Questões de Concurso
Sobre parênteses em português
Foram encontradas 434 questões
propostas.
1 Entender a saúde como grau zero de malestar
permitiu uma grande invenção do século XX,
que foi a previdência social. Se a saúde é a nãodoença,
então sabemos exatamente do que cada
qual necessita para curar-se. A sociedade, assim,
se responsabiliza por tais tratamentos de saúde.
Isso é moral e justificável. Aliás, é quase consenso
que uma das maiores falhas dos Estados Unidos é
não terem um sistema de saúde como o europeu e
o canadense.
2 Contudo, com os avanços da medicina e a
nova idéia de saúde surgem problemas. Antes de
mais nada, até onde vai minha responsabilidade
pela saúde dos outros? Se alguém adoece ou se
fere por decisão própria, deve a sociedade arcar
com suas despesas? Não penso no caso da
tentativa de suicídio, porque esta pode decorrer de
um sofrimento psíquico tão intenso que justifica a
sociedade tratar não só os danos físicos, mas a
causa íntima deles. No entanto, no caso de quem
fuma ou bebe, deve a sociedade custear as
doenças que ele terá a mais do que o não-fumante
ou o não-alcoólico? Ou deveriam essas pessoas,
alertadas há anos dos custos que despejam sobre
seus concidadãos, arcar com eles ou com um
pagamento suplementar de seguro-saúde? É
possível, hoje, estabelecer melhor que no passado
o grau de responsabilidade de cada pessoa nas
mazelas sociais. Vemos isso nos seguros de carro:
os rapazes de 18 a 24 anos são os maiores
causadores de acidentes, portanto quem está nessa
faixa paga um prêmio maior. Todavia, se ao fim de
um ano ou dois ele mostrar que não gerou custos
para a seguradora, provavelmente começará a
ganhar bônus. Esse modelo possivelmente se
ampliará para a saúde.
3 O segundo problema está ligado à expansão
da saúde para um a mais. Uma coisa é curar ou
sarar, outra é dar vantagens - como o que se
chama wellness - que as pessoas antes não
tinham ou que não estão na previsão usual de
nossa vida e de sua qualidade. Aqui, para além do
valor altamente moral da saúde como não-doença,
entram elementos que podem ser da ordem da
vaidade, ou do gosto pelo próprio corpo, ou de certa
felicidade. É difícil separar o que é vaidade, o que é
felicidade, e talvez se esmerar em distingui-los
indique apenas uma atitude moralista no pior
sentido do termo. Mas cada vez mais pessoas hão
de querer não apenas realizar cirurgias plásticas,
como também ampliar seu tempo de vida
sexualmente ativa, sua capacidade física e outras
qualidades que, longe de nos reconduzirem à média
zero do histórico humano, vão nos levar - permitam
a citação de Toy Story - "para o infinito e além".
Ora, se a "medicina da cura" tem custos diferentes
conforme o perfil de saúde e doença dos pacientes,
a "medicina do mais" tem custos diferentes
conforme o que o indivíduo almeja. Naquele caso, o
custo depende de onde se parte; neste, de aonde
se quer chegar. Podemos modelar nosso corpo e
nossa vida, mais que no passado. E quem paga por
isso?
4 Aqui, a ideia de um custeio social - que na
verdade é um rateio, porque como contribuintes
pagamos aquilo que vamos desfrutar como
cidadãos - fica mais difícil. Uma coisa é ratearmos
o custo de operações de câncer, de tratamento de
doenças caras. Outra é ratearmos o sonho de corpo
de cada um. O rateio funciona quando o desejo se
reduz ao de zerar a dor. Esse desejo baixo, mínimo
("só quero parar de sentir dor") admite que,
moralmente, todos paguemos por ele. Entretanto,
alguém de nós aceitaria ratear uma operação para
alguém que quer ampliar o busto, aumentar o pênis
ou simplesmente ter uma condição física superior à
média? Não creio.
5 O melhor exemplo é o do Viagra. É
perfeitamente legítimo um Estado de bem-estar
social, como os europeus, fornecê-lo a idosos que
sentem dificuldade em ter ou manter a ereção. Mas
quantos comprimidos azuis por semana? Por que
um e não dois, três, sete? Não há mais medida,
porque nosso metro moral e previdenciário era o
zero, a não-dor. O orgasmo não se encaixa nesse
modelo. Por melhor que uma relação sexual seja
para a saúde das pessoas, não sabemos qual
número seria o adequado.
