Questões do Enem Comentadas sobre português
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A madrasta retalhava um tomate em fatias, assim finas, capaz de envenenara todos. Era possível entrever o arroz branco do outro lado do tomate, tamanha a sua transparência. Com a saudade evaporando pelos olhos, eu insistia em justificar a economia que administrava seus gestos. Afiando a faca no cimento frio da pia, ela cortava o tomate vermelho, sanguíneo, maduro, como se degolasse cada um de nós. Seis. O pai, amparado pela prateleira da cozinha, com o suor desinfetando o ar, tamanho o cheiro do álcool, reparava na fome dos filhos. Enxergava o manejo da faca desafiando o tomate e, por certo, nos pensava devorados pelo vento ou tempestade, segundo decretava a nova mulher. Todos os dias — cotidianamente — havia tomate para o almoço. Eles germinavam em todas as estações. Jabuticaba, manga, laranja, floresciam cada uma em seu tempo. Tomate, não. Ele frutificava, continuamente, sem demandar adubo além do ciúme. Eu desconhecia se era mais importante o tomate ou o ritual de cortá-lo. As fatias delgadas escreviam um ódio e só aqueles que se sentem intrusos ao amor podem tragar.
QUEIRÓS, B. C. Vermelho amargo. São Paulo: Cosac & Naify, 2011.
Ao recuperar a memória da infância, o narrador destaca a importância do tomate nos almoços da família e a ação da madrasta ao prepará-lo. A insistência nessa imagem é um procedimento estético que evidencia a
TEXTO I
Frevo: Dança de rua e de salão, é a grande alucinação do Carnaval pernambucano. Trata-se de uma marcha de ritmo frenético, que é a sua característica principal. E a multidão ondulando, nos meneios da dança, fica a ferver. E foi dessa ideia de fervura (o povo pronuncia frevura, frever) que se criou o nome frevo.
CASCUDO, L. C. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Global, 2001 (adaptado).
TEXTO II
Frevo é Patrimônio Imaterial da Humanidade
O frevo, ritmo genuinamente pernambucano, agora é do mundo. A música que hipnotiza milhões de foliões e dá o tom do Carnaval no estado foi oficialmente reconhecida como Patrimônio Imaterial da Humanidade. O anúncio foi feito em Paris, nesta quarta-feira, durante cerimônia da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Disponível em: www.diariodepernambuco.com.br. Acesso em: 14 jun. 2015.
Apesar de abordarem o mesmo tema, os textos I e II diferenciam-se por pertencerem a gêneros que cumprem, respectivamente, a função social de
Como se apresentam os atos de ler e escrever no contexto dos canais de chat da internet? O próprio nome que designa estes espaços no meio virtual elucida que os leitores-escritores ali estão empenhados em efetivar uma conversação. Porém, não se trata de uma conversação nos moldes tradicionais, mas de um projeto discursivo que se realiza só e através das ferramentas do computador via canal eletrônico mediado por um software específico. A dimensão temporal deste tipo de interlocução caracteriza-se pela sincronicidade em tempo real, aproximando-se de uma conversa telefônica, porém, devido às especificidades do meio que põe os interlocutores em contato, estes devem escrever suas mensagens. Apesar da sensação de estarem falando, os enunciados que produzem são construídos num “texto falado por escrito”, numa “conversação com expressão gráfica”. A interação que se dá “tela a tela”, para que seja bem-sucedida, exige, além das habilidades técnicas anteriormente descritas, muito mais do que a simples habilidade linguística de seus interlocutores. No interior de uma enorme coordenação de ações, o fenômeno chat também envolve conhecimentos paralinguísticos e socioculturais que devem ser partilhados por seus usuários. Isso significa dizer que esta atividade comunicacional, assim como as demais, também apresenta uma vinculação situacional, ou seja, não pode a língua, nesta esfera específica da comunicação humana, ser separada do contexto em que se efetiva.
BERNARDES, A. S.; VIEIRA, P M. T Disponível em: www.anped.org.br. Acesso em: 14 ago. 2012.
