Leia o texto a seguir para responder à questão.
Não há para mim uma ruptura entre o saber empírico e o saber científico, mas uma superação. Essa superação
se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, se torna crítica. Ao se fazer
crítica, tornando-se então curiosidade epistemológica, metodicamente rigorosa na sua aproximação com o
objeto, promove achados de maior exatidão.
Na verdade, a curiosidade ingênua está associada ao saber do senso comum. É a mesma curiosidade que, se
tornando crítica, passa a ser curiosidade epistemológica. Muda de qualidade, mas não de essência. A
curiosidade de camponeses com quem tenho dialogado ao longo de minha experiência político-pedagógica é a
mesma curiosidade com que cientistas ou filósofos acadêmicos admiram o mundo. Porém, os cientistas e os
filósofos superam a ingenuidade da curiosidade do camponês ao aplicarem rigor metódico à sua curiosidade.
A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta, como
procura de esclarecimento, faz parte da vida. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que
nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos.
Como manifestação da vida, a curiosidade humana vem sendo histórica e socialmente construída e reconstruída,
precisamente porque a passagem da ingenuidade para a criticidade não se dá automaticamente. Uma das
tarefas precípuas da prática educativa-progressista é exatamente o desenvolvimento da curiosidade crítica,
insatisfeita, indócil. Curiosidade com que podemos nos defender dos "irracionalismos" decorrentes do ou
produzidos pelo excesso de "racionalidade" de nosso tempo altamente tecnologizado.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 55. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2017. p. 32-33. (Adaptado).