“Agora, pois, que meu espírito está livre de todos os cuidados,
e que consegui um repouso assegurado numa pacífica
solidão, aplicar-me-ei seriamente e com liberdade em destruir
em geral todas as minhas antigas opiniões. Ora, não
será necessário, para alcançar esse desígnio, provar que
todas elas são falsas, o que talvez nunca levasse a cabo;
mas, uma vez que a razão já me persuade de que não devo
menos cuidadosamente impedir-me de dar crédito às coisas
que não são inteiramente certas e indubitáveis, do que às
que nos parecem manifestamente ser falsas, o menor motivo
de dúvida que eu nelas encontrar bastará para me levar a
rejeitar todas. E, para isso, não é necessário que examine
cada uma em particular, o que seria um trabalho infinito; mas,
visto que a ruína dos alicerces carrega necessariamente consigo
todo o resto do edifício, dedicar-me-ei inicialmente aos
princípios sobre os quais todas as minhas antigas opiniões
estavam apoiadas. Tudo o que recebi, até presentemente,
como o mais verdadeiro e seguro, aprendi-o dos sentidos ou
pelos sentidos: ora, experimentei algumas vezes que esses
sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar
inteiramente em quem já nos enganou uma vez."
(René Descartes, Meditações metafísicas. São Paulo:
WMF Martins Fontes, 2011)
Nesse texto, René Descartes submete à crítica o conhecimento
derivado dos sentidos e com isso justifica a assim chamada
“dúvida metódica". Esta última consiste em