No segundo parágrafo do texto, a autora descreve a visão de ...
As boas lições do meu pai
Um dia, numa visita ao meu pai, notei que ele me olhava longamente, daquele jeito que fazia quando tinha uma questão na cabeça. E veio o comentário, “sua calça está rasgada.” Era o começo da tendência dos jeans detonados. “Sim, pai, está”, eu respondi. Naquela época eu já há muito tinha uma profissão e pagava minhas próprias contas. Ele me deu então aquele olhar apertado e o sorriso de canto de boca que eu conheço tanto. Era uma aprovação.
Me lembrei de quando tinha nove ou dez anos de idade e ia com ele para os botecos onde uma rodinha de homens tomava cerveja e todos falavam de política. A menina que prestava muita atenção na conversa ganhava aquele meio sorriso do pai. Alguns anos mais tarde bati o carro dele e trabalhei três meses seguidos para pagar a conta do conserto. A família criticava o pé pesado da jovem ao volante. Meu pai devolvia os comentários com aquele mesmo sorriso de ironia e um certo orgulho.
Minha profissão me levou a muitas viagens arriscadas. Guerras, desastres naturais, acidentes nucleares. Nunca ouvi de meu pai o tradicional “Mas minha filha, isso é muito perigoso!”, compreensível vindo de um homem da geração dele. Alguns amigos diziam que ele me criou para agir como um menino. Prefiro achar que ele me educou para que eu tivesse coragem de ser aquilo que eu quisesse.
Essa semana acompanhei com prazer a sequência de posts nas redes sociais com fotos de magistradas, atletas, astronautas, acompanhadas da hashtag #dresslikeawoman (vista-se como uma mulher). Meu pai, muito velhinho, já não consegue expressar com clareza as suas opiniões. Mas sei que em algum lugar ali ainda está acesa a chama de intelectual da esquerda que abominaria um presidente - qualquer que seja seu viés político - que se meta com a maneira como uma mulher deve se vestir.
Meu pai me ensinou, sem nunca ter dito uma palavra sobre isso, que conhecimento, seriedade e trabalho bem feito são bens que não têm gênero e que quem os acumula pode se vestir e se comportar da maneira que achar melhor. Homens e mulheres só devem satisfação a si mesmos e à coerência no caminho que escolheram.
Eu teria muito a dizer a um homem que tivesse a pretensão de criticar a maneira como uma mulher se veste. Mas meu pai me ensinou a não perder tempo com a vida dos outros. Esse texto é uma homenagem a ele. Meu pai. Agora com licença que preciso me vestir para o trabalho.
Padrão, Ana Paula. As boas lições do meu pai. Isto é, 2017. Disponível em: <https://istoe.com.br/as-boas-licoes-do-meu-pai/>. Acesso em: 20 de fev. 2019.
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Comentários
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A questão se baseia em figuras de linguagens e queremos encontrar qual se encontra no segundo parágrafo.
a) intertextualidade com o código de trânsito.
Incorreta. Por intertextualidade entende-se a criação de um texto a partir de outro existente, é o nome dado à relação que se estabelece entre dois textos, quando um texto já criado exerce influência na criação de um novo texto. O segundo parágrafo está longe de ser uma intertextualidade do código de trânsito
b) paródia do comportamento masculino.
Incorreta. A paródia é uma releitura cômica de alguma composição literária, que frequentemente utiliza ironia e deboche. O parágrafo não soa como deboche nem é engraçado em momento algum.
c) metonímia do tradicionalismo.
Incorreta. A metonímia consiste em empregar um termo no lugar de outro, havendo entre ambos estreita afinidade ou relação de sentido.
Ex: Minha filha adora danone. (= Minha filha adora o iogurte que é da marca danone.)
d) metáfora de velocidade.
Correta. Metáfora é a figura de linguagem em que se encontra uma comparação implícita.
"A família criticava o pé pesado da jovem ao volante. Meu pai devolvia os comentários com aquele mesmo sorriso de ironia e um certo orgulho."
Quando diz que a menina tem o "pé pesado" se refere que a menina é veloz, acelerando o veículo, pisando no acelerador.
GABARITO D
D- "A família criticava o pé pesado da jovem ao volante"
"pé pesado" metáfora de gente que acelera ao volante. "D"
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