No texto, descreve-se o chat como um tipo de conversação “tela a tela” por meio do computador e enfatiza-se a necessidade de domínio de diversas habilidades. Uma característica desse tipo de interação é a
Este mês, a reportagem de capa veio do meu umbigo. Ou melhor, veio de um mal-estar que comecei a sentir na barriga. Sou meio italiano, pizzaiolo dos bons, herdei de minha avó uma daquelas velhas máquinas de macarrão a manivela. Cresci à base de farinha de trigo. Aí, do nada, comecei a ter alergias respiratórias que também pareciam estar ligadas à minha dieta. Comecei a peregrinar por médicos. Os exames diziam que não tinha nada errado comigo. Mas eu sentia, pô. Encontrei a resposta numa nutricionista: eu tinha intolerância a glúten e a lactose. Arrivederci, pizza. Tchau, cervejinha.
Notei também que as prateleiras dos mercados de repente ficaram cheias de produtos que pareciam ser feitos para mim: leite, queijo e iogurte sem lactose, bolo, biscoito e macarrão sem glúten. E o mais incrível é que esse setor do mercado parece ser o que está mais cheio de gente. E não é só no Brasil. Parece ser em todo Ocidente industrializado. Inclusive na Itália.
O tal glúten está na boca do povo, mas não está fácil entender a real. De um lado, a imprensa popular faz um escarcéu, sem no entanto explicar o tema a fundo. De outro, muitos médicos ficam na defensiva, insinuando que isso tudo não passa de modismo, sem fundamento científico. Mas eu sei muito bem que não é só modismo — eu sinto na barriga.
O tema é um vespeiro — e por isso julgamos que era hora de meter a colher, para separar o joio do trigo e dar respostas confiáveis às dúvidas que todo mundo tem.
BURGIERMAN, D. R. Tem algo grande aí. Superinteressante, n. 335, jul. 2014 (adaptado).
O gênero editorial de revista contém estratégias argumentativas para convencer o público sobre a relevância da matéria de capa. No texto, considerando a maneira como o autor se dirige aos leitores, constitui uma característica da argumentação desenvolvida o(a)
Essa escultura foi produzida durante o período da ditadura
stalinista, na ex-União Soviética, e representa o(a)
Pra onde vai essa estrada?
— Sô Augusto, pra onde vai essa estrada?
O senhor Augusto:
— Eu moro aqui há 30 anos, ela nunca foi pra parte nenhuma, não.
— Sô Augusto, eu estou dizendo se a gente for andando aonde a gente vai?
O senhor Augusto:
— Vai sair até nas Oropas, se o mar der vau.
Vocabulário
Vau: Lugar do rio ou outra porção de água onde esta é pouco funda e, por isso, pode ser transposta a pé ou a cavalo.
MAGALHÃES, L. L. A.; MACHADO, R. H. A. (Org.). Perdizes, suas histórias, sua gente, seu folclore. Perdizes: Prefeitura Municipal, 2005.
As anedotas são narrativas, reais ou inventadas,
estruturadas com a finalidade de provocar o riso.
O recurso expressivo que configura esse texto como uma
anedota é o(a)
Doutor dos sentimentos
Veja quem é e o que pensa o português António Damásio, um dos maiores nomes da neurociência atual, sempre em busca de desvendar os mistérios do cérebro, das emoções e da consciência
Ele é baixo, usa óculos, tem cabelos brancos penteados para trás e costuma vestir terno e gravata. A surpresa vem quando começa a falar. António Damásio não confirma em nada o clichê que se tem de cientista. Preocupado em ser o mais didático possível, tenta, pacientemente, com certa graça e até ironia, sempre que cabível, traduzir para os leigos estudos complexos sobre o cérebro. Português, Damásio é um dos principais expoentes da neurociência atual.
Diferentemente de outros neurocientistas, que acham que apenas a ciência tem respostas à compreensão da mente, Damásio considera que muitas ideias não provêm necessariamente daí. Para ele, um substrato imprescindível para entender a mente, a consciência, os sentimentos e as emoções advém da vida intuitiva, artística e intelectual. Fora dos meios científicos, o nome de Damásio começou a ser celebrado na década de 1990, quando lançou seu primeiro livro, uma obra que fala de emoção, razão e do cérebro humano.
TREFAUT, M. P Disponível em: http://revistaplaneta.terra.com.br. Acesso em: 2 set. 2014 (adaptado).
