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O vício da tecnologia
Entusiastas de tecnologia passaram a semana com os olhos voltados para uma exposição de novidades
eletrônicas realizada recentemente nos Estados Unidos. Entre as inovações, estavam produtos relacionados a
experiências de realidade virtual e à utilização de inteligência artificial — que hoje é um dos temas que mais desperta
interesse em profissionais da área, tendo em vista a ampliação do uso desse tipo de tecnologia nos mais diversos
segmentos.
Mais do que prestar atenção às novidades lançadas no evento, vale refletir sobre o motivo que nos leva a
uma ansiedade tão grande para consumir produtos que prometem inovação tecnológica. Por que tanta gente se
dispõe a dormir em filas gigantescas só para ser um dos primeiros a comprar um novo modelo de smartphone? Por
que nos dispomos a pagar cifras astronômicas para comprar aparelhos que não temos sequer certeza de que serão
realmente úteis em nossas rotinas?
A teoria de um neurocientista da Universidade de Oxford (Inglaterra) ajuda a explicar essa “corrida
desenfreada” por novos gadgets. De modo geral, em nosso processo evolutivo como seres humanos, nosso cérebro
aprendeu a suprir necessidades básicas para a sobrevivência e a perpetuação da espécie, tais como sexo,
segurança e status social.
Nesse sentido, a compra de uma novidade tecnológica atende a essa última necessidade citada: nós nos
sentimos melhores e superiores, ainda que momentaneamente, quando surgimos em nossos círculos sociais com
um produto que quase ninguém ainda possui.
Foi realizado um estudo de mapeamento cerebral que mostrou que imagens de produtos tecnológicos
ativavam partes do nosso cérebro idênticas às que são ativadas quando uma pessoa muito religiosa se depara com
um objeto sagrado. Ou seja, não seria exagero dizer que o vício em novidades tecnológicas é quase uma religião para os mais entusiastas.
O ato de seguir esse impulso cerebral e comprar o mais novo lançamento tecnológico dispara em nosso
cérebro a liberação de um hormônio chamado dopamina, responsável por nos causar sensações de prazer. Ele é
liberado quando nosso cérebro identifica algo que represente uma recompensa.
O grande problema é que a busca excessiva por recompensas pode resultar em comportamentos
impulsivos, que incluem vícios em jogos, apego excessivo a redes sociais e até mesmo alcoolismo. No caso do
consumo, podemos observar a situação problematizada aqui: gasto excessivo de dinheiro em aparelhos eletrônicos
que nem sempre trazem novidade –– as atualizações de modelos de smartphones, por exemplo, na maior parte das
vezes apresentam poucas mudanças em relação ao modelo anterior, considerando-se seu preço elevado. Em
outros casos, gasta-se uma quantia absurda em algum aparelho novo que não se sabe se terá tanta utilidade prática
ou inovadora no cotidiano.
No fim das contas, vale um lembrete que pode ajudar a conter os impulsos na hora de comprar um novo
smartphone ou alguma novidade de mercado: compare o efeito momentâneo da dopamina com o impacto de
imaginar como ficarão as faturas do seu cartão de crédito com a nova compra. O choque ao constatar o rombo em
seu orçamento pode ser suficiente para que você decida pensar duas vezes a respeito da aquisição.
DANA, S. O Globo. Economia. Rio de Janeiro, 16 jan. 2018. Adaptado