. Não obtendo resultado, fustigou-o com a bainha da faca de ponta. Mas
o pequeno esperneou acuado, depois sossegou, deitou-se,
fechou os olhos. Fabiano ainda lhe deu algumas pancadas e
esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse,
espiou os quatro cantos, zangado, praguejando baixo.
A caatinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas.
O voo negro dos urubus fazia círculos altos em redor de
bichos moribundos.
– Anda, excomungado.
O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo.
Tinha o coração grosso, queria responsabilizar alguém pela
sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário – e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse
obstáculo miúdo não era culpado, mas dificultava a marcha, e
o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.
Pelo espírito atribulado do sertanejo passou a ideia de
abandonar o filho naquele descampado. Pensou nos urubus,
nas ossadas, coçou a barba ruiva e suja, irresoluto, examinou
os arredores. Sinha Vitória estirou o beiço indicando vagamente uma direção e afirmou com alguns sons guturais que
estavam perto. Fabiano meteu a faca na bainha, guardou-a
no cinturão, acocorou-se, pegou no pulso do menino, que se
encolhia, os joelhos encostados no estômago, frio como um
defunto. Aí a cólera desapareceu e Fabiano teve pena. Impossível abandonar o anjinho aos bichos do mato. Entregou a
espingarda a Sinha Vitória, pôs o filho no cangote, levantou-se,
agarrou os bracinhos que lhe caíam sobre o peito, moles, finos
como cambitos. Sinha Vitória aprovou esse arranjo, lançou de
novo a interjeição gutural, designou os juazeiros invisíveis.
E a viagem prosseguiu, mais lenta, mais arrastada, num
silêncio grande.
(Graciliano Ramos, Vidas Secas. Adaptado)