Questões de Português - Substantivos para Concurso
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SINGRANDO OS ARES
01 Esta vida airada de saltimbanco das letras ainda me mata.
02 Quando comecei a perpetrar meus livros, os escritores apenas escreviam. Hoje - é o que penso resignadamente, enquanto
03 afivelo o cinto e observo os letreiros de "não fumar" -, há períodos em que o escritor trabalha como funcionário do
04 departamento de vendas da editora e, nesse esforçado mister, às vezes viaja tanto que volta e meia, ao despertar num aposento
05 estranho, leva um certo tempo para descobrir em que cidade está. E eis-me de volta a um avião.
06 Nada como este avião, para lembrar como sou antigo. Tenho a impressão de que, se contasse o que eram as viagens de avião
07 dos velhos tempos, ia ser tido na conta de mentiroso. Escolha de menus na classe econômica, talheres de metal, pratos de
08 louça, refeições quentinhas, precedidas por aperitivos e acompanhadas por vinhos [...].
09 Ninguém pensava em problemas de segurança, não havia a revista e a inspeção a que hoje os passageiros têm de submeter-se.
10 Lembro com um arrepio o dia em que, por eu me encaixar à perfeição num tal perfil do terrorista que algum órgão de
11 segurança americano criou, quiseram me levar em cana em Chicago e quase levam mesmo, tendo os orixás me salvado pelo
12 gongo. E, desse tempo para cá, as coisas só fizeram piorar. Inevitável avaliar as pessoas que embarcaram comigo.
13 O de bigodinho que acaba de se sentar parece um pouco nervoso. Terá inserido em si um supositório explosivo, como agora
14 dizem que é a nova onda, em matéria de terrorismo? Quem vê cara não vê supositório. Só saberei, ou não, depois de chegarmos
15 ao destino.
16 Encaixei-me no que cinicamente chamam de poltrona e pressagiei o dia em que os comissários de bordo empregarão pés-de-
17 cabra para socar nos assentos os passageiros mais graudinhos. Isso com certeza será trombeteado como mais um serviço para
18 maior conforto do passageiro. Não há por que duvidar dessa possibilidade, pois é o mesmo tipo de argumento que vi faz pouco,
19 num comercial de tevê ou num anúncio de revista. Uma empresa agora não dá mais nada aos passageiros, com a possível
20 exceção de um copo de água de torneira. O resto é vendido, mas ela se gaba disso, enquanto anuncia um cardápio baratinho,
21 para os que tiverem uma queda de curva glicêmica durante o voo e precisarem comer alguma coisa. O que antes era incluído
22 no preço agora é cobrado à parte e isso é qualificado como vantagem para o passageiro.
23 Mas talvez a situação no Brasil não seja tão ruim. Já li sobre diversas novidades em matéria de viagem aérea que espero que
24 não sejam adotadas aqui. Uma delas é a cobrança pelo uso do banheiro do avião. Fico imaginando um passageiro sem um
25 vintém no bolso e sem cartão de crédito. Se o problema for xixi, menos mal, talvez. Pode dar para pedir aos demais que olhem
26 para o outro lado, enquanto a questão é resolvida da melhor forma viável, a necessidade é a mãe da invenção. Em casos mais
27 graves, quero crer que, movidos não tanto pela solidariedade quanto pelo instinto de sobrevivência, os passageiros nas
28 proximidades da vítima da infausta premência farão uma vaquinha para pagar o banheiro dela. Nada que, com boa vontade,
29 não possa ser resolvido e, como sempre, o mercado encontrará soluções.
30 Em outro exemplo, a companhia aérea cobra dobrado, se o traseiro do passageiro ultrapassa determinadas proporções. Isso
31 provavelmente é divulgado como um serviço espontâneo em prol da saúde pública, por incentivar a manutenção de um corpo
32 esbelto, sem enxúndias que façam mal ao organismo e ao bolso. No início, acredito que os gordinhos terão os fundilhos
33 medidos por funcionários especializados ou por nadegômetros eletrônicos, mas logo essa tarefa, por acarretar custos quiçá
34 onerosos, será repassada ao consumidor, que, ao comprar a passagem, terá de informar suas medidas posteriores, aceitando ter
35 de tomá-las novamente no check-in, nos casos em que houver a suspeita de que as declaradas não correspondam à realidade.
