Na dinâmica das leis
Toda legislação racionaliza os valores sociais, buscando reconhecê-los e afastá-los do âmbito das paixões ou dos interesses
mais estritos do indivíduo, bem como compreendê-los no tempo vivo da História. Diz-se que as leis “caducam”, e o termo, pouco
ortodoxo, é expressivo: por anacronismo, dispositivos legais podem perder a razão de ser, superados que são pela primazia que
ganham novos costumes.
São vários os fatores que determinam mudanças drásticas em nosso comportamento. Entre eles está a alta tecnologia de
ponta, com seus incontáveis reflexos na vida cotidiana: o que fazer, por exemplo, do direito à privacidade na onipresença de câmeras
instaladas por medida de segurança? No campo da moral e da ética, das disputas políticas, das ideologias, do comportamento, dos
hábitos cotidianos, muito do que ontem valia deixa de ter sentido hoje; considere-se, pois, a possibilidade sempre aberta para que um
novo “espírito” de uma lei deva corresponder a uma nova prática social. Nessa atualização necessária, conta-se com a sensatez e o
senso de oportunidade do legislador, sem falar na atenção continuada aos dispositivos básicos constitucionais já estabelecidos na
Carta Magna.
A mobilidade dos costumes enseja a formação de novos sujeitos sociais. Note-se que, além das instituições já clássicas, nosso
tempo vem testemunhando a criação dos chamados “coletivos”, cuja natureza se distingue da dos partidos políticos ou dos órgãos de
classe tradicionais, embora sejam agrupamentos cuja ação se reveste de evidente importância política e cuja representação de
setores específicos da sociedade pode ser vista como legítima. É possível que a legislação venha a contemplar as iniciativas desses
“coletivos”, munindo-se de novos dispositivos para acompanhar os novos traços de uma sociedade em movimento.
(Alcebíades Nunes Cardoso, inédito)