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Q1891539
Português
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Leia o texto abaixo para responder à questão.
Ser escritora no Brasil significa enfrentar desafios simultâneos. O primeiro deles é a entrada no campo
literário dominado historicamente por homens brancos, héteros e de classe média. Esse é o obstáculo cultural
e social que, ao longo dos anos e de forma lenta, vai sendo superado com o surgimento de mais e mais autoras.
Ao mesmo tempo, existe no plano estético o peso da figura de Clarice Lispector, a “poeta forte” na literatura
brasileira contemporânea, para usar uma ideia de Harold Bloom.[...]
Carola Saavedra refletiu recentemente sobre o fantasma clariceano nas letras brasileiras e sobre a
existência ou não da “escrita feminina”. É um debate reivindicado por quem está em busca de novos olhares
no campo literário, mas que atiça o conservadorismo assustado com as mudanças. Homens temem a perda do
lugar de fala, o monopólio da ideia de universal, de escrever para todos.
“O conceito de escrita feminina parte de uma premissa essencialista ao enxergar na produção de autoras
um estilo próprio feminino, isto é, as mulheres escreveriam como mulheres por possuírem um corpo de mulher
e terem uma experiência única ligada a esse corpo”, nota a autora “Com armas sonolentas — um romance de
formação” (2018). “A teoria da escrita feminina acabou se tornando por muito tempo o grande calcanhar de
Aquiles das escritoras, porque, ao se pressupor a existência de uma escrita feminina, dava-se a toda a sua
produção um caráter de literatura inferior, de menor qualidade. O outro da norma, o segundo sexo.” [...]
Como leitor interessado e não especialista em questões femininas, fico pensando se um homem teria
condições de enxergar, de absorver e de interpretar o mundo para escrever o romance “Conto da Aia”, de
Margaret Atwood, ou a análise histórica “Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpos e Acumulação Primitiva”, de Silvia
Federici. Tampouco consigo imaginar um escritor construindo a intricada amizade de Lila e Lenu nos quatros
livros da série napolitana de Elena Ferrante, com os jogos de ciúme, de disputas, de solidariedade e de laços
que parecem indestrutíveis entre as personagens.
VIEIRA, Enio. Disponível em: https://www.revistabula.com/43439-clarices-carolinas-e-hildas-um-mapa-das-escritoras-brasileirascontemporaneas/. Acesso em: 31 ago. 2021. (Fragmento)
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