36 Não existe razão para crer que as mudanças vão parar aí. Não haverá de ser tão impossível assim que, ao menos em viagens
37 curtas como as entre o Rio e São Paulo, passem a ser aceitos passageiros em pé, como nos ônibus e trens urbanos. A preços
38 baixos, essas viagens talvez tivessem uma freguesia apreciável.
39 Quem sabe se, para quem more em Congonhas e se veja surpreendido em Guarulhos pela Mãe de Todos os Engarrafamentos,
40 não seria uma opção prática para voltar para casa antes da meia-noite. Mas chega de mau humor e caturrice, o avião já
41 aterrissou. Ligeiro sobressalto, depois que um comissário fez um pequeno discurso sobre a limpeza da aeronave para os
42 próximos passageiros. Seremos solicitados a realizar essa tarefa? Não, ainda não chegamos lá. Mas, dentro em breve, acho que
43 podemos esperar que nos cobrem uma porcentagem do valor do bilhete como taxa de faxina - mais um serviço de nossa
44 companhia aérea favorita.
RIBEIRO, João Ubaldo. Singrando os ares. O Globo, Domingo, 25 out. 2009.
As formas aumentativas ou diminutivas podem ser usadas conotativamente, pois nem sempre indicam o aumento ou diminuição do tamanho de um ser ou de um objeto. Assinale a alternativa em que o diminutivo foi usado, predominantemente, com uma carga de ironia.
Itália aposta no STF para extraditar Battisti
O governo da Itália decidiu considerar esgotadas todas as negociações com o Executivo brasileiro e apostar todas as suas fichas no Supremo Tribunal Federal para obter a extradição do terrorista Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua pela Justiça italiana pelo assassinato de quatro pessoas.
Conforme a Folha apurou, a convocação do embaixador da Itália em Brasília, Michele Valensise, ocorreu com duas intenções. A primeira, para manifestar a “amargura” e a “decepção” pela decisão do governo brasileiro de conceder refúgio a Battisti. A outra foi operacional, para definir as formas de atuação junto ao STF.
Valensise chegou ontem a Roma e já se encontrou com o chanceler Franco Frattini para fazer um relato de seus contatos no Brasil e repassar as brechas que ainda existem para que Battisti seja extraditado.
O embaixador deverá ter novos encontros com autoridades do Executivo e do Judiciário italianos, mas a orientação do chanceler é que ele possa voltar a Brasília nos próximos dias.
Chamar o embaixador para consultas é, sob o ponto de vista diplomático, uma manifestação explícita de desagrado e de mal-estar. Apesar disso, a intenção da Presidência e da chancelaria italianas é concentrar suas críticas no ministro da Justiça, Tarso Genro, que decidiu pelo refúgio a Battisti, e assim mesmo reconhecer que, pela legislação brasileira, ele tinha de fato essa prerrogativa.
Na avaliação italiana, Tarso Genro não teria errado ao avocar para si a decisão, mas o mérito de sua medida tem de ser discutido. Pelos relatos levados pelo embaixador ao chanceler, não cabe ao STF julgar o mérito dos crimes cometidos por Battisti quando ele militava no PAC (Proletários Armados pelo Comunismo), mas cabem, sim, duas etapas de julgamento.
A primeira é se a concessão do refúgio com uma canetada do ministro elimina a análise do pedido de extradição feito pela Itália. Em caso afirmativo, o caso está encerrado e Battisti tem o direito de permanecer no Brasil. Em caso negativo, o STF deverá julgar a segunda fase, sobre a extradição em si.
O chanceler e o embaixador italianos repassaram o pedido e informaram ao seu governo que está “bem fundamentado, tem legitimidade” e, assim, boas chances de ser acatado pelo tribunal brasileiro.
Apesar da tensão, há duas manifestações distintas no governo e na chancelaria da Itália: uma para a opinião pública, dura e irritada contra o Brasil; a outra para Brasília, mais amena e política, justificando que a “dureza” é necessária para satisfazer a pressão interna. Tanto na avaliação do Planalto e do Itamaraty quanto na Embaixada da Itália em Brasília, um dos fatores para a atual crise tem sido o papel da imprensa, que, segundo os dois lados, tem atuado para “botar fogo” num clima já quente.