6 O caso do sexo tem um elemento irônico,
ademais. Quase todos sabem como é forte, no
desejo sexual, a transgressão. Daí a atração do
fruto proibido. E como fica se o Estado me fornece
os meios de ter relações sexuais? Não se
burocratiza o imaginário em torno do sexo? "O sr. já
recebeu seus comprimidos do mês. O próximo, por
favor!" Talvez o Viagra só funcione de verdade se
for comprado ou, como dizem os baianos sobre as
fitas do Bonfim, se você o ganhar de alguém - ou
roubar
Os dados são do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (Cenap), órgão ligado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente. O Cenap avalia que a onça-pitada está criticamente ameaçada na Caatinga. A estimativa é de que existam no bioma 356 animais, divididos em cinco áreas. Desse total, apenas cerca da metade está em idade reprodutiva (descontam-se os animais mais jovens e os muito velhos). Dessa forma, o número restante, 178, deixa a espécie em situação crítica - um dos critérios para a classificação é haver menos de 250 animais.
Uma analista ambiental afirma que a situação na Mata Atlântica é também extremamente grave. Uma estimativa preliminar, baseada em informações de diversos pesquisadores, indica a existência de 170 indivíduos maduros no bioma. Ela conta que é muito difícil encontrar vestígios do animal e mais raro ainda vê-lo.
Os estudos confirmam que a população de onças-pintadas vem caindo a cada ano. Entre as ameaças, tanto na Caatinga quanto na Mata Atlântica, estão a alteração e a perda de hábitat, provocadas pelo desmatamento e a falta de alimento. Na Caatinga, parte da população se alimenta de tatus e porcos-do-mato e acaba havendo competição por essas presas. Também faltam matas contínuas para garantir a sobrevivência da onça-pintada. Outro conflito é que, ao matar rebanhos, elas podem incomodar fazendeiros e serem perseguidas.
Para o Ibama, a espécie é considerada vulnerável, porque sua situação é melhor em outros biomas e regiões. O quadro é mais tranquilo no Pantanal e na Amazônia. É por isso que o presidente do Instituto Onça-pintada defende ações regionalizadas. "Cada bioma tem um problema diferente". A onça, explica, é uma espécie guarda-chuva. Ao fazer um esforço para sua preservação, várias outras espécies que estão no mesmo ecossistema se beneficiam. Ele acredita ser melhor investir na Amazônia onde, por haver grandes áreas de floresta intocadas, as populações de onças-pintadas conseguiram se manter, para garantir a sobrevivência do animal. Por isso, é importante evitar a degradação e o desmatamento.
(Afra Balazina. O Estado de S. Paulo, Vida&, A26, 24
de janeiro de 2010, com adaptações)
I. O segmento isolado por travessões no 1º parágrafo tem função explicativa, em relação à expressão que o antecede.
II. Os parênteses que isolam segmentos no 2º parágrafo indicam, respectivamente, a sigla de um órgão federal e uma observação que complementa o sentido do que vem sendo desenvolvido.
III. As aspas na frase contida no 5º parágrafo indicam tratar-se de afirmativa de uma autoridade no assunto apresentado no texto.
Está correto o que se afirma em
conjunção de fatores especialmente desfavoráveis: a recessão
mundial, que reduz os gastos com publicidade, e o avanço da
internet, que suga anúncios, sobretudo os pequenos e rentáveis
classificados, e também serve como fonte - em geral gratuita -
de informações. Na Inglaterra, para sobreviver, os jornais
querem leis menos severas para fusão e aquisição de empresas.
Na França, o governo duplicou a verba de publicidade e dá
isenção tributária a investimentos dos jornais na internet.
Mas em nenhum outro lugar a tormenta é tão assustadora
quanto nos Estados Unidos. A recessão atropelou os dois
maiores anunciantes - o mercado imobiliário e a indústria
automobilística - e a evolução da tecnologia, com seu impacto
sísmico na disseminação da informação, se dá numa velocidade
alucinante no país. O binômio recessão-internet está produzindo
uma devastação. Vários jornais, mesmo bastante antigos e
tradicionais, fecharam suas portas.
O fechamento de um jornal é o fim de um negócio como
outro qualquer. Mas, quando o jornal é o símbolo e um dos
últimos redutos do jornalismo, como é o caso do New York
Times, morrem mais coisas com ele. Morrem uma cultura e
uma visão generosa do mundo. Morre um estilo de vida
romântico, aventureiro, despojado e corajoso que, como em
nenhum outro ramo de negócios, une funcionários, consumidores
e acionistas em um objetivo comum e maior do que
interesses particulares de cada um deles.
