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Acusada de responsável pela tragédia, empresa da Vale cuida da cena do crime, exclui imprensa e deixa o povo de fora. Tá certo isso?
(Por Laura Capriglione, especial para os Jornalistas Livres, com fotos de Gustavo Ferreira, em Mariana (MG) DOM, 08/11/2015.)
Arrancados de suas casas pelo tsunami gerado pelo rompimento das barragens Fundão e Santarém, repletas de lama tóxica, os moradores de Bento Rodrigues, arraial rural a 35 km do centro de Mariana, sofrem com outro tsunami: o de dúvidas, de mentiras e de dissimulação.
As barragens sinistradas pertencem à mineradora Samarco, fundada em 1977, controlada pela toda-poderosa Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton. Décima maior exportadora do país, a empresa faturou R$ 7,6 bilhões em 2014 e apresentou um lucro líquido de R$ 2,8 bilhões. Apesar dessa contabilidade vistosa e de dizer em seu site na internet que preza pela vida “acima de quaisquer resultados e bens materiais”, os moradores de Bento Rodrigues reclamam que não havia nem mesmo uma simples sirene instalada e funcionando para alertar o lugarejo da ruptura das barragens. Poderia ter salvo vidas.
Agora, no rescaldo da tragédia, os habitantes de Bento Rodrigues suspeitam que a empresa esteja priorizando o salvamento de sua imagem institucional em detrimento das vidas humanas e dos animais, atropelados pelo avanço medonho da lama.
“Por que é que estão nos impedindo de entrar em Bento Rodrigues? A gente poderia ajudar na localização e no resgate dos desaparecidos e dos animais, porque conhecemos como ninguém a região, sabemos lidar com o mato. O que é que eles estão querendo esconder?”, perguntava um grupo de moradores indignados com o fato de serem mantidos à força longe de seu bairro.
Lama Exterminadora
Não é o maior desastre ambiental de toda a história, como exagera a internet. Mas é dramaticamente grande.
E terá consequências ainda difíceis de prever
As perdas humanas e os danos sociais causados pelo tsunami de lama que atingiu de modo dramaticamente colossal o distrito mineiro de Bento Rodrigues no último dia 5 puderam ser sentidos imediatamente. A enxurrada composta principalmente de areia, mas também de uma mistura de rejeitos químicos, teve origem na barragem de Fundão, da mineradora Samarco, rompeu-se por motivos ainda não esclarecidos e levou com ela onze vidas, além de deixar a cidade inteira soterrada. As consequências ambientais do desastre, porém, continuam sendo calculadas – demorará anos para que se possa precisar sua dimensão. O lamaçal tomou os rios Gualaxo do Norte, do Carmo e Doce, e deve desembocar no Oceano Atlântico.
Apenas no primeiro dia, a lama dizimou os anfíbios e peixes ao longo de 100 quilômetros de rios. Após cinco dias, quando a água suja passava pelas cidades de Governador Valadares, Conselheiro Pena, Resplendor e Aimorés, a contaminação interrompeu o abastecimento nos municípios, secando as torneiras de mais de 300.000 habitantes. A lama que cobre as águas fluviais dificulta a absorção de oxigênio da atmosfera, sufocando peixes e dificultando a fotossíntese de plantas.
Como é de costume, proliferou o exagero na internet – houve quem apontasse o desastre ambiental como o maior de toda a história. Bobagem. Trata-se, isto sim, do pior desastre do gênero em Minas Gerais e do mais grave do mundo tendo por causa o despejo de rejeitos minerais no ambiente – no caso da mineradora de Bento Rodrigues, três vezes maior que o da segunda colocada, a mina canadense Mount Polley, protagonista de episódio semelhante no ano passado. (...)
(Revista Veja – Raquel Beer 25 de novembro 2015.)