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Q641574 Português

                        Uma Galinha – Conto de Clarice Lispector

“Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.

Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.

Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o grito de conquista havia soado.

Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofegante num beiral de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por um momento. E então parecia tão livre. 

Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra tão igual como se fora a mesma. 

Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos. Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos. Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos:

— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!

Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:

— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!

— Eu também! jurou a menina com ardor. A mãe, cansada, deu de ombros.

Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta do colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava: “E dizer que a obriguei a correr naquele estado!” A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.

Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem, resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.

Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente. Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.”

                                                                “Uma Galinha” Clarice Lispector, 1960

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Vamos analisar a questão sobre fonologia, especificamente sobre dígrafos vocálicos. Dígrafos são combinações de duas letras que representam um único som. Os dígrafos vocálicos ocorrem quando uma vogal se junta a uma ou mais letras e o som resultante é uma única vogal nasal.

A alternativa correta é a C - Santo.

Justificativa para a alternativa correta:

Na palavra "Santo", o "n" após a vogal "a" forma um dígrafo vocálico. Aqui, o "n" não é pronunciado como uma consoante, mas nasaliza a vogal anterior, fazendo com que "an" seja lido como um único som nasal.

Análise das alternativas incorretas:

  • A - Arroz: A palavra "arroz" não possui dígrafo vocálico. A vogal "o" é seguida pelo "s", que é uma consoante, e ambos são pronunciados separadamente.
  • B - Querida: Em "querida", as letras formam dígrafos consonantais ("qu"), mas não há dígrafo vocálico, já que não há vogal nasalizada.
  • D - Banho: A palavra "banho" possui um dígrafo consonantal "nh", mas não apresenta dígrafo vocálico.

A compreensão de dígrafos é fundamental para dominar fonologia, pois ajuda a reconhecer sons nas palavras que divergem da escrita.

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Comentários

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a) aRRoz - dígrafo consonantal

b) QUerida - dígrafo consonantal

c) sANto ( sã.to) - dígrafo vocálico 

d) baNHo - dígrafo consonantal 

 

Dígrafo vocálico = som de vogal ( - vogal + m/n). Ex: cANto ( cã.to), tANto (tã.to).

DÍGRAFO VOCÁLICO :


sANto = sAN -to ( AN) = sAAANNNto

DIGRAFOS CONSONANTAIS:

--> CH , RR, SS, LH

DIGRAFOS VOCALICOS:

---> AN, EN

Pq o "an" de Banho nao pode ser considerado dígrafo vocálico?

A questão é de fonologia e quer que identifiquemos qual das alternativas abaixo apresenta um dígrafo vocálico. Vejamos:

 .

Dígrafo é o grupo de duas letras representando um só fonema (som). Na palavra "chave", por exemplo, que se pronuncia "xávi", ocorre o dígrafo "ch". 

Dígrafos consonantais: (dígrafos que representam consoantes) lh, ch, nh, rr, ss, qu, gu, sc, sç, xc, xs. 

Dígrafos vocálicos: (dígrafos que representam vogais nasais) am, em, im, om, um, an, en, in, on, un.

 .

A) Arroz

Errado. Em "ar-roz" há o dígrafo consonantal "rr".

 .

B) Querida

Errado. Em "que-ri-da" há o dígrafo consonantal "qu".

Obs.: "gu" e "qu" só são dígrafos quando seguidos das vogais "e" ou "i", representando os fonemas /g/ e /k/: guitarra, quilo; nesse caso, a letra 'u' não representa nenhum fonema. NÃO há dígrafos quando são seguidos de "a" ou "o": quase, averiguo.

 .

C) Santo

Certo. Em "san-to" há o dígrafo vocálico "an".

 .

D) Banho

Errado. Em "ba-nho" há o dígrafo consonantal "nh".

 .

Gabarito: Letra C

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