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Notícias de um abraço
O homem anda tão brutalizado nas cidades, seus malfeitos tão disseminados em nosso meio que, um belo dia, um gesto de afeto chamará “dramaticamente” a atenção das pessoas. Diante de um “abraço” – o ato de um ser humano enlaçar o outro e trazê-lo para junto do peito –, o homem surpreso indagará:
– O que é isso?
E aí, na contramão das manchetes, os jornais publicarão a notícia de um “abraço”.
Ou de um “beijo”: “Cientistas do comportamento humano, dois psiquiatras, um dermatologista e uma assistente social estudam a natureza do gesto que chamou a atenção do Brasil, ontem, em Florianópolis, Santa Catarina. Um homem e uma mulher, num banco da Praça XV de Novembro, no coração da cidade, aproximaram os seus troncos, um de frente para o outro. E culminaram o seu estranho comportamento unindo os lábios – e os comprimindo num ato que chamou a atenção de fotógrafos e passantes. A 3a Delegacia de Polícia do bairro não chegou a deter os protagonistas pelo gesto bizarro, nem os indiciou em qualquer conduta suscetível do enquadramento penal.
Nesta época de tanto desamor, tanta crueldade, em que a tortura deixa as masmorras para exercer sua infâmia à luz do sol, espanta que os pelourinhos não retornem às praças públicas, para que todos presenciem o homem em seu estado animal, açoitando o próprio homem.
Nesses tempos de miséria e vilania, em que tapas ecoam nas esquinas com sonoplastia de radioteatro, (…) convoco toda a humanidade a falar de abraços e beijos.
Um beijo, segundo os pesquisadores do amor, põe em circulação hormônios que desencadeiam sensações de bem-estar e alegria, mitigando a dor, como uma espécie de morfina.
Não por acaso as mães beijam o “dodói” das criancinhas que tropeçam e caem – e já se levantam, reanimadas pelo milagre do “beijo”.
O ato de pousar os próprios lábios nos de alguém a quem muito queremos, imprimindo-lhes um movimento de sucção, não é apenas um gesto afetivo: é também um gesto terapêutico.
Segundo os citologistas de plantão, especialistas em pele, o beijo é uma das melhores formas de se evitarem as rugas e de se fazer “ginástica facial”, já que põe em movimento nada menos do que 29 músculos.
Trata-se, portanto, do verdadeiro halterofilismo labial. Ainda no campo dos benefícios estéticos, já está provado que o beijo “emagrece”. Sim, quem muito beija dificilmente deixará de ser esbelto – pois o beijo obriga o organismo a consumir cerca de 12 calorias por unidade bem estalada e até 28 calorias se o beijo é daqueles cinematográficos, de desentupir pia.
Quanta energia, quanta vitamina num beijo só! Com tantas propriedades, não há de ter sido por mero acaso que o beijo se tornou o afago mais praticado na história da humanidade.
Dele, já dizia “William”, o poeta de Stratford-on-Avon:
— Um beijo remove montanhas, constrói reinos, dissipa impérios…
E o magnífico poeta negro, o verdadeiro Iluminado, Cruz e Sousa, um dia suspirou pelo beijo de um amor secreto e platônico:
— Beija-me e serei teu príncipe, em noite de plenilúnio…
Claro, não faltariam os “espíritos de porco”, como o poeta espanhol La Serna.
Sobre esse nobre carinho, ele estalou os beiços e atirou com desdém:
— Às vezes, o beijo não passa de um chiclete compartilhado…
E daí? — pergunto eu. Se for o chiclete da bem-querença, que mal faz?
Masquemos todos, homens e mulheres, essa doce e reparadora saliva do amor, esse halter labial que ainda pode salvar a humanidade.
Sergio da Costa Ramos – adaptado
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