Uma das missões do embaixador é tentar apaziguar os ânimos. A ordem do presidente Lula aos ministros e assessores é silenciar sobre o assunto.
Ontem, Frattini afirmou a uma rádio italiana que “o Brasil é um país amigo da Itália e continuará sendo, mas a sua atitude neste caso não é aceitável. Iremos até o fim”. “Esperamos que o Brasil entenda as nossas razões”, disse o chanceler.
A Câmara dos Deputados da Itália aprovou ontem uma moção dos partidos governistas e de oposição exigindo que o Brasil revogue o refúgio.
Texto adaptado do jornal Folha de São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2009. Brasil A7
Em “Valensise chegou ontem a Roma...” e em “...ele possa voltar a Brasília...”, não temos sinal indicativo de crase, porque Roma e Brasília são nomes de gênero feminino que
A moda terminal
Já declararam o fim da memória, da escrita, da
pintura, da fotografia, do teatro, do rádio, das ferrovias,
da História e já anunciaram até que o mundo ia se
acabar. Todos os que previram esses desfechos
5 chegaram ao fim antes. Agora, a moda é decretar que
o jornalismo está terminando (e o livro também). Citam
importantes jornais do mundo como alguns dos veículos
com sérias dificuldades financeiras. Reconheço que
há argumentos respeitáveis e indícios preocupantes.
10 Mas vamos relativizar o pânico. No Brasil, por
exemplo, nos dois últimos anos, a circulação dos
diários cresceu. Em 2007, enquanto a expansão
mundial não passou de 2,5%, aqui foi de 11,8%.
Desconfio muito das antecipações feitas por
15 um mundo que não conseguiu prever nem a crise
econômica atual. Além do mais, nunca uma nova
tecnologia de comunicação eliminou a anterior. Com
o advento da escrita – para citar a primeira dessas
transformações – acreditava-se que, por desuso, a
20 memória iria desaparecer. Dispondo de um suporte
mecânico para registrar suas experiências, o homem
não usaria mais a cabeça. Para que decorar, se era
possível guardar tudo em forma de letrinhas? (a última
especulação no gênero é a de que o Google vai tornar
25 inúteis arquivos e bibliotecas).
Antes se dizia que a “civilização visual” (a TV)
iria abolir a “civilização verbal”. Uma imagem vale mais
que mil palavras, repetia-se, esquecendo-se de que só
se diz isso com palavras. Agora se afirma, veja a ironia,
30 que a Internet veio salvar a escrita que a TV estava
matando. De fato, nunca se escreveu tanto quanto hoje,
pelo menos em e-mails. A onipresença desse universo
on-line passou então a funcionar como uma espécie de
pá de cal sobre o jornal. Só que a Internet ainda precisa
35 da confirmação e do endosso do “impresso”, de seu
prestígio e credibilidade. Os blogueiros sérios que me
perdoem, mas a rede não é confiável (ainda bem, para
Veríssimo e Jabor, pelo que costumam atribuir a eles
ali). Uma vez, um site noticiou que eu tinha morrido.
40 Houve controvérsia, mas eu só não morri mesmo
porque a notícia não saiu nos jornais.
Por tudo isso, é provável que, em vez de
extermínio, haja convergência e convivência de mídias,
como já está ocorrendo. Muitos dos blogs e sites mais
45 influentes estão hospedados em jornais e revistas.
VENTURA, Zuenir. O Globo – 14 fev. 2009. (com adaptações)
Há três substantivos em
TEXTO II
O poeta aprendiz
Ele era um menino valente e caprino
Um pequeno infante sadio e grimpante
Anos tinha dez e asas nos pés
Com a chuva e bodoque era plic-ploc
Olhar verde-gaio, parecia um raio
Pra tangerina, piano e menina
Por isso fazia
Seu grão de poesia
E achava bonita
A palavra escrita
Por isso sofria
De melancolia
Sonhando o poeta
Que quem sabe um dia
Poderia ser.
(TOQUINHO MORAES, Vinícius de. In: 10 anos de Toquinho e Vinícius. Rio de Janeiro: Universal Music, 1979.)
A palavra “Anos” assume a mesma função sintática que a do substantivo sublinhado na alternativa