Leia a crônica de Walcyr Carrasco para responder à questão.
Febre de fama
Há uma inflação de candidatos a astro e estrela. Toda
família tem um aspirante aos holofotes. Desde que comecei
a escrever para televisão, sou acossado por gênios indomáveis.
Dias desses, fui ouvir as mensagens do celular. Uma voz
aflita de mulher:
– Preciso falar urgentemente com o senhor.
“É desgraça!”, assustei-me. Digitei o número.
– Quero trabalhar em novela – disse a voz.
Perguntei (já pensando em trucidar quem havia dado o
número do meu celular) se tinha experiência como atriz. Não.
Nem curso de interpretação. Apenas uma certeza inabalável de ter nascido para a telinha mágica. Com calma, tentei
explicar que, antes de mais nada, era preciso estudar para
ser atriz. Estudar? Ofendeu-se:
– Obrigada por ser tão grosseiro! e desligou o telefone.
Incrível também é a reação dos familiares. Conheci a
mãe de uma moça que dança em um dos inúmeros conjuntos
em que as integrantes rebolam em trajes mínimos. Bastante
orgulhosa da pimpolha, a mãe revelou:
– Quando pequena ela queria ser professora, mas escolheu
a carreira artística. Ainda bem!
Comentei, muito discreto:
– É... ela vai longe...
– Nem me fale. Daqui a pouco, vai estar numa novela!
Essa febre de fama me dá calafrios. Fico pensando na
reação de grandes artistas como Marília Pêra, Tony Ramos,
Juca de Oliveira diante desse vale-tudo, desse desejo insano
por ser famoso a qualquer preço.
(Veja SP, 21.10.1998. Adaptado)