Qual é o tipo de discurso que predomina nesse texto?
A Moreninha
Joaquim Manuel de Macedo
Trecho do capítulo 19, “Entremos nos corações”.
- [...] Mas venha cá, Sr. Augusto, então como é isso?... estás realmente apaixonado?!
- Quem te disse semelhante asneira?...
- Há três dias que não falas senão na irmã de Felipe e...
- Ora, viva! Quero divertir-me... Digo-te que a acho feia; não é lá essas coisas; parece ter mau gênio. Realmente notei-lhe muitos defeitos...sim... mas, às vezes... Olha, Leopoldo, quando ela fala ou mesmo quando está calada, ainda melhor; quando ela dança ou mesmo quando está sentada... ah! Ela, rindo-se... e até mesmo séria... quando ela canta ou toca ou brinca ou corre, com os cabelos à négligé, ou divididos em belas tranças; quando... Para que dizer mais? Sempre, Leopoldo, sempre ela é bela, formosa, encantadora, angélica!
- Então, que história é essa? Acabas divinizando a mesma pessoa que, principiando, chamaste feia?...
- Pois eu disse que ela era feia? É verdade que eu... no princípio... Mas depois... Oras, estou com dores de cabeça; este maldito Velpeau!...Que lição temos amanhã?
- Tratar-se-á das representações de...
- Temos maçada! ... Quem te perguntou por isso agora? Falemos de D. Carolina, do baile, do...
_Eis aí outra! Não acabaste de perguntar-me qual era a lição de amanhã? - Eu? Pode ser... Esta minha cabeça!...
- Não é a tua cabeça, Augusto, é o teu coração. Houve então um momento de silêncio. Augusto abriu um livro e fechou-o logo; depois tomou rapé, passeou pelo quarto duas ou três vezes e, finalmente, veio de novo sentar junto de Leopoldo.
- É verdade, disse; não é a minha cabeça: a causa está no coração. Leopoldo, tenho tido pejo de te confessar, porém não posso mais esconder estes sentimentos que eu penso que são segredos e que todo o mundo mos lê nos olhos! Leopoldo, aquela menina que aborreci no primeiro instante, que julguei insuportável e logo depois espirituosa, que daí a algumas horas comecei a achar bonita, no curto trato de um dia, ou melhor ainda, em alguns minutos de uma cena de amor e piedade, em que a vi de joelhos banhando os pés de sua ama, plantou no meu coração um domínio forte, um sentimento filho da admiração, talvez, mas sentimento que é novo para mim, que não sei como o chame, porque o amor é um nome muito frio para que o pudesse exprimir!... Eu já não me conheço... não sei onde irá isto parar... Eu amo! Ardo! Morro!
- Modera-te, Augusto; acalma-te; não é graça; olha que estás vermelho como um pimentão. (...)