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Q641576 Português

                        Uma Galinha – Conto de Clarice Lispector

“Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.

Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.

Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o grito de conquista havia soado.

Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofegante num beiral de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por um momento. E então parecia tão livre. 

Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra tão igual como se fora a mesma. 

Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos. Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos. Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos:

— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!

Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:

— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!

— Eu também! jurou a menina com ardor. A mãe, cansada, deu de ombros.

Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta do colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava: “E dizer que a obriguei a correr naquele estado!” A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.

Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem, resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.

Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente. Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.”

                                                                “Uma Galinha” Clarice Lispector, 1960

No que se refere ao uso da vírgula, assinale a alternativa correta:
Alternativas

Gabarito comentado

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Alternativa correta: B - Para o lanche da tarde, fiz um bolo delicioso.

A questão aborda o uso correto da vírgula na língua portuguesa, um tema essencial para quem presta concursos públicos. Vamos entender como cada alternativa se comporta em relação ao uso da vírgula.

Alternativa B é a correta. A vírgula é usada corretamente para separar o adjunto adverbial ("Para o lanche da tarde") do restante da oração. Esta é uma prática comum em português para melhorar a clareza e fluidez da leitura.

Análise das alternativas incorretas:

Alternativa A - Maria, Catarina, e eu, estivemos no parque hoje.

Esta alternativa está incorreta porque a vírgula antes de "e" é desnecessária. A vírgula não deve ser usada para separar os elementos de um sujeito composto, exceto em casos de ênfase ou inserções parentéticas, o que não é o caso aqui.

Alternativa C - A menina colheu, flores no jardim.

Esta alternativa está incorreta porque a vírgula está separando indevidamente o verbo "colheu" do complemento "flores no jardim". Não há justificativa gramatical para essa separação.

Alternativa D - José, não queria ir, na casa dela.

Esta alternativa está incorreta porque a vírgula após "José" e antes de "na casa dela" não são necessárias. A vírgula depois de "José" pode ser usada para dar ênfase ou marcar uma pausa de respiração, mas a vírgula antes de "na casa dela" é claramente errada, pois separa o verbo "queria ir" do seu complemento, o que prejudica a clareza da frase.

Considerações finais:

O uso correto da vírgula é fundamental para a clareza e precisão na escrita. As vírgulas devem ser usadas para separar elementos coordenados, destacar elementos acessórios e marcar pausas necessárias para a compreensão do texto, mas devem ser evitadas onde não há necessidade gramatical.

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Comentários

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o erro da letra A é a virgula depois do EU

a)Maria, Catarina, e eu, estivemos no parque hoje. Não sujeito de verbo. 

 b)Para o lanche da tarde, fiz um bolo delicioso. Termo deslocado OK

 c)A menina colheu, flores no jardim.  Não se separar verbo de objeto. 

 d)José, não queria ir, na casa dela.  Não se separar sujeito de verbo. 

Na letra B tem-se uma oração subordinada adverbial final deslocada, portanto, vírgula obrigatória por não estar na ordem direta.

Ordem direta: Fiz um bolo delicioso para o lanche da tarde.

Detalhe: na ordem direta pode-se utilizar, também, a vírgula, todavia, trata-se de caso facultativo.- Fiz um bolo delicioso, para o lanche da tarde.

Corrija-me, caso esteja errado!

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