Na organização do texto, a sequência que atende à função sociocomunicativa de apresentar objetivamente o cientista António Damásio é a
A tecnologia está, definitivamente, presente na vida cotidiana. Seja para consultar informações, conversar com amigos e familiares ou apenas entreter, a internet e os celulares não saem das mãos e mentes das pessoas. Por esse motivo, especialistas alertam: o uso excessivo dessas ferramentas pode viciar. O problema, dizem os especialistas, é o usuário conseguir diferenciar a dependência do uso considerado normal. Hoje, a internet e os celulares são ferramentas profissionais e de estudo.
MATSUURA, S. O Globo, 10 jun. 2013 (adaptado).
O desenvolvimento da sociedade está relacionado ao avanço das tecnologias, que estabelecem novos padrões de comportamento. De acordo com o texto, o alerta dos especialistas deve-se à
Chamou-me o bragantino e levou-me pelos corredores e pátios até ao hospício propriamente. Aí é que percebi que ficava e onde, na seção, na de indigentes, aquela em que a imagem do que a Desgraça pode sobre a vida dos homens é mais formidável. O mobiliário, o vestuário das camas, as camas, tudo é de uma pobreza sem par. Sem fazer monopólio, os loucos são da proveniência mais diversa, originando-se em geral das camadas mais pobres da nossa gente pobre. São de imigrantes italianos, portugueses e outros mais exóticos, são os negros roceiros, que teimam em dormir pelos desvãos das janelas sobre uma esteira esmolambada e uma manta sórdida; são copeiros, cocheiros, moços de cavalariça, trabalhadores braçais. No meio disto, muitos com educação, mas que a falta de recursos e proteção atira naquela geena social.
BARRETO, L. Diário do hospício e O cemitério dos vivos. São Paulo: Cosac& Naify, 2010.
No relato de sua experiência no sanatório onde foi interno, Lima Barreto expõe uma realidade social e humana marcada pela exclusão. Em seu testemunho, essa reclusão demarca uma
Acho que educar é como catar piolho na cabeça de criança.
É preciso ter confiança, perseverança e um certo despojamento.
É preciso, também, conquistar a confiança de quem se quer educar, para fazê-lo deitar no colo e ouvir histórias.
MUNDURUKU, D. Disponível em: http://caravanamekukradja.blogspot.com.br. Acesso em: 5 dez. 2012.
Concorrem para a estruturação e para a progressão das ideias no texto os seguintes recursos:
Na tirinha, o leitor é conduzido a refletir sobre
relacionamentos afetivos. A articulação dos recursos
verbais e não verbais tem o objetivo de
O comportamento do público, em geral, parece indicar o seguinte: o texto da peça de teatro não basta em si mesmo, não é uma obra de arte completa, pois ele só se realiza plenamente quando levado ao palco. Para quem pensa assim, ler um texto dramático equivale a comer a massa do bolo antes de ele ir para o forno. Mas ele só fica pronto mesmo depois que os atores deram vida àquelas emoções; que cenógrafos compuseram os espaços, refletindo externamente os conflitos internos dos envolvidos; que os figurinistas vestiram os corpos sofredores em movimento.
LACERDA, R. Leitores. Metáfora, n. 7, abr. 2012.
Em um texto argumentativo, podem-se encontrar diferentes estratégias para guiar o leitor por um raciocínio e chegar a determinada conclusão. Para defender sua ideia a favor da incompletude do texto dramático fora do palco, o autor usa como estratégia argumentativa a
É dia de festa na roça. Fogueira posicionada, caipiras arrumados, barraquinhas com quitutes suculentos e bandeirinhas de todas as cores enfeitando o salão. Mas o ponto mais esperado de toda a festa é sempre a quadrilha, embalada por música típica e linguajar próprio. Anarriê, alavantú, balancê de damas e tantos outros termos agitados pelo puxador da quadrilha deixam a festa de São João, comemorada em todo o Brasil, ainda mais completa.
Embora os festejos juninos sejam uma herança da colonização portuguesa no Brasil, grande parte das tradições da quadrilha tem origem francesa. E muita gente dança sem saber.
As influências estrangeiras são muitas nas festas dos três santos do mês de junho (Santo Antônio, no dia 13, e São Pedro, no dia 29, completam o grupo). O “changê de damas” nada mais é do que a troca de damas na dança, do francês “changer”. O “alavantú”, quando os casais se aproximam e se cumprimentam, também é francês, e vem de “en avant tous”. Assim também acontece com o “balancê”, que também vem de bailar em francês.
