Injusto e subdesenvolvido
São Paulo — Meu filho foi obrigado ontem a baixar ao pronto-socorro (do Hospital
São Paulo), acometido de intoxicação alimentar. Dois anos atrás, minha mulher tivera
idêntico problema, mas em Davos (Suíça) e também foi levada a um pronto-socorro.
Dirão os otimistas (ou conformistas) que é covardia comparar o Brasil justo com a
Suíça. Mas eu fui educado a acreditar que ser humano é tudo igual, suíço, brasileiro,
hondurenho ou somali. Logo, seu sofrimento deve ser tratado da mesma forma. Ilusão, eu
sei, mas não consigo me conformar com menos.
A diferença entre PS suíço e o brasileiro (embora de um hospital-escola) não é a
diferença entre um mundo e outro. É um abismo planetário.
Tudo na Suíça (equipamentos, instalações, limpeza, atenção da equipe) foi
radicalmente diferente, radicalmente melhor. Não que o pessoal do Hospital São Paulo
fosse rude, indiferente ou algo do gênero. Simplesmente, eles têm tanto trabalho que o
paciente fica jogado a um canto. E não é figura de linguagem. É literal.
Macas nos corredores, com pacientes em estado que dá a sensação de ser
terminal. Sujeira inevitável. Tanto que o enfermeiro, quando meu filho disse que sentia
náuseas, aconselhou-o a virar para o canto e vomitar ali no chão mesmo. No chão de
uma enfermaria repleta de pacientes em estado certamente delicado.
Nem sequer verificaram a febre do rapaz. Já em Davos, minha mulher ficou o
tempo todo com aparelhos monitorando seus batimentos cardíacos, sua pressão e sei lá
mais o quê.
É possível que seja de fato covardia comparar o Brasil com a Suíça, ainda que a
comparação envolva o Estado mais rico deste pobre país e um hospital localizado na
parte mais rica da cidade (o pedaço central de sua zona Sul). Mas é inescapável
constatar que o presidente se engana quando diz que o Brasil não é um país
subdesenvolvido, é apenas injusto. É, infelizmente, as duas coisas.
Clóvis Rossi