Leia o texto para responder à questão.
Ironia
Ouvi de Nizan Guanaes, um dos maiores publicitários
brasileiros, uma frase que não sei se é mesmo dele, mas é
verdadeira à beça: comunicação não é o que a gente diz, e
sim o que os outros entendem.
Ou seja, se você disse alguma coisa que o outro não entendeu, ou entendeu errado, a comunicação foi feita igual, só
que não saiu como você queria. Isso acontece muito quando se emprega a ironia, coisa que faço eventualmente e que
pelo visto faço mal, caso contrário meus leitores não ficariam
tão indignados.
Há pouco tempo escrevi uma crônica ligeiramente debochada, onde eu dizia que, depois de assistir ao programa “No
Limite”, havia chegado à conclusão de que não sobreviveria
cinco minutos na selva, mesmo tendo lido todos os livros que
li, e que portanto o futuro não era dos ratos de biblioteca, e
sim dos escoteiros. Para quê.
Meu correio eletrônico sofreu uma avalanche de cartas
de leitores. Uma parte deles quase teve uma síncope por eu
ter afirmado que escrever e ler eram coisas desnecessárias e
tentou, com muita educação e argumentação, me convencer
a não desistir da profissão e de seguir incentivando os estudantes a encararem os livros. O outro grupo não quis saber
de papo, já saiu me chamando de irresponsável para fora. Os
únicos que adoraram a crônica, adivinhe: foram os escoteiros.
Ironia é dizer exatamente o contrário daquilo que se está
pensando ou sentindo, geralmente com uma intenção sarcástica. Ironizar é depreciar com humor.
Existem mil maneiras de se dizer a mesma coisa. Ao usar
a ironia o escritor convida o leitor a pensar, fazendo com que
ele se sinta coautor daquele pensamento pelo simples fato
de ter compreendido seu significado. A ironia enlaça, a ironia
perturba, a ironia é zombeteira.
A ironia comunica mais do que a verdade nua e crua. Mas
só funciona quando os outros entendem.
(Marta Medeiros. Non-Stop: Crônicas do Cotidiano. Porto Alegre: L&PM, 2015)