SOARES, L. Disponível em: http://gazetaonline.globo.com. Acesso em: 30 jun. 2015 (adaptado).
Ao discorrer sobre a festa de São João e a quadrilha como manifestações da cultura corporal, o texto privilegia a descrição de
O último refúgio da língua geral no Brasil
No coração da Floresta Amazônica é falada uma língua que participou intensamente da história da maior região do Brasil. Trata-se da língua geral, também conhecida como nheengatu ou tupi moderno. A língua geral foi ali mais falada que o próprio português, inclusive por não índios, até o ano de 1877. Alguns fatores contribuíram para o desaparecimento dessa língua de grande parte da Amazônia, como perseguições oficiais no século XVIII e a chegada maciça de falantes de português durante o ciclo da borracha, no século XIX. Língua-testemunho de um passado em que a Amazônia brasileira alargava seus territórios, a língua geral hoje é falada por mais de 6 mil pessoas, num território que se estende pelo Brasil, Venezuela e Colômbia. Em 2002, o município de São Gabriel da Cachoeira ficou conhecido por ter oficializado as três línguas indígenas mais usadas ali: o nheengatu, o baníua e o tucano. Foi a primeira vez que outras línguas, além do português, ascendiam à condição de línguas oficiais no Brasil. Embora a oficialização dessas línguas não tenha obtido todos os resultados esperados, redundou no ensino de nheengatu nas escolas municipais daquele município e em muitas escolas estaduais nele situadas. É fundamental que essa língua de tradição eminentemente oral tenha agora sua gramática estudada e que textos de diversas naturezas sejam escritos, justamente para enfrentar os novos tempos que chegaram.
NAVARRO, E. Estudos Avançados, n. 26, 2012 (adaptado).
O esforço de preservação do nheengatu, uma língua que sofre com o risco de extinção, significa o reconhecimento de que
Inovando os padrões estéticos de sua época, a obra de
Pablo Picasso foi produzida utilizando características
de um movimento artístico que
O jornal vai morrer. É a ameaça mais constante dos especialistas. E essa nem é uma profecia nova. Há anos a frase é repetida. Experiências são feitas para atrair leitores na era da comunicação nervosa, rápida, multicolorida, performática. Mas o que é o jornal? Onde mora seu encanto?
O que é sedutor no jornal é ser ele mesmo e nenhum outro formato de comunicação de ideias, histórias, imagens e notícias. No tempo das muitas mídias, o que precisa ser entendido é que cada um tem um espaço, um jeito, uma personalidade.
Quando surge uma nova mídia, há sempre os que a apresentam como tendência irreversível, modeladora do futuro inevitável e fatal. Depois se descobre que nada é substituído e o novo se agrega ao mesmo conjunto de seres através dos quais nos comunicamos.
Os jornais vão acabar, garantem os especialistas. E, por isso, dizem que é preciso fazer jornal parecer com as outras formas da comunicação mais rápida, eletrônica, digital. Assim, eles morrerão mais rapidamente. Jornal tem seu jeito. É imagem, palavra, informação, ideia, opinião, humor, debate, de uma forma só dele.
Nesse tempo tão mutante em que se tuíta para milhares, que retuítam para outros milhares o que foi postado nos blogs, o que está nos sites dos veículos on-line, que chance tem um jornal de papel que traz uma notícia estática, uma foto parada, um infográfico fixo?
Terá mais chance se continuar sendo jornal.
LEITÃO, M. Jornal de papel. O Tempo, n. 5 684, 8 jul. 2012 (adaptado).
Muito se fala sobre o impacto causado pelas tecnologias
da comunicação e da informação nas diferentes mídias.
A partir da análise do texto, conclui-se que essas
tecnologias
— Recusei a mão de minha filha, porque o senhor é... filho de uma escrava.
— Eu?
— O senhor é um homem de cor!... Infelizmente esta é a verdade...
Raimundo tornou-se lívido. Manoel prosseguiu, no fim de um silêncio:
— Já vê o amigo que não é por mim que lhe recusei Ana Rosa, mas é por tudo! A família de minha mulher sempre foi muito escrupulosa a esse respeito, e como ela é toda a sociedade do Maranhão! Concordo que seja uma asneira; concordo que seja um prejuízo tolo! O senhor porém não imagina o que é por cá a prevenção contra os mulatos!... Nunca me perdoariam um tal casamento; além do que, para realizá-lo, teria que quebrar a promessa que fiz a minha sogra, de não dar a neta senão a um branco de lei, português ou descendente direto de portugueses!
AZEVEDO, A. O mulato. São Paulo: Escala, 2008.
Influenciada pelo ideário cientificista do Naturalismo, a obra destaca o modo como o mulato era visto pela sociedade de fins do século XIX. Nesse trecho, Manoel traduz uma concepção em que a
Os esportes podem ser classificados levando em consideração critérios como a quantidade de competidores e a interação com o adversário. Os chamados Esportes individuais em interação com o oponente são aqueles em que os atletas se enfrentam diretamente, tentando alcançar os objetivos do jogo e evitando, concomitantemente, que o adversário o faça, porém sem a colaboração de um companheiro de equipe. Os Esportes coletivos em interação com o oponente são aqueles nos quais os atletas, colaborando com seus companheiros de equipe, de forma combinada, enfrentam-se diretamente com a equipe adversária, tentando atingir os objetivos do jogo, evitando, ao mesmo tempo, que os adversários o façam.
GONZALEZ, R J. Sistema de classificação de esportes com base nos critérios: cooperação, interação com o adversário, ambiente, desempenho comparado e objetivos táticos da ação. EFDeportes, n. 71, abr. 2004.
São exemplos de “esportes individuais em interação com o oponente” e “esportes coletivos em interação com o oponente”, respectivamente,
Tenho visto criaturas que trabalham demais e não progridem. Conheço indivíduos preguiçosos que têm faro: quando a ocasião chega, desenroscam-se, abrem a boca e engolem tudo.
Eu não sou preguiçoso. Fui feliz nas primeiras tentativas e obriguei a fortuna a ser-me favorável nas seguintes.
Depois da morte do Mendonça, derrubei a cerca, naturalmente, e levei-a para além do ponto em que estava no tempo de Salustiano Padilha. Houve reclamações.
— Minhas senhoras, Seu Mendonça pintou o diabo enquanto viveu. Mas agora é isto. E quem não gostar, paciência, vá à justiça.
Como a justiça era cara, não foram à justiça. E eu, o caminho aplainado, invadi a terra do Fidélis, paralítico de um braço, e a dos Gama, que pandegavam no Recife, estudando direito. Respeitei o engenho do Dr. Magalhães, juiz.
Violências miúdas passaram despercebidas. As questões mais sérias foram ganhas no foro, graças às chicanas de João Nogueira.
Efetuei transações arriscadas, endividei-me, importei maquinismos e não prestei atenção aos que me censuravam por querer abarcar o mundo com as pernas. Iniciei a pomicultura e a avicultura. Para levar os meus produtos ao mercado, comecei uma estrada de rodagem. Azevedo Gondim compôs sobre ela dois artigos, chamou-me patriota, citou Ford e Delmiro Gouveia. Costa Brito também publicou uma nota na Gazeta, elogiando-me e elogiando o chefe político local. Em consequência mordeu-me cem mil réis.
RAMOS, G. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 1990.
O trecho, de São Bernardo, apresenta um relato de Paulo Honório, narrador-personagem, sobre a expansão de suas terras. De acordo com esse relato, o processo de prosperidade que o beneficiou evidencia que ele
Entrei numa lida muito dificultosa. Martírio sem fim o de não entender nadinha do que vinha nos livros e do que o mestre Frederico falava. Estranheza colosso me cegava e me punha tonto. Acho bem que foi desse tempo o mal que me acompanha até hoje de ser recanteado e meio mocorongo. Com os meus, em casa, conversava por trinta, tinha ladineza e entendimento. Na rua e na escola — nada; era completamente afrásico. As pessoas eram bichos do outro mundo que temperavam um palavreado grego de tudo.
Já sabia ajuntar as sílabas e ler por cima toda coisa, mas descrencei e perdi a influência de ir à escola, porque diante dos escritos que o mestre me passava e das lições marcadas nos livros, fiquei sendo um quarta-feira de marca maior. Alívio bom era quando chegava em casa.
BERNARDES, C. Rememórias dois. Goiânia: Leal, 1969.
O narrador relata suas experiências na primeira escola que frequentou e utiliza construções linguísticas próprias de determinada região, constatadas pelo