Texto CB2A1-I
As mãos que criam, criam o quê?
A ancestralidade de dona Irinéia mostra-se presente em
suas peças feitas com o barro vermelho da sua região. São
cabeças, figuras humanas, entre outras esculturas que narram, por
meio da forma moldada no barro, episódios históricos, lutas e
conquistas vividos pelos moradores de sua comunidade e do
Quilombo de Palmares.
Um exemplo é a escultura que representa pessoas em cima
de uma jaqueira e que se tornou uma peça muito conhecida de
dona Irinéia. A jaqueira se tornou objeto de memória, pois
remonta a uma enchente, durante a qual ela e suas três irmãs
ficaram toda a noite em cima da árvore, esperando a água baixar.
O manejo da matéria-prima é feito com a retirada do barro
que depois é pisoteado, amassado e moldado. As peças são então
queimadas, e ganham uma coloração naturalmente avermelhada.
Irinéia Rosa Nunes da Silva é uma das mais reconhecidas
artistas da cerâmica popular brasileira. A história de dona Irinéia,
mestra artesã do Patrimônio Vivo de Alagoas desde 2005, está
entrelaçada com a história do povoado quilombola Muquém,
onde nasceu em 1949. O povoado pertence ao município de
União dos Palmares, na zona da mata alagoana, e se encontra
próximo à serra da Barriga que carrega forte simbolismo, pois é a
terra do Quilombo dos Palmares.
Por volta dos vinte anos, dona Irinéia começou a ajudar
sua mãe no sustento da família, fazendo panelas de barro.
Entretanto, o costume de fazer promessas aos santos de quem se
é devoto, quando se está passando por alguma provação ou
doença, fez surgir para a artesã outras encomendas. Quando a
graça é alcançada, costuma-se levar a parte do corpo curado
representado em uma peça de cerâmica, como agradecimento
para o santo. Foi assim que dona Irinéia começou a fazer cabeças,
pés e assim por diante.
Até que um dia, uma senhora que sofria com uma forte dor
de cabeça encomendou da ceramista uma cabeça, pois ia fazer uma
promessa ao seu santo devoto. A senhora alcançou sua graça, o que
fez com que dona Irinéia ficasse ainda mais conhecida na região.
Chegou, inclusive, ao conhecimento do SEBRAE de Alagoas, que
foi até dona Irinéia e ofereceu algumas capacitações que abriram
mais possibilidades de produção para a ceramista. O número de
encomendas foi aumentando e, com ele, sua imaginação e
criatividade que fizeram nascer objetos singulares.
Em Muquém, vivem cerca de quinhentas pessoas que
contam com um posto de saúde, uma escola e a casa de farinha,
onde as mulheres se reúnem para moer a mandioca, alimento
central na comunidade, assim como de tantos outros quilombos
no Nordeste. No dia a dia do povoado, o trabalho com o barro
também preenche o tempo de muitas mulheres e alguns homens
que se dedicam à produção de cerâmica, enquanto ensinam as
crianças a mexer com a terra, produzindo pequenos bonecos.
Internet: (com adaptações).