“Aqui, portanto, está a complexidade, o fascínio e a tragédia
de toda vida política. A política é composta de dois elementos
– utopia e realidade – pertencentes a dois planos diferentes
que jamais se encontram. Não há barreira maior ao pensamento
político claro do que o fracasso em distinguir entre
ideais, que são utopia, e instituições, que são realidade. O
comunista, que lançava o comunismo contra a democracia,
pensava normalmente no comunismo como um ideal puro de
igualdade e fraternidade, e na democracia como uma instituição que existia na Grã-Bretanha, França ou Estados Unidos,
e que apresentava os interesses escusos, as desigualdades
e a opressão inerentes a todas as instituições políticas. O
democrata, que fazia a mesma comparação, estava de fato
comparando um padrão ideal de democracia existente no
céu, com o comunismo, como uma instituição existente na
Rússia Soviética, com suas divisões de classes, suas caças
aos hereges e seus campos de concentração. A comparação,
feita, em ambos os casos, entre um ideal e uma instituição,
é irrelevante e não faz sentido. O ideal, uma vez incorporado
numa instituição, deixa de ser um ideal e torna-se a expressão
de um interesse egoístico, que deve ser destruído em
nome de um novo ideal. Esta constante interação de forças irreconciliáveis é a substância da política. Toda situação política contém elementos mutuamente incompatíveis de utopia
e realidade, de moral e poder."
(E. H. Carr, Vinte Anos de Crise: 1919-1939. Uma Introdução ao Estudo das
Relações Internacionais. Editora Universidade de Brasília, 2001)
Nesse texto, o historiador, jornalista e teórico das relações
internacionais britânico E. H. Carr reflete sobre a complexidade
da política. Segundo o texto,