Desde que os romanos passaram a pregar em locais
públicos sua Acta Diurna, o manuscrito em que informavam
sobre disputas de gladiadores, nascimentos ou execuções, os
jornais começaram a entrar na veia das sociedades civilizadas.
Mas, para chegar ao auge, a humanidade precisou fazer uma
descoberta até hoje insubstituível (o papel), duas invenções
geniais (a escrita e a impressão) e uma vasta mudança social (a
alfabetização). Por isso, um jornal, ainda que seja um negócio,
não é como vender colírio ou fabricar escadas rolantes.
(André Petry. Revista Veja, 29 de abril de 2009, pp. 90-93, com
adaptações)
Donne em 1624, frase que atravessaria os séculos como um
dos lugares-comuns mais citados de todos os tempos. Todo lugar-
comum, porém, tem um alicerce na realidade ou nos sentimentos
humanos - e esse não é exceção. Durante toda a história
da espécie, a biologia e a cultura conspiraram juntas para
que a vida humana adquirisse exatamente esse contorno, o de
um continente, um relevo que se espraia, abraça e se interliga.
A vida moderna, porém, alterou-o de maneira drástica.
Em certos aspectos partiu o continente humano em um arquipélago
tão fragmentado que uma pessoa pode se sentir totalmente
separada das demais. Vencer tal distância e se reunir
aos outros, entretanto, é um dos nossos instintos básicos. E é a
ele que atende um setor do mercado editorial que cresce a
passos largos: o da autoajuda e, em particular, de uma
autoajuda que se pode descrever como espiritual. Não porque
tenha necessariamente tonalidades religiosas (embora elas, às
vezes, sejam nítidas), mas porque se dirige àquelas questões
de alma que sempre atormentam os homens. Como a perda de
uma pessoa querida, a rejeição ou o abandono, a dificuldade de
conviver com os próprios defeitos e os alheios, o medo da
velhice e da morte, conflitos com os pais e os filhos, a frustração
com as aspirações que não se realizaram, a perplexidade diante
do fim e a dúvida sobre o propósito da existência. Questões
que, como séculos de filosofia já explicitaram, nem sempre têm
solução clara - mas que são suportáveis quando se tem com
quem dividir seu peso, e esmagadoras quando se está só.
As mudanças que conduziram a isso não são poucas
nem sutis: na sua segunda metade, em particular, o século XX
foi pródigo em abalos de natureza social que reconfiguraram o
modo como vivemos. O campo, com suas relações próximas, foi
trocado em massa pelas cidades, onde vigora o anonimato. As
mulheres saíram de casa para o trabalho, e a instituição da
"comadre" virtualmente desapareceu. Desmanchou-se também
a ligação quase compulsória que se tinha com a religião, as
famílias encolheram drasticamente não só em número de filhos
mas também em sua extensão. A vida profissional se tornou
terrivelmente competitiva, o que acrescenta ansiedade e reduz as chances de fazer amizades verdadeiras no local de trabalho.
Também o celular e o computador fazem sua parte, aumentando
o número de contatos de que se desfruta, mas reduzindo
sua profundidade e qualidade.
Perdeu-se aquela vasta rede de segurança que, é certo,
originava fofoca e intromissão, mas também implicava conselhos
e experiência, valores sólidos e afeição desprendida, que
não aumenta nem diminui em função do sucesso ou da beleza.
Essa é a lacuna da vida moderna que a autoajuda vem se propondo
a preencher: esse sentido de desconexão que faz com
que em certas ocasiões cada um se sinta como uma ilha desgarrada
do continente e sem meios de se reunir novamente a
ele.
(Isabela Boscov e Silvia Rogar. Veja, 2 de dezembro de 2009,
pp. 141-143, com adaptações)
Está correto o que se afirma APENAS em
Os parênteses isolam, considerando-se o contexto,
No fragmento acima,
O emprego do sinal de pontuação está corretamente justificado em:
Em relação ao texto acima, julgue os itens que se seguem.
não haveria limites para a atividade humana, seja quanto ao uso
de recursos naturais, seja de energia, de praticamente tudo. O
tempo encarregou-se de mostrar o contrário - com os limites na
área dos recursos hídricos acentuados pelo crescimento da
população; com o uso de combustíveis fósseis detonando a
questão das mudanças do clima; com a insustentabilidade dos
atuais padrões de produção e consumo, além da capacidade de
reposição do planeta. Agora, mais alguns limites se esboçam no
horizonte para a fabricação e uso dos computadores, por causa
do consumo de energia; da emissão de gases em razão de seu
uso; da sobrecarga em vários tipos de utilização, que ameaça
até com um "apagão planetário"; e da geração de lixo tecnológico,
muitas vezes exportado para países pobres.
Estudo recente mostrou que o consumo de energia pelos
computadores no mundo todo mais que dobrou entre 2000 e
2005; outro estudo situa as emissões de gases poluentes
gerados pela tecnologia da informação e comunicação no mesmo
nível das emissões feitas pelo transporte aéreo no mundo.
São números que começam a preocupar a própria
indústria de produção de equipamentos nessas áreas. Divulgado
o último relatório, as principais produtoras criaram um sistema
conjunto para aumentar a eficiência de hardwares e
softwares. Pensam em novas formas de suprimento de energia,
talvez a solar, em substituição ao tipo de corrente nos centros
armazenadores de informações e em avisos que advirtam sobre
os problemas de estocagem ilimitada de informações, imagens
ou som.
Há outros ângulos do problema que chegam a atingir o
campo da política, como nos EUA, em que procedimentos
antiéticos preocupam, com a divulgação de mensagens provocadoras
ou portadoras de falsas informações. Nem é preciso
falar no problema dos spams, que entopem as caixas de recepção
de mensagens no mundo, todos os dias, muitos deles
portadores de vírus extremamente problemáticos. E ainda há o
problema do lixo tecnológico (peças e pedaços de computadores,
pilhas, baterias), já tão grave que a própria ONU criou
diretrizes mundiais que apontam caminhos para ampliar a vida
dos componentes e promover a reciclagem. Especialistas
começam a perguntar se haverá um limite para a internet, em
razão dessa sobrecarga. Seus efeitos desastrosos já se fazem
sentir, em todo o mundo.
(Washington Novaes. O Estado de S. Paulo, A2, 15 de fevereiro
de 2008, com adaptações)
I. Trata-se de um segmento enumerativo, intercalado no contexto.
II. Os parênteses podem ser corretamente substituídos por travessões, sem alteração do sentido original.
III. A ausência do segmento colocado entre parênteses não alteraria a seqüência lógica nem a clareza do período.
Está correto o que se afirma em
cercanias do Parque Nacional Grande Sertão Veredas, no norte
de Minas Gerais, me presenteia com um achado da sabedoria
cabocla: "Pois é, não sei pra onde a Terra está andando, mas
certamente pra bom lugar não é. Só sei que donde só se tira e
não se põe, um dia tudo o mais tem que se acabar." Samuel
dos Santos Pereira viveu seus 75 anos campeando livre entre
cerradões, matas de galeria, matas secas, campos limpos ou
sujos e campos cerrados, ecossistemas que constituem a
magnífica savana brasileira. "Ainda bem que existe o Parque",
exclama o vaqueiro, "porque hoje tudo em volta de mim é
plantação de soja e pastagem pra gado."
Viajar pelo Cerrado do Centro-Oeste é viver a surpresa
permanente. Na Serra da Canastra, em São Roque de Minas,
nascente do Rio São Francisco, podem-se avistar tamanduásbandeira,
lobos-guarás e, com sorte, o pato-mergulhão, ameaçado
de extinção. Lá está também a maravilhosa Casca D'Anta,
primeira e mais alta cachoeira do Velho Chico, com 186 metros
de queda livre.
No Jalapão, no Tocantins, o Cerrado é diferente, parece
um deserto com dunas de até 40 metros de altura. Mas, ao
contrário dos Lençóis Maranhenses, tem água em profusão,
nascentes, cachoeiras, lagoas, serras e chapadões. E uma fauna
exuberante, com 440 espécies de vertebrados. Nas veredas,
os habitantes da comunidade quilombola de Mumbuca
descobriram o capim-dourado, uma fibra que a criatividade local
transformou em artigo de exportação.
Em Goiás, no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros,
o viajante se extasia com a beleza das cachoeiras e das
matas de galeria, das piscinas naturais, das formações rochosas,
dos cânions do Rio Preto e do Vale da Lua. Perto do
município de Chapadão do Céu, também em Goiás, fica o
Parque Nacional das Emas, onde acontece o surpreendente
espetáculo da bioluminiscência, uma irradiação de luz azul
esverdeada produzida pelas larvas de vaga-lumes nos
cupinzeiros. Pena que todo o entorno do parque foi drenado
para permitir a plantação de soja. Agrotóxicos despejados por
avião são levados pelo vento e contaminam nascentes e rios
que atravessam essa unidade de conservação. Outra tristeza
provocada pela ganância humana são as voçorocas das nascentes
do Rio Araguaia, quase cem, com quilômetros de extensão
de dezenas de metros de profundidade. Elas jogam milhões
de toneladas de sedimentos no rio, inviabilizando sua navegabilidade.
Apesar de tanta beleza e biodiversidade (mais de 300 espécies
de plantas locais são utilizadas pela medicina popular), o
Cerrado do "seo" Samuca está minguando e tende a desaparecer.
O que percebo, como testemunha ocular, é que entra
governo e sai governo e o processo de desertificação do país
continua em crescimento assombroso.
Como disse Euclides da Cunha, somos especialistas em
fazer desertos. Só haverá esperança para os vastos espaços
das Geraes, esse sertão do tamanho do mundo, celebrado pela
genialidade de João Guimarães Rosa, se abandonarmos nosso
conformismo e nossa proverbial omissão.
(Araquém Alcântara, fotógrafo. O Estado de S. Paulo, Especial
H 4-5, 27 de setembro de 2009, com adaptações)
cercanias do Parque Nacional Grande Sertão Veredas, no norte
de Minas Gerais, me presenteia com um achado da sabedoria
cabocla: "Pois é, não sei pra onde a Terra está andando, mas
certamente pra bom lugar não é. Só sei que donde só se tira e
não se põe, um dia tudo o mais tem que se acabar." Samuel
dos Santos Pereira viveu seus 75 anos campeando livre entre
cerradões, matas de galeria, matas secas, campos limpos ou
sujos e campos cerrados, ecossistemas que constituem a
magnífica savana brasileira. "Ainda bem que existe o Parque",
exclama o vaqueiro, "porque hoje tudo em volta de mim é
plantação de soja e pastagem pra gado."
Viajar pelo Cerrado do Centro-Oeste é viver a surpresa
permanente. Na Serra da Canastra, em São Roque de Minas,
nascente do Rio São Francisco, podem-se avistar tamanduásbandeira,
lobos-guarás e, com sorte, o pato-mergulhão, ameaçado
de extinção. Lá está também a maravilhosa Casca D'Anta,
primeira e mais alta cachoeira do Velho Chico, com 186 metros
de queda livre.
No Jalapão, no Tocantins, o Cerrado é diferente, parece
um deserto com dunas de até 40 metros de altura. Mas, ao
contrário dos Lençóis Maranhenses, tem água em profusão,
nascentes, cachoeiras, lagoas, serras e chapadões. E uma fauna
exuberante, com 440 espécies de vertebrados. Nas veredas,
os habitantes da comunidade quilombola de Mumbuca
descobriram o capim-dourado, uma fibra que a criatividade local
transformou em artigo de exportação.
Em Goiás, no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros,
o viajante se extasia com a beleza das cachoeiras e das
matas de galeria, das piscinas naturais, das formações rochosas,
dos cânions do Rio Preto e do Vale da Lua. Perto do
município de Chapadão do Céu, também em Goiás, fica o
Parque Nacional das Emas, onde acontece o surpreendente
espetáculo da bioluminescência, uma irradiação de luz azul
esverdeada produzida pelas larvas de vaga-lumes nos
cupinzeiros. Pena que todo o entorno do parque foi drenado
para permitir a plantação de soja. Agrotóxicos despejados por
avião são levados pelo vento e contaminam nascentes e rios
que atravessam essa unidade de conservação. Outra tristeza
provocada pela ganância humana são as voçorocas das nascentes
do Rio Araguaia, quase cem, com quilômetros de extensão
e dezenas de metros de profundidade. Elas jogam milhões
de toneladas de sedimentos no rio, inviabilizando sua navegabilidade.
Apesar de tanta beleza e biodiversidade (mais de 300 espécies
de plantas locais são utilizadas pela medicina popular), o
Cerrado do "seo" Samuca está minguando e tende a desaparecer.
O que percebo, como testemunha ocular, é que entra
governo e sai governo e o processo de desertificação do país
continua em crescimento assombroso.
Como disse Euclides da Cunha, somos especialistas em
fazer desertos. Só haverá esperança para os vastos espaços
das Geraes, esse sertão do tamanho do mundo, celebrado pela
genialidade de João Guimarães Rosa, se abandonarmos nosso
conformismo e nossa proverbial omissão.
(Araquém Alcântara, fotógrafo. O Estado de S. Paulo, Especial
H 4-5, 27 de setembro de 2009, com adaptações)
A partir da organização do texto acima, julgue os seguintes itens.
Julgue os seguintes itens, a respeito de redações alternativas para
termos e estruturas lingüísticas do texto acima.
Julgue os seguintes itens, a respeito da organização das estruturas
lingüísticas e das idéias do texto acima.
A partir do texto acima, julgue os itens